A saga da bruxinha Bibi em transformar Valência em uma nação de bruxos
A Bruxa Valenciana
Parte 5 - No Mar
Bibi de sereia conversando com cavalos marinhos
O mar estava estático, era a primeira vez que ele ficava estático desde que saímos do porto de Valência, meu feitiço de aceleração durou umas quatro noites e me adiantou exatamente quatro noites, os 21 dias viraram 17, mas iam diminuir mais ainda, eu só estava esperando cair a noite para fazer outro feitiço de aceleração que iria nos render umas cinco noites e as 17 iriam virar 12 e assim por diante, quando uma pergunta desconcertante e no meio de todo mundo me tirou do devaneio, e eu odeio sair do devaneio se estou de costas para o príncipe
-- Dói? -- Pisquei, mas não me virei
-- Dói o quê?
-- Ter filho
-- Com certeza... Mas eu não sei, eu nunca tive
-- Não pretende? -- Alberto apareceu bem na minha frente e tive vontade de sumir dali como uma lâmpada se apagando
-- Não faço ideia... Gosto da minha vida como está agora -- Mentira -- Nunca conheci outros bruxos -- Mentira e mesmo que se fosse verdade eu não me via se casando com alguém que não fosse Alberto -- Isso é uma questão íntima demais para se perguntar a uma dama -- Alberto não era dado a maneirismos de gêneros, as vezes ele me tratava como a um amigo, em um local em que marinheiros tratavam mulheres ou como meretrizes ou como potenciais noivas, eu nunca o vi tratar outra mulher como uma dessas duas formas, era sempre tão natural e desinteressado com todos
-- Bibi tem razão -- Mafalda falou saindo de dentro do barco para a parte externa -- Não se sai perguntando uma coisa dessas a uma mulher, não se saí perguntando a um homem
-- Eu só perguntei sobre o que me espera -- Se explicou Teddy
-- Oh, mas é claro meu amorzinho, eu não estava falando de você, meu garotinho lindo, mas não se preocupe com isso agora, Bibi não vai te deixar sentir dor -- Ainda bem que eu estava de costas porque ela iria me ver revirando os olhos, nunca ajudei nenhum rainha a não sentir dor na hora do parto porque os malditos médicos religiosos diziam que era uma punição divina as mulheres, mas o cenário era tão diferente
-- Eu penso em ter uma família -- Disse Alberto -- Foi muito triste ter crescido sozinho, eu quero construir uma família e viver em uma casa a beira mar, viajar só de vez em quando e ser feliz para sempre
-- Ninguém é feliz para sempre -- Eu disse quase por impulso -- Eu sei, eu vivo para sempre, não é possível ser feliz por tanto tempo
-- O sempre tem significados diferentes para nós, Bibi, eu não vou viver para sempre, até a morte para mim é para sempre, e acho que em um período de tempo de cem anos é possível ser feliz -- As vezes eu pensava em renunciar minha imortalidade por ele
-- E que tipo de esposa pensa ter, Alberto? -- Perguntou Mafalda com certa malícia, não deu tempo de impedi-la
-- Alguém que me ame, claro, que seja a minha amiga, escute as minhas histórias, me conte histórias... Esteja comigo sempre... Em corpo ou em alma, que ame o mar e que também queira ter filhos, eu quero ter pelo menos uns três -- me teletransportar para dentro daria muito na cara, então pedi licença e fui andando mesmo.
Eu não queria mesmo ter me apaixonado por Alberto, mas o infeliz era tão... Eu respirei fundo para me acalmar, eu queria ficar com ele, mas não sei se ele já me olhou alguma vez com alguma coisa além de amor phílico, antes que Mafalda aparecesse eu abri o meu livro de encantos e comecei a editar a versão sirênica em que eu teria de me transformar para ir falar procurar os cavalos marinhos. Sempre achei as sereias muito lindas, quando eu era bem criança os meus pais me levaram para visitar um recife de sereias e todos nós nos transformamos em formas sirênicas, eu pedi para me darem uma cauda amarela, foram férias muito divertidas
-- Eu Bibi, posso entrar ou quer ficar sozinha? -- Perguntou Teddy, sempre tão atencioso
-- Pode entrar... Me desculpe se pareci meio estranha lá fora
-- Não pareceu
-- Que bom
-- Você se incomoda se eu perguntar se você gosta de Alberto? -- Nem olhei para ele -- Prometo que guardarei segredo
-- Se ficou tão óbvio, então ele já sabe
-- Não ficou, a Mafalda me contou
-- Claro que ela teria contado -- Ele sentou a minha frente me obrigando a olhar para aquele poço de beleza que era ele por inteiro
-- Acho que ele gosta de você também
-- Não viemos aqui para uma viagem romântica, Teddy
-- Tudo bem, eu não vou insistir nisso -- Ele cruzou os braços e espiou por cima do livro, tinha desistido muito rápido de me importunar por essa coisa do romance, cada vez mais eu gostava dele -- É uma sereia!
-- Vou me transformar em uma sereia para ir buscar os cavalos marinhos
-- Como vai funcionar isso? Você vai pescá-los?
-- Não, mamãe nunca fez uma receita em que fosse necessário matar algum animal... Eu vou conversar com um e o convencê-lo a vir comigo para a torre, onde lhe farei uma operação para retirar uma célula de sua bolsa incubadora para só então adicionar a receita
-- Isso parece complicado
-- Não para uma bruxa... A receita não é difícil, só é bem trabalhosa -- Era os dois, mas eu não queria preocupá-lo
-- É verdade o que a Mafalda falou? Você não vai me deixar sofrer, não é?
-- Não... Talvez ninguém mais tenha que sofrer -- Falei para ele e para mim, se tudo aquilo desse certo, se a magia fosse aceita como parte do cotidiano, se uniria a medicina e então ninguém mais teria que sofrer em Valência. Aí o barco deu uma balançada tão violenta que que fomos lançados um contra o outro até cairmos no chão
-- Mas que droga é essa agora?! -- Apareci do lado de fora com todos correndo para dentro
-- É só uma onda bem violenta, Bibi, o mar nessa região é bastante instável e previsível -- Disse Alberto
-- Se eu fizer esse barco correr mais alguns dias... Teremos problemas
-- Eu já disse, quanto mais nos aproximarmos da Sacedônia, mais instável fica o mar, até chegar lá e não ter um minuto se quer de paz
-- Consegue manter ele no mesmo lugar por quanto tempo?
-- Eu não consigo manter ele navegando em círculos, só em um padrão aleatório e é muito, muito, muito perigoso ele virar
-- As ondas tem quantos metros ?
-- Algumas chegam a ter até 40 -- Caramba... Eu ia ter que lançar a mais brava
-- Alberto, eu tenho uma magia que pode manter o barco no ar por uma hora e meia...
-- No ar?
-- 60 metros, 60 metros o barco parado no ar, isso para dar tempo de eu trazer o cavalo marinho
-- Você consegue buscá-lo nesse tempo? O que acontece quando a magia acabar ?
-- O barco cai
-- Cai??!! Ele despenca do ar assim? -- Ele arregalou os olhos e gesticulou imitando algo caindo -- Morre todo mundo
-- Eu prometo que volto antes do tempo! -- Segurei suas mãos e olhei em seus olhos -- Confia em mim, por favor, eu volto antes do tempo tendo pego o cavalo ou não
-- Mas se algo acontecer com você? -- Pensei por um minuto
-- Olha, eu vou deixar um jeito do barco não cair, mas pousar, como um pássaro
-- Mas Bibi... É... Ta -- Ele não parecia muito convencido, desviou o olhar e foi correndo mudar a direção do barco
-- Não estamos voltando, não é?
-- Só dando a volta
Ele deu a volta, e ficamos mais alguns dias enfrentando ora mar tranquilo, ora mar agitado, todas as magias que eu iria precisar já estavam prontas quando faltavam apenas mais um dia para chegarmos e o barco balançava muito, mesmo com um feitiço de estabilidade que eu coloquei nele, estávamos todos apreensivos e com muito medo
-- Eu não queria ter trazido as meninas, você e o príncipe para esta jornada -- Eu disse a Mafalda enquanto ela costurava a capa de Teddy, ele estava com muito frio -- Mas você sabe que eu não pude
-- Tudo bem, minha querida, estamos mais seguro com você neste mar do que no castelo a mercê do duque
-- No castelo e vocês estariam perfeitamente protegidos -- Teddy entrou no quarto e Mafalda foi vesti-la com a capa, mas ela quase o cobriu por inteiro
Quando o dia amanheceu, Alberto acordou desesperado, para notar que o barco já estava no ar e eu estava prestes a pular
-- O quê?! O que está acontecendo?
-- Achou que ia esperar até quando para ir atrás desse bicho? O quanto antes melhor -- Eu já estava sentada com a calda para fora, para mim era algo muito natural, mas para ele foi evidentemente um choque porque ele mal conseguia falar
-- V-v-v-v... É... S-s-sereia...
-- É, é a forma mais prática de ir ao fundo, há outras magias de imersão, mas essa é melhor e me possibilita conversar com os peixes
-- Eu nunca vi uma sereia de tão perto... Só de longe
-- Alberto, sou eu, eu não sou uma sereia, eu sou uma bruxa
-- Mas... Você está... -- Ele abriu um sorriso tão fofo -- Você está tão linda... -- Droga, senti o sangue subir a cara e ia ficando sem palavras virando o rosto quando Teddy apareceu na hora certa
-- Avisando -- Disse aos dois -- Volto em menos de uma hora, eu prometo -- E pulei
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