Tumgik
fdeoliveirabr · 7 years
Text
O SORRISO DA BORBOLETA
Tumblr media
      É triste dizer, mas nunca amei realmente alguém, tive atrações, romance, ternura, mas amor verdadeiro jamais. Sou imune a essa atração diabólica entre dois seres que se amam. As coisas são assim e pronto. Talvez se tivesse um filho, gerado nas minhas entranhas, alguém que eu sentisse crescer e que respirasse ao meu ritmo, aí sim, acho que seria capaz de amar. Amar alguém que cruza acidentalmente o meu caminho acho improvável. Ainda não encontrei este sentimento que una meu corpo e a minha alma ao corpo e a alma de outra pessoa.
        Minha vida sempre foi pacata e sem milagres. Nunca tive pretensões de escalar o Evereste ou salvar o mundo. Consolo-me com migalhas, pequenas parcelas de alegria, rotinas agradáveis e consigo viver assim. Tudo muito simples, sem alaridos e sobressaltos de felicidade. Na verdade busco apenas um equilíbrio, sem vendavais, algo ao ritmo de uma música em surdina.
        Vivo como um pássaro, sem preocupações maiores do que a minha exígua existência, preenchendo os meus requisitos básicos: voar, comer, dormir, procriar e depois desaparecer por completo. Viver apenas por viver, sem grandes triunfos e sem pensar na imortalidade da alma.  
        Não corro atrás do milagre e ignoro os laços eternos do amor. Claro que desejo ser feliz, como todo mundo, mas sozinha, no meu cantinho, sem essa obrigação de compartilhar. Será possível? Não sei! Viver tornou-se bastante corriqueiro. Talvez não suporte essa prisão a dois em nome do amor. Desejo apenas usufruir o meu cotidiano em pequenos goles. Um pequeno sonho burguês: um lar, um amigo, um animal de estimação, algumas flores, pedaços de lembranças e deixar o tempo escorrer sobre o meu corpo.
Tumblr media
        A interação perfeita entre dois seres exige uma transparência total –corpo e alma- isto eu não posso oferecer a nenhum homem. Eu posso ser sincera, mas existe algo no mais profundo de mim que eu não consigo compartilhar. Um segredo nunca revelado. Uma ambiguidade que avança e recua e deixa-me a um passo do suicídio. Algo enterrado que destrói minhas forças e coloca-me numa esfera de realidade diferente. Talvez eu procure a felicidade lá aonde ela não existe e precipito-me num mar de sofrimentos.
        Desde cedo percebi que não tinha as mesmas aspirações que os outros. As conversas ridículas sobre namoros, beijos roubados, promessas de amor e por aí afora eram-me tediosas. Rapidamente dei-me conta que era insensível às sutilezas do amor. Protegendo-me dessas armadilhas fui criando meu próprio universo dentro da minha fortaleza medieval.
        Tudo tem seu preço, algumas vezes, sinto-me como um artista que é incapaz de concretizar sua obra, um cineasta que nunca terminará seu filme, um pintor que não sabe findar o seu autorretrato. Existe uma espécie de emoção negativa que eu não consigo explicar. Algo que não me deixa progredir. Armazeno um monte de emoções abafadas, perdas e feridas, ausências, como se todos os desastres do mundo viessem se acumular na minha calçada. É como se estivesse anestesiada para as vicissitudes do amor. Nada me fere e nada me alegra.
Tumblr media
      Algumas noites, como numa metamorfose da borboleta, algo desconhecido penetra no meu cotidiano e em surdina começa a roubar a essência da minha vida. Sem que ninguém perceba, essa coisa estranha se incrusta na minha alma e apoderasse lentamente de mim.
      Este algo estrangeiro a mim que age como se fosse eu, vai trabalhar no meu lugar, ler os meus livros, frequenta os meus amigos, beija com avidez a boca de homens desconhecidos, deitasse na minha cama, faz coisas que nunca tive coragem de realizar e vai se infiltrando à minha revelia na minha vida. Ninguém suspeita desta metamorfose e tudo que eu tinha estar desmoronando.
     Eu vejo-me agir desta forma estranha e tento alertar os outros, mas, ninguém me escuta. Ninguém presta atenção. Ajo de uma forma diferente. É como se eu existisse num mundo paralelo, num universo onírico, presa dentro de um espelho, aonde eu pudesse ver, ouvir e sentir, mas, sem forças para interferir nessa realidade que se concretiza contra a minha vontade.
Tumblr media
        Essa estrangeira que vive dentro de mim e que roubou minha vida age de um modo estranho e cruel. Tudo o que construí durante anos desmorona, as minhas verdades e virtudes são irrisórias e isto me deixa confusa. Ela destrói em poucos dias o que levei anos para construir. Os meus amigos mais íntimos partem, eles não compreendem minhas novas atitudes: caprichos e procedimentos egoístas e uma forma nova de viver a vida. Perdeu-se o elo de amor e simpatia que nos unia. Sinto a queda próxima, mas ai surge uma nova vaga de amigos e encontros que celebram essa nova mulher.
        Essa nova mulher desconhecida e barulhenta: grita e gesticula como uma esquizofrênica e ao mesmo tempo tem acesso de ternura e amor pelos outros. Eu fico pensando: quando essa intrusa for embora, se um dia for como vou fazer para explicar todas essas insanidades. Essa estrangeira é o meu avesso, um ser abjeto que se infiltra na minha vida e dirigi o meu destino na contramão.
Tumblr media
        Eu que sempre pratiquei a arte da solidão, saboreando o tempo estagnado, fossilizado, sou obrigada a suportar essa estranha que frequenta um mundo caótico e frenético. Existe nela um alvoroço que me deixa a um passo da loucura. Noite após noite, este personagem maléfico vai contaminando-me, espalhando-se como um vírus, crescendo dentro de mim. Sinto que cria, aos poucos, outra dimensão interior. Algo que não sou, mas que de agora em diante serei obrigada a assimilar e quem sabe amar.
0 notes
fdeoliveirabr · 8 years
Text
A FRAGILIDADE DO AMOR
Tumblr media
Quadros de botticelli e sua musa simonetta vespucci
          Algumas mulheres teimam em retornar do meu passado, sem aviso prévio: entram na minha vida feito um fantasma à procura de recordações. A maioria delas vive soterrada no mais profundo de mim mesmo, mas algumas ressurgem, deixando uma sensação de que tudo poderia ter sido diferente. Procuro evitar certas lembranças: o que adianta esmiuçar o passado. Abrir feridas sem poder cicatrizá-las. O passado está morto e muito bem enterrado. Tivemos a nossa chance, pior ainda, o tempo escorreu sobre nós e nem sequer percebemos o final de tudo.
        O diabo é que certas imagens não me abandonam. Talvez não tenha feito o luto completo dessas separações. É verdade: quase nunca penso nelas, certas vezes, essas lembranças chegam quebrando vidraças e abrindo portas que pensei vedadas para sempre. Uma avalanche de lembranças: sorrisos, olhares carinhosos, conversas monótonas, silêncios apaixonados e um sentimento de que ainda resta, em algum lugar, um resíduo desse amor.
        Constance teima em retornar de outro mundo: uma beleza silenciosa que murmura. “Um trem que parte é sempre belo e triste.” Era como se realmente ela existisse: “Eu voltei, vamos tentar uma segunda chance de felicidade.” Eu não resisto a sua presença bela e fantasmagórica.
Tumblr media
        Estou consciente de que tudo isto é apenas um sonho. Retenho ao máximo essa miragem. Nunca tinha sentido tanta beleza. Acordo e sinto o vazio ao meu redor. Tento dormir novamente, na esperança de tê-la novamente nos meus braços. Ela partiu sem dizer adeus. Não me levanto, continuo deitado, tentando apreender algumas lembranças soterradas. Tento escapar desta sensação de perda e decepção.
        Existia em Constance essa incapacidade quase crônica de ser feliz. Seu cotidiano era um amontoado de dúvidas e pairava no ar algo que tentava destruir a nossa felicidade. Eu vivia uma existência confortável, sem aventuras ou riscos. Sempre tive vontade de querer voar, mas, cadê coragem para dá o primeiro passo.
Tumblr media
         A primeira vez que a vi pensei: “Essa mulher poderá me fazer feliz.” Lentamente, fomos nos conhecendo, tudo sutil, promessas vagas, conversas banais e a certeza crescente de que o amor tinha batido na minha porta. Meu grande medo sempre foi de terminar sozinho, sem amor e vivendo uma existência sem rumo e vazia. Tinha medo de volatilizar minha vida em futilidades, sempre acreditei que o objetivo da nossa existência é o amor, somente o amor pode nos salvar dessa lenta destruição.
        A nossa separação foi aos poucos, em sucessivas vagas, silêncios, dores escondidas, fugas e medo do desfecho final. Uma força destrutiva se esmiuçando entre nós. A essência do belo evaporasse e fica somente um vazio. Eu tentei de todas as maneiras, ficar perto dela, porém, existia um mecanismo interior destruindo as boas lembranças. Por mais que tentasse, eu não podia evitar a catástrofe que batia a nossa porta.
Tumblr media
      Ela tenta explicar os motivos do nosso fracasso.
    “Perco o controle e deixo-me invadir por um punhado de coisas negativas. São sensações soturnas aonde me vejo enclausurada num universo que sairei ferida. O meu espírito vive fechado para as belezas do mundo. Um baú sem chaves. Vivo em ciclos imperfeitos e insisto em cavar a minha própria sepultura. Todo este universo que inventei era repousante, uma prisão dourada, mas a realidade sempre vem à tona. O tesouro estava lá, intacto, mas soterrado por toneladas de pedras e eu desperdiçando os mais belos anos de vida.
        Tenho dores terríveis e procuro refúgio nos comprimidos. Uma vida de desastres. Sinto-me prisioneira das minhas exigências emocionais. Acredito sempre que a felicidade está num outro lugar, distante, inacessível e não tenho o direito de possuí-la. Impossível evitar a catástrofe.
Tumblr media
        Refaço na minha cabeça os mesmos cenários, na esperança de encontrar uma saída. Imagino uma maneira saudável de viver minha existência: sem complexos, sem culpabilidades, sem remorsos. Acho que enlouqueço lentamente e ninguém percebe essa minha insanidade. Acredito que preciso viver coisas novas, mas confesso que tenho medo de enfrentá-las.
��       As tentações são tantas, viscerais, deixo-me levar por inúmeros caminhos e chego à conclusão de que nunca conseguirei essa felicidade. Tenho medo do desconhecido, embora anseie por novos encontros. Isto é terrível. Assumo posturas que estão em desacordo comigo. Sou orgulhosa e arrogante e alguns instantes mais tarde, eu me mostro submissa e obediente. Olho-me no espelho e vejo-me insignificante. Imagino que a felicidade é impossível e outras vezes, ao alcance da minha mão, claro, tudo isto é falso num momento e verdadeiro em outros.
Tumblr media
          Penso numa saída deste emaranhado de emoções negativas, uma perspectiva de salvação, uma redenção milagrosa qualquer. Construir dentro de mim uma emoção pura, íntima e sair desse abismo que penetrei por desleixo. Existe sempre essa dualidade, essa inercia crônica e eu renuncio facilmente as tentações.
          Estou alerta às coisas do amor e ao mesmo tempo duvido da sua existência. Essa forma inusitada de sentir as coisas do coração; deixa-me deprimida e eufórica, metade plena, metade vazia. Essa forma de encarar a vida não é saudável, eu sei disso, vivo num estado depressivo perigoso. Medo de tudo e de todos. Coração inconstante, pulsação acelerada e a cada dia, eu cavo a minha sepultura. Essa dualidade de acreditar e negar destrói os meus sentimentos mais belos.
        Não existe vontade de abraçar o mundo, nada disso, apenas uma letargia rotineira. Minha cabeça tenta soluções, mas o corpo não responde. Fecho-me no meu minúsculo mundo: sem amigos, sem amantes, desejos ou flores. Percebo através dos espelhos que ninguém está olhando para mim. Sou um fantasma. Desfilo na multidão e ninguém percebe que estou acenando uma bandeira de socorro.
Tumblr media
        O ponto culminante seria o encontro do amor; aonde eu incarne de corpo e alma essa verdade que existe em mim e eu não consigo fazer vir à tona. Uma entrega total e uma cumplicidade de seguir sem medos. Uma vida plena, sem perjuras e nobre de sentimentos. Sinto que estou prometida a alguém, mas por algum motivo, essa pessoa está atrasada ou talvez tenha esquecido o encontro.
        Nós estamos em campos antagônicos: você procura a beleza e eu o amor. Daí os desencontros. Eu não me considero bela e surpreendo-me quando alguém mostra interesse por mim. Sou um noturno de Chopin que carrega todas as mazelas do mundo.”
       Sinto a suavidade da voz no momento da despedida. Nunca imaginei que essa mulher delicada, exalando beleza fosse tão importante na minha vida. Sua presença onírica demonstra que talvez ainda esteja apaixonado. Imagino coisas impossíveis: se tivéssemos seguidos juntos. Repenso tantas coisas. Algumas vezes eu pensei em voltar, mas, dizer o quê? Não existe retorno. Tudo repousa numa breve sintonia. Alguns momentos antagônicos, silêncios inexplicáveis e pronto: o amor se esvai sem deixar rastros. A beleza do amor é algo frágil e efêmero como um voo de borboleta.
RGEzZy����d
1 note · View note
fdeoliveirabr · 8 years
Text
O SOFRIMENTO DO ADEUS
Tumblr media
Faz um calor dos diabos: 40°C na sombra. O mundo por essas bandas vai a mil por cento e tudo em plena ebulição. Um cenário dos infernos. Dizendo assim parece exagero. É preciso viver nesta fornalha e sentir com as tripas este caos para ter uma noção do inferno. Olho ao meu redor e não acredito no que vejo: alguns homens urinam nos postes, feito cachorros vadios, displicentes balançam o sexo como se estivessem num banheiro público. Algumas mulheres sonolentas, seminuas com seus vestidos rasgados, jazem sobre as calçadas entorpecidas pelo calor. Todos invisíveis embaixo deste sol. Almas penadas num mundo paralelo.
Todo mundo ignora tudo. Ninguém olha de lado. Todos seguem religiosamente o caminho do trabalho. Todos submissos. Imito os outros. Não olho de lado. Esqueço que os outros existem e sigo a minha rota. Não presto atenção à barulheira, vou em linha reta e já tenho o meu destino traçado. Dez horas da manhã e eu transpiro feito uma besta-fera, afobo-me, esbravejo, nervoso que nem um cavalo de corrida. Eu não consigo colocar dois pensamentos coerentes um atrás do outro. O calor exuberante me deixa aniquilado, sem respostas e sem vontade. Alguns sorriem diante do meu trágico espetáculo. Estão sentados nas calçadas, empoeirados, quase escondidos entre as bugigangas cobrindo os rostos como se dissessem: "Pobre diabo! O calor vai te consumir por inteiro”.
Os carros descem a avenida desengonçada, tortuosa e suja. Evito olhar de lado, em cada semáforo, hospedasse um maluco ou um mendigo de plantão. Estou concentrado. Fecho o ângulo e quase em transe hipnótico sigo meu caminho. Vou em frente! Seja o que Deus quiser. Num ziguezague infernal, evito bicicletas, motos e carroças ao mesmo tempo, como se estivesse jogando um vídeo game, na esperança de chegar ao meu destino com o maior número de pontos possíveis.
Tumblr media
Bastaria tão pouco para um acidente fatal. Uma morte estúpida nesta manhã. Por milagre nada acontece. Desço a avenida barulhenta, empoeirada e feia com o máximo de cuidado. Pisando em ovos! Evito todos os obstáculos e os ambulantes que gritam e agitam ostensivamente suas mercadorias. Evito os ônibus caindo aos pedaços. Evito centenas de pedestres. Evito tudo e todos. Espero algo inusitado. Não tenho noção do que seja. Nada acontece.
Tento imagina-me no lugar desses camelôs, exibindo freneticamente essas bugigangas, na tentativa de ganhar o pão de cada dia. Meu Deus! Eu não teria forças suficientes. Não seria capaz de ficar, embaixo deste sol, oferecendo essas mercadorias sem valor a uma multidão hostil. Uma coleção de não. É preciso se acostumar com todas essas negativas. Aqui e ali, uma pequena vitória, algo vendido, mas tão insignificante no vasto oceano de intermináveis nãos.
Tumblr media
Pego um táxi na tentativa de fugir desse inferno. O motorista liga o rádio do carro: Frank Sinatra cantarola uma canção melodiosa e estúpida. Algo que fala de amor e despedida. Sinto o absurdo da situação. O que diabo faz Frank Sinatra neste inferno sobre terra.
As ruas são uma eterna festa ambulante. Existe um festival endiabrado de cores, buzinas, risos e ruídos. Aqui e ali, algumas mulheres negras lançam olhares libidinosos. Lambem os lábios. Dão gargalhadas. Suam por entre as pernas. Sorriem e dizem monossilábico “bom-dia”. Cochicham e gesticulam: disfarçam tão mal. Deixo tudo aberto. Sorrio bestamente. Não precipito nada e evito qualquer contato.
Toda semana o telefone toca e eu finjo não escutar: não atendo. As pessoas do outro lado estão enterradas no meu passado, mas coitadas, ainda não sabem que morreram. Não percebem que saíram da minha vida e que delas eu não guardo sequer uma tênue lembrança.
Tumblr media
Desço do taxi e caminho novamente sem destino pela cidade, feito uma serpente que desliza sobre uma estrada sem deixar rastros, olhando vitrines sem elegância, seguindo o andar de certas mulheres, suando a camisa e acreditando que tudo isto vai se acabar amanhã. Vago sem destino pelas ruas e minha vida é tediosa. Sinto-me doente e não existe remédio milagroso. Tentei de tudo um pouco: psicanálise, acupuntura, cursos esotéricos, sexo, remédios homeopáticos. Nada funcionou realmente.  
Não quero ficar prisioneiro de um mundo pré-fabricado: casamento destruído, filhos indiferentes, vida precária, trabalho sem interesse, final do mês apertado. Vontade de beber e fumar como se nada valesse realmente a pena de ser vivido.
Tumblr media
Encontro um antigo amor bem no largo do Kinaxixi. Ela coloca algumas questões rotineiras: onde moro, se casei, aonde trabalho. Em seguida, faço as mesmas perguntas, algumas ela responde, outras fica em silêncio como se não soubesse a resposta.
Foi a última vez que nos vimos. Não tive coragem de confessar que iria partir desta cidade para sempre. Nunca mais nos veríamos É como se morrêssemos os dois ao mesmo tempo. Despedimo-nos com um simples aperto de mão. Ela parte numa direção e eu numa outra sem olharmos para trás.
�[\��
0 notes
fdeoliveirabr · 8 years
Text
AS PRIMEIRAS TRAIÇÕES
Tumblr media
Um amigo partia definitivamente, mas um dos inúmeros que abandonam essa cidade e vai tentar a vida outro lugar. Abraço-o com sinceridade e digo que sentirei sua falta, suas últimas palavras foram: “Sucesso para você nesta cidade maldita.” Estou inquieto, não por ele ir embora, ultimamente as pessoas partem de repente da minha vida. Algumas mudam de cidade, outras de países, alguns de vida e todo este batalhão de viajantes cairão no esquecimento. Fica sempre essa sensação de que os encontrarei algum dia, na realidade, custa-me acreditar que todos vão desaparecer para sempre da minha existência.
Depois de algumas horas, sonolento entre os lençóis, finalmente eu crio coragem para enfrentar o dia, mas um dia, impregnado de dúvidas ou de súbitas alegrias. Certas manhãs, enquanto faço maquinalmente à barba, sinto vontade como Van Gogh, de decepar a minha orelha. Não necessito de motivos. Sei apenas que preciso cortá-la e mostrar triunfante a alguém este meu gesto. Não tenho coragem. Não tenho coragem nem sequer de me olhar no espelho e choro, choro por não ser Van Gogh e por não estar consciente da minha loucura. Choro por estes avalanches de sentimentos contraditórios que brotam todas as manhãs e eu não tenho coragem de enfrentá-los.
Como desejaria um dia completo de paz, algo que me fizesse superior, nem que fosse somente por 24 horas, um dia, um único dia aonde eu pudesse me encontrar e sentir que algo verdadeiro e belo brotaria do meu mais íntimo ser. O cotidiano cria teias de aranhas, produz um marasmo que fere sem piedade a minha alma. Deixa-me morto. Todos os meus grandes e inusitados sonhos são substituídos por coisas pequenas e cotidianas.
Tumblr media
Na semana passada estava completamente triste, envergonhado de mim e da minha existência, caminhei sem destino pelas ruas de Paris, caia uma chuva fina e persistente, de repente o milagre se produziu, uma felicidade estranha se apoderou de mim, eu estava feliz sem nenhuma razão aparente. Feliz somente por estar vivo, latejante, feliz somente por existir.
Penetro no Louvre e caminho na direção da estátua de Miguel Ângelo. Lembro-me novamente dela. Sua ausência é constante. Não posso controlar essa sensação de querer tê-la ao meu lado, embora soubesse que não existe mais entre nós. O nosso amor virou cinzas. Saio do museu e caminho pelos jardins de Tuileries. A suavidade deste dia me preenche de uma alegria até então desconhecida. A alegria de existir, naquele momento, produziu algo de benéfico e triste. Sento-me num banco e fico admirando o dia que escorre diante de mim. Um raro momento de prazer.
Bastaria seguir adiante na vida, sem muito refletir, sem olhar de lado, mas não, trago essa sensação de que tudo vai desmoronar num futuro breve. Um tempo imenso de felicidade é algo extremamente perigoso. A minha felicidade é algo contraditória. Existe sempre algo de efêmero e impenetrável dentro desta auréola de eternidade.
Durante a minha curta existência devo ter feito muita gente infeliz. Parece loucura se questionar sobre o horrível do nosso passado, mas como seguir adiante? Se eu vasculho cuidadosamente o meu passado, chego à conclusão de que causei mais sofrimento do que alegria as pessoas próximas a mim. Não fico triste por isto, talvez apenas chateado. Algumas vezes, ao fazer o mal, uma alegria repentina, algo contraditório, sentia uma paz num ato mesquinho e miserável. Uma paz de tirano.
Tumblr media
Retornei aos lugares que frequentei no passado, uma espécie de volta suicida, na realidade, tentava buscar as lembranças das minhas primeiras traições. O ato da traição estava restrito agora no campo metafísico. A minha decepção foi enorme. Não existia mais nada. Tudo havia sido destruído pelo tempo. Os lugares e as formas das coisas ainda existiam, mas a tonalidade e a música eram outras. O perfume dos primeiros tempos tinha desaparecido, eu era um estrangeiro, perdido no meio daquela paisagem. Tudo havia caído no esquecimento. Pela primeira vez senti a inutilidade da minha vida, chorei como uma criança doente, não existia mais nada dentro de mim: nem mesmo o passado.
Antes de sair de casa, coloquei algumas fotografias dentro do bolso. Não tinha o menor motivo para transportar essas fotos, tinha-as visto e revisto milhares de vezes, eram fotos de antigos amores, de amigos que desaparecidos e de lugares que tinha vivido. Tenho vontade de jogar todas essas fotografias dentro do esgoto e começar tudo de novo, feito alguém que perde a memória e a única solução é construir uma nova vida, deixando para trás o passado.
Sinto o volume das fotos no bolso. Choro baixinho. O frio faz a gente chorar mansinho, as lágrimas descem suaves sobre o meu rosto, algumas mulheres desfilam maquiadas para mais um dia de trabalho e olham discretamente na minha direção. Elas pensam que choro por causa do frio. Por vezes, também penso assim, mas hoje é diferente, sinto quase um prazer doloroso de chorar baixinho neste banco de jardim.
Tumblr media
Lembro-me de alguém que vive numa cidade da América do Sul. Imagino-o trabalhando numa redação de jornal, construindo um edifício de palavras, um edifício maior do que o Empire State-Building. Ele sempre me alertava: “O passado é uma presença constante em nossas vidas. Precisamos urgentemente domesticá-lo. O passado pode nos destruir. Vivemos sobre os nossos mortos. Esta é uma civilização de cadáveres, mas como evitar que essas lembranças venham à tona. O passado é um navio que naufragou e continua devolvendo seus mortos à superfície”.
Penso que o tempo escapou entre os meus dedos nestes últimos anos, como andam fugindo de mim as emoções e os sentimentos mais nobres. Só Deus sabe como é horrível viver pela metade, como se eu fosse um criminoso a espera da execução final. Durante anos abateu-se sobre mim um desinteresse e sem notar fui deixando escapar o meu passado. Não conseguia apreendê-lo por mais esforço que fizesse em toda sua essência e totalidade. Busquei algo no meu passado e encontrei um abismo, um vazio, uma fortaleza abandonada.
No desespero tentei relembrar algumas mulheres que amei: veio-me apenas palavras soltas, gestos, semblantes alegres e tristes, mas nada me pertencia realmente. Era como se alguém me tivesse confiado essas lembranças e no final da noite eu seria obrigado a devolvê-las. Todo o meu passado estava ficando estranho a mim mesmo e todas as lembranças escorriam entre meus dedos como cinzas.
0 notes
fdeoliveirabr · 9 years
Text
A GUERRA DA LAGOSTA
Tumblr media
foto felipe e brigitte de oliveira
O Brasil e a França quase entraram em guerra no começo dos anos sessenta, 1961-1963, por causa de um crustáceo que ficou conhecido como “A Guerra da Lagosta”. Essa crise diplomática entre países amigos tomou proporções enormes e quase acabou num afrontamento militar entre as duas nações. Na época os franceses adoram a melhor seleção do mundo com Pelé e Cia e os brasileiros sonhavam com Paris e o maior símbolo sexual de toda uma geração, Brigitte Bardot.
Pescadores nordestinos nas suas embarcações artesanais alertam a Marinha Brasileira que navios franceses estavam pescando lagostas ilegalmente no litoral brasileiro. Os barcos franceses estavam no litoral pernambucano com autorização para realizar pesquisas, mas na verdade, eles estavam pescando lagostas. O governo brasileiro imediatamente suspendeu a licença.
Tumblr media
foto internet: charles de gaulle
A França não desistiu e solicitou uma nova autorização para atuar fora das águas territoriais brasileiras, na região da plataforma continental. Isto era apenas uma desculpa para continuarem pescando a lagosta em grande escala. Diante da insistência da pesca ilegal, alguns navios franceses foram perseguidos e apreendidos pela Marinha Brasileira no litoral nordestino.
O tom monta entre as duas nações amigas e as discursões e acusações de ambos os lados. O Brasil alega que a lagosta é um recurso pertencente à plataforma continental devido à sua natureza sedentária. Para se deslocar, o animal anda, no máximo, executa saltos e somente o Brasil tinha o direito de pescar o crustáceo.
Tumblr media
foto: felipe de oliveira, notre dame Paris
A França discordava do argumento e diz que a lagosta era um "peixe", pois se deslocava de um lado para o outro dando saltos e não andando sobre a plataforma continental. Neste caso deveria ser aplicada as regras da convenção de Genebra de 1958 que estabelecia as bases para pesca em alto mar.
A Convenção de Genebra assegurava que os recursos minerais, biológicos, animais ou vegetais da plataforma continental pertencem ao país costeiro. O Brasil alegava que a lagosta era um recurso pertencente à plataforma, devido à sua natureza sedentária: para se deslocar caminhava ou no máximo executava saltos. Em resumo, não nadava. Claro, todos os dois países mantinham seus argumentos baseados na Convenção de Genebra, mais nenhum dos dois tinham assinado tal convenção.
Tumblr media
foto: felipe de oliveira, pont neuf Paris
O comandante e oceanógrafo, Paulo de Castro Moreira da Silva, defendeu o Brasil com essa grande tirada: “Por analogia, se a lagosta é um peixe porque se desloca dando saltos, então o canguru é uma ave”. O circo estava armado foi uma mistura de disputa diplomática, ameaça de guerra e zombaria nacional.
As marchinhas de Carnaval e piadas tomavam conta das rádios, uma delas dizia: “Larga esta lagosta /Deixa de areia /Senão vai dar coisa feia /Faço uma proposta pra você (por quoi?) /Faço um acordo de irmão / Traga uma francesa pra mim / E leve tudo, leve até o camarão”.
O presidente João Goulart (1961-1964), tentando acalmar os ânimos concedeu uma autorização para que seis pesqueiros franceses pudessem pescar lagostas no litoral nordestino. A comoção nacional foi enorme e a população viu essa atitude como uma traição e capitulação aos franceses. Vendo seu erro João Goulart voltou atrás e suspendeu a concessão de pesca aos franceses.
A atitude do Governo Brasileiro deixou o presidente Charles de Gaulle (1959-1969) irritado e até hoje alguns atribuem ao general a origem da frase: "Le Brésil n'est pas un pays serieux" (O Brasil não é um país sério).
Tumblr media
foto internet: brigitte bardot        
O governo francês não aceitou essa mudança de posição do Brasil e o presidente Charles de Gaulle enviou imediatamente um navio de guerra para o litoral pernambucano. A intenção era proteger os barcos franceses e pressionar o governo brasileiro. Diante da situação o presidente, João Goulart foi obrigado a tomar uma atitude militar. O Conselho de Segurança Nacional foi convocado para discutir sobre a salvaguarda da soberania brasileira sob ameaça militar estrangeira e a ordem foi de “utilizar a força se necessário”.
Os ânimos se inflamaram dos dois lados. Todos já estavam apostando na guerra entre as duas nações amigas. As manchetes dos jornais eram eloquentes: “Navios franceses atacam no Nordeste jangadeiros que pescam lagosta” ou “Frota naval da França ronda costa do Brasil”. Do outro lado do Atlântico a imprensa francesa recolhia pronunciamentos dos políticos de que a França detinha a bomba atômica.
É bom lembrar que a frota naval brasileira era arcaica e quase inexistente, na maioria, navios usados comprados aos Estados Unidos da América. A última vez que o Brasil tinha tomado a iniciativa de uma guerra foi contra o Paraguai (1865-1870) há quase 100 anos.
Tumblr media
foto internet
O embaixador do Brasil em Paris, Carlos Alves de Souza Filho, numa reunião com o Secretário-Geral do Quai d’Orsay alertou que a presença de navios de guerra na costa brasileira teria graves consequências e que poderia terminar num conflito. A resposta francesa não deixou dúvidas: "Já estamos em conflito". Outros navios de guerra franceses foram enviados a costa brasileira e as tropas brasileiras se armaram para o confronto.
Numa última tentativa o embaixador Carlos Alves de Souza Filho, pede uma audiência com o presidente francês, Charles De Gaulle. “O general disse que não tinha enviado o navio de guerra ao Brasil e sim ao alto mar. Repetiu duas ou três vezes”. Em seguida de Gaulle argumentou que, por questão de princípio, a França não reconhece e não reconhecerá nunca a jurisdição do Estado ribeirinho sobre a plataforma continental. Falou do absurdo dessa tese se aplicar à pesca na Mancha e por fim prometeu que voltaria a estudar o assunto.
Uma delegação francesa composta pela Marinha Mercante e armadores veio ao Brasil para discutir o assunto e através do diálogo os dois lados chegaram a um acordo.  As duas delegações compreenderam o ridículo da situação e a que proporções tinham chegado. Os navios de guerra se retiraram do litoral nordestino e o assunto foi perdendo o aspecto emocional e esquecido. Essa foi a única guerra que não foi dado nenhum tiro e ninguém morreu.
        O presidente da França, convidado por Jango para visitar o Brasil, só veio ao país em 1964, depois que Joao Goulart foi deposto pelo golpe militar de 1964. Foi a primeira vez que um chefe de Estado francês visitou o Brasil.
Fonte: A Guerra da Lagosta, Cláudio da Costa Braga
(Rio de Janeiro: Serviço de Documentação da Marinha, 2004)
0 notes
fdeoliveirabr · 9 years
Text
UM NAVIO NAUFRAGADO
Tumblr media
fotos brigitte e felipe de oliveira
       Caminho sob este sol que destrói o moral de qualquer miserável que perambula por essas ruas do Recife. Olho desconfiado ao meu redor e vejo uma multidão semidespida e impulsiva na busca de algo. Ignoro a motivação deste caos. Existe qualquer coisa de invisível e inacessível nestas ruas imundas do Recife. Homens e mulheres seguem num ritmo frenético e endiabrado e tudo se mistura: as buzinas dos automóveis, os gritos dos ambulantes, os suplícios dos mendigos, o sorriso falso das prostitutas. Sigo inconsciente o ritmo vertiginoso da multidão e sou mais um daqueles que evitam as poças de lama, os buracos nas calçadas, o lixo amontoado na esquina, os ônibus em alta velocidade e todos os perigos do mundo neste começo de tarde na Avenida Guararapes.
            Uma multidão inquieta tentando escapar do inferno. Não existe alegria, nenhum som de frevo, ninguém olha de lado, alguns homens cospem nas calçadas, as mulheres deselegantes mostram pernas e ventres e são ignoradas. Todos parecem temer algo. Eu também sinto essa sensação de medo. Um medo latente, mas perceptível nos olhares das pessoas, os medos cotidianos nos rodeando. São tantos: medo de ser atropelado, medo de ser assaltado, medo de nunca mais amar. Todos seguem sucessivas vagas de fobias. Surpreendido pela correnteza eu também sigo o desenfreado ritmo da multidão.
Tumblr media
        A salvação milagrosa é entrar num bar e beber uma cerveja gelada. Os bares estão vazios. Os garçons sonolentos. A atmosfera é pesada e triste. Alguns homens dormem entorpecidos nas calçadas. Parecem mortos. Tudo é irracional. Penetro no primeiro boteco e peço uma cerveja gelada. O garçom com aspecto de zumbi segue na direção do balcão e nem sequer presta atenção. Imagino que tudo isto seja um pesadelo. Essa cidade não existe mais, este garçom morreu há muitos anos, finalmente eu vou acordar e ver que nunca retornei.
         Não adianta, essa cidade é real, continua a mesma, talvez pior e nunca saiu da minha vida. Fico sentado e imaginando que tudo pode acabar num instante. Tudo muito fácil e banal. Um bandido entra neste bar, aponta um revólver na minha direção e atira a queima-roupa. Motivo? Ele não precisa de motivos. Minha vida é insignificante para ele. Aliás, por essas bandas a vida perdeu todo senso de valor. Posso até imaginar os títulos dos jornais: "Turista assaltado e morto na Avenida Conde da Boa Vista." Uma notícia lida e diluída pela rotina e violência dos dias.
Tumblr media
        Ainda existem coisas belas nesta cidade. As estátuas dos poetas nas calçadas mostram que a poesia ainda existe. Num estado latente, submerso talvez, mais existe. Os poetas estão pensativos, contemplativos, rígidos nos seus sonhos de pedra. Alguns deslumbram o Capibaribe, outros dão às costas para as ruas abarrotadas de lixos e ratos, outros olham longe, num tempo dissoluto. Será que Carlos Pena Filho, Ascenso Ferreira ou Manuel Bandeira, por uma estranha magia, se retornassem a este caos feérico, reconheceriam a cidade que tanto amaram.
        Pergunto a um amigo como fazer para se viver feliz neste labirinto caótico; ele responde na maior simplicidade: "A gente se acostuma." Acho que é verdade. Terminamos nos acostumando com essa euforia endiabrada e até mesmo com a perspectiva de não ser feliz.
       As lembranças ressurgem, como se fossem destroços de um navio naufragado, jogadas nas areias da praia. Os entulhos de um naufrágio acontecido há muito tempo. Uma avalanche de coisas velhas. Tem de tudo um pouco: risos, frases de amor, carinho, traições, mentiras, abraços e apertos de mãos. São tantas recordações soterradas. Lembranças que pensei perdidas e que submergem sem explicação.
Tumblr media
       No meio desse emaranhado: Luciana. Meu Deus! Como tudo isto anda distante. Tantas lembranças, como se o baú encalhado no fundo do mar se abrisse e tudo viesse à tona. Luciana sempre teve essa áurea de suavidade. Tudo nela era delicadeza e fragilidade. Eu sempre a admirei em silêncio. Nunca declarei meu amor. As tardes ensolaradas sempre foram desumanas: qualquer iniciativa brusca ou uma frase sem convicção e eu poderia perdê-la para sempre.
       Aquela mulher que amei secretamente não existe mais. Seus cabelos devem está brancos, seu sorriso suave talvez tenha desaparecido. Talvez esteja casada: feliz ou infeliz. Preocupada com filhos, trabalho rotineiro e uma infinidade de contas pra pagar. Talvez até mesmo esteja morta. Morta não! Não acredito que toda aquela suavidade desapareceu para sempre.
       Na verdade não lembro muitas coisas dela. São pequenos pedaços de frases, breves encontros, cores de vestidos, sorrisos e olhares. Ela sempre foi um mistério que nunca desejei desvendar. Uma desconhecida. Sempre tive medo que aquele encanto se dissipasse por inteiro. Ela era só promessa. Um instante de felicidade. Ambos perdidos numa rua barulhenta e empoeirada sem medo e sem futuro. Eu sempre a vi como uma dádiva na minha vida bem no meio da Rua da Saudade.
Tumblr media
Sua lembrança trouxe de volta este tempo; aonde eu acreditava nas pessoas e numa existência repleta de milagres. Um pequeno vento de alegria invade minha existência. Os destroços desse navio naufragado ainda tem o poder de me fazer feliz.
       Naqueles momentos nada podia me abalar, intacto e forte, uma fortaleza da Idade Média. Pronto para a felicidade. Não era todo dia que me sinto assim: confiante, vigoroso, apto a desafiar o mundo. O instante era inexplicável. Tudo começa com um pequeno ar de primavera. Ao meu redor nada mudou, mas agora existe outra atmosfera; algo inunda minha existência. Digo um, dois e três, belisco-me duas vezes. Abro a janela para ter certeza que não estou sonhando. Tudo é realmente importante. Um realce de felicidade. Não existe mais aquela sensação de calafrios, aonde desejava desaparecer por completo e ficar sepultado no meu quarto.
Tumblr media
       A grande lição que aprendi com Luciana foi de enfrentar o mundo através da suavidade. Sempre querendo descobrir a vida numa perspectiva de amar e ser amado. “Aprenda a se amar. Do jeito que você é. Tanto por dentro quanto por fora.” Seus conselhos e sua lembrança ainda hoje são válidos.
       Ainda bem que existe o azul do mar se derramando sobre os nossos corpos suados. A imensidão do azul acaricia e abençoa a todos nós. Fecho os olhos e sinto a maresia penetrar em mim de uma forma mágica e bela. A felicidade é quase palpável. Olho ao meu redor e vejo todos estes corpos semidespidos que se diluem no azul e são impregnados do infinito.
Tumblr media
       Num breve espaço sinto a vida pulsando dentro de mim. Tenho a ilusão que este caos recifense se impregna de vida. Toda a felicidade do mundo vivida num único instante de azul. Imagino um futuro, aonde essa realidade caótica persiste, outros corpos impregnados de azul sentirão essa brisa e este instante mágico de felicidade no meio deste inferno.
1 note · View note
fdeoliveirabr · 9 years
Text
As relíquias do amor
Tumblr media
Não consigo, não quero e nem posso me enganar. Eu sou prisioneira da minha não simplicidade. Talvez fosse bastante fácil retornar, recomeçar tudo de novo, implorar perdão e ficar ao teu lado. Quem sabe para sempre. Embora não acredite nesta palavra, nem nesta sensação de eternidade duradoura, que algumas vezes, chamamos felicidade. Talvez fosse suficiente pedir e dar para que o homem que vive comigo seja o único, mas não é o que desejo no mais profundo de mim mesma, gosto desta ideia de amar muitos homens.
Tumblr media
Pode até parecer vulgar, infantil, ou seja, lá como queiras qualificá-lo. De alguns homens tenho somente quaisquer migalhas de atenção, entretanto, eles estão sempre lá quando tenho necessidade deles. Sensualmente me tocam da ponta dos dedos e dos olhos ou do coração, como você, assim longe e, portanto, fielmente presente. Eu tenho muita sorte, disse isto a vários homens, alguns acreditaram, outros fingiram não entender, outros ignoraram minhas palavras, mas eu descobri com alguns deles a volúpia infinita de uma relação afetiva e sexual. Encravada e dolorida feita uma espinha de Acácia na minha carne e... Como encontrar as palavras exatas para descrever essa relação feita de não ditos, sensações, trocas de meias-palavras, encontros e desencontros, frustações e meu coração, este coração que pertence a ti, e a alguns outros, este coração que te ama, está bem arruinado e em pedaços.
Na tua última carta quase choro de remorsos, sentir que, mesmo depois de todo este tempo, ainda carregas nobres sentimentos por mim. Saber que ainda te excito, mesmo que seja somente em pensamentos e que passas noites a pensar e repensar os nossos momentos íntimos é de uma doçura incrível e de uma violência inusitada também. Você está geograficamente longe e tenho dúvidas se um dia nos aproximaremos novamente.
Tumblr media
Eu não espero nada de todos estes homens que estão dentro de mim, nem de você, nem de ninguém, não quero fazer declarações de amor que, possivelmente, me ridicularizaria diante dos meus olhos. Quero continuar, pelo menos nesta área, fiel a mim mesma e aos meus sentimentos, mesmo que tenha que pagar caro por cada decisão tomada ou adiada.
Durante a noite, inúmeras vezes, questiono-me: O que será de nós e desta exacerbação de desejos inacabados, sem futuro, sem perspectiva de final e minada de frustações e desejos. Tudo tão negro. Tudo tão realmente impossível. Noutras noites digo-me, a queima-roupa, que muitas coisas ainda são possíveis e nem tudo está realmente soterrado entre nós. Deliro! Talvez! Como evitar este avalanche de delírios. Alias, ultimamente a única coisa que me conforta realmente é este meu delírio matinal.
Essa semana, folheando ao acaso uma revista, descubro essa palavra latina antiga: Mollitia: incapacidade de resistir as tentações do prazer. Por vezes, penso que seria bom e saudável se deixar guiar pela Mollitia. Não acredito nestas pessoas que escondem a verdade mais pura e dizem não precisar de sexo para ser feliz. Como seria deliciosamente bom nos deixamos guiar por essa estranha sensação: sem remorsos, sem culpas, sem resistência.
Tumblr media
Ontem fui com uma amiga a La Goutte d’Or, gosto deste bairro e desta parte pobre, desleixada, mendicante e fodida de Paris. Tão diferente dos outros bairros elegantes, residenciais e turísticos de Paris. A ordem rotineira, abjetamente limpa, ainda não se instalou completamente neste bairro. Existe sempre qualquer coisa de perigoso, agressivo, sujo e decadente no ar.
Sem contar os olhares brutais dos homens na minha direção, como se nos cobiçassem e, ao mesmo tempo, quisesse nos possuir ali mesmo no meio da rua, feita uma cadela vadia, numa forma de dominação e humilhação total. Eu disse a minha amiga que todos aqueles olhares vindos à nossa direção eram de ódio. Eles nos odeiam por causa da nossa liberdade de agir e pensar, por causa desta nossa maneira de existir, por causa do nosso sexo ardente que eles não conseguem aprisionar, por não sucumbirmos a essa passividade mortal. Ela sorrir descaradamente e não acredita no que digo, mas lá no fundo, eu acredito que seja isto. Estes homens desejam minha liberdade, meu amor, meu corpo e, ao mesmo tempo, tudo isto os fascina e provoca uma avalanche de medos e mistérios.
Inúmeras vezes a nossa paixão se escoou pelos quatros cantos do quarto, lavando o que restava de nossas vidas, tudo isto numa frenesia quase inacreditável, mas hoje, olhando em detalhes, tudo isto parece fazer parte de um passado longínquo e, algumas vezes, penso que nunca existiu. Não renego o passado, ele retorna, numa força endiabrada e não consigo impedir o fluxo de todas as nossas emoções.
Tumblr media
Não penses que estou enlouquecendo por causa da tua ausência ou que sofro os piores tormentos de amor, nada disso, estou me sentindo como um ferido de guerra que recupera as forças num confortável hospital e tem grandes planos de voltar ao campo de batalha. O que eu pensei inimaginável começa a se desenhar numa força estranha mais real: aos poucos, tua imagem vai se distanciando de mim que, algumas vezes, preciso forçar a memória para lembrar com nitidez o nosso passado.
Por incrível que pareça, eu sinto-me inteira, imbatível, sólida, no meu mais íntimo ser; como se dentro de mim tivesse nascido outra mulher. Uma mulher que acredita nas coisas da vida e da morte e que tem plena consciência do seu tempo e das relíquias do amor. As coisas ainda não estão muito nítidas, mas, pacientemente, vou traçando as trilhas da nossa história. Não existem culpados. As coisas são simplesmente assim.
Tumblr media
Esta semana, lembrei-me, faz quase um ano que escolhemos a separação, bastou tão pouco tempo para nos distanciarmos. Não digo esquecer, pois acho que nunca te esquecerei, mas inútil negar que existe uma distância melancólica entre os nossos destinos. Nunca imaginei que nossa história de amor ficasse retida no passado. Empacotada. Numa prateleira qualquer das nossas vidas. Não guardo rancores. Nem poderia. Não acuso ninguém. Não deu certo. Já estava marcado em alguma parte deste universo que o final seria assim. Como diz o povo: foi bom enquanto durou.
Tumblr media
Se tivesse que recomeçar eu o faria de novo. Viveria novamente todas as horas de amor e sofrimentos em tua companhia, disso tenho certeza, porém, procuraria me proteger um pouco mais, aqui e ali, para não sofrer tantas desilusões. Eu me entreguei por inteiro a você, como jamais me entregue a outro homem, mas o fracasso de nossa relação não pode ser explicado por conceitos, palavras, diretrizes, talvez não tivéssemos sintonizados para continuarmos juntos: por quê tentar explicar o inexplicável?
Sinto-me num estado de letargia curiosa, olhando meu eu mais profundo, posso dizer que eu sou feliz. Não uma felicidade fulgurante. Uma paz inaudível caiu sobre meu corpo e consigo passar horas e horas pensando, refletindo, fazendo planos para um futuro próximo. Ou simplesmente guardo o espírito vazio, imóvel, sem nenhum desejo, além de ficar em paz comigo mesma.
0 notes
fdeoliveirabr · 9 years
Text
DESMANTELO AZUL
Tumblr media
fotos felipe e brigitte de oliveira
Então pintei de azul os meus sapatos
por não poder de azul pintar as ruas,
depois, vesti meus gestos insensatos
e colori as minhas mãos e as tuas.
Para extinguir em nós o azul ausente
e aprisionar no azul as coisas gratas
enfim, nós derramamos simplesmente
azul sobre os vestidos e as gravatas.
Tumblr media
E afogados em nós, nem nos lembramos
que no excesso que havia em nosso espaço
pudesse haver de azul também cansaço.
E perdidos de azul nos contemplamos
e vimos que entre nós nascia um sul
vertiginosamente azul. Azul.
Tumblr media
Olinda, do alto do mosteiro, um frade vê
De limpeza e claridade
é a paisagem defronte.
Tão limpa que se dissolve
a linha do horizonte.
As paisagens muito claras
não são paisagens, são lentes.
São íris, sol, aguaverde
ou claridade somente.
Olinda é só para os olhos,
não se apalpa, é só desejo.
Ninguém diz: é lá que eu moro.
Diz somente: é lá que eu vejo.
Tumblr media
CHOPP
Na avenida Guararapes,
o Recife vai marchando.
O bairro de Santo Antonio,
tanto se foi transformando
que, agora às cinco da tarde,
mais se assemelha a um festim.
Nas mesas do Bar Savoy,
o refrão tem sido assim:
São trinta copos de chope,
são trinta homens sentados,
trezentos desejos presos,
trinta mil sonhos frustrados.
Tumblr media
Ah, mas se a gente pudesse
fazer o que tem vontade:
espiar o banho de uma,
a outra, amar pela metade
e daquela que é mais linda
quebrar a rija vaidade.
Mas como a gente não pode
fazer o que tem vontade,
o jeito é mudar a vida
num diabólico festim.
Tumblr media
Por isso no Bar Savoy,
o refrão é sempre assim:
São trinta copos de chope,
são trinta homens sentados,
trezentos desejos presos,
trinta mil sonhos frustrados.
Carlos Pena Filho
(1930 Recife/PE - 1960 Recife/PE)
1 note · View note
fdeoliveirabr · 9 years
Text
CARTAS DE BRASĺLIA
Tumblr media
fotos brigitte e felipe de oliveira
Desculpe se começo essa com os olhos inchados e roxos de chorar. Não pega bem dizer isto, mas sou correspondente exata. Ora, dirá você: draminhas de mulher insegura de si, portando, dos outros. Mas os outros serão seguros em relação a mim? Meu marido é? Ambição de felicidade, coisa tão boba, não tenho. Já aquele famoso conselheiro de infância, o livro da carochinha, ensinava que não havia no mundo criatura feliz, a não ser o homem sem camisa, um único a desfrutar este gracioso estado.
Portanto estou na clave das mulheres casadas que por serem mulheres e serem casadas cumprem uma certa espécie de infelicidade. Outras e outras viventes têm suas infelicidades distintas. Paciência. Observo as traições do meu amo e senhor e ele me atribui traições que não cometi. Não é bobo, não é desagradável? Tô me confessando a você no anonimato, portanto não havia mal nenhum em contar: também engano aquele que me engana. Em pensamentos, sim, correm as fantasias mais loucas, e duram minutos, mas é tudo desejo de vingança, puro prazer de, num acerto de contas, lhe jogar na cara: “Aprendi com você a variar de cama.”
Tolice. Tenho de pagar pelo que não faço, não me interessa conhecer outros homens, os que conheci me pesam como erros de concordância. Nunca acertei com nenhum. Vou desacertar outra vez? E esse cavalheiro ai que tem diploma de marido, me acusando daquilo que não faço. Bolas.
Tumblr media
Bem, toda essa batalha campal de ciúmes e discussões ásperas resulta do fato de ter alguém com quem converso no trabalho. Fique tão incapaz de suportar o famoso lar brasileiro que tive de recorrer ao expediente de conversar com alguém. Mulher? Não tive a sorte de encontrar uma com que me entendesse fora a culinária, moda e sexo: repertorio gasto. Então inventei o Galhardo. Ele é meu colega de serviço, também casado, também sem esperança de acertar o passo em casa e não querendo nada com aventura. Inteligente, crítico, céptico, lido e viajado, a gente bate papo sobre mil coisas e evita falar mal de suas próprias vidas. O Galhardo é o companheiro ideal para quem não quer se envolver em amores. Inácio não entende isto. Acha que deitamos no mesmo lençol e tal e coisa. Ridículo e pungente. 
Tumblr media
Ora, esse meu proprietário conjugal já desaprendeu a fala, como instrumento de comunicação amável. Só a utiliza para reclamar, censurar, inquerir policialmente. Não conta nada, não escuta nada, e para conversar tem que brigar; brigando, o assunto não é naturalmente a alegria de viver. Pode uma mulher passar as manhãs ralhando com as crianças, ouvindo a prosa mofada da velha genitora, depois ir pro Ministério bater máquina produzindo besteiras que não resolvem, até complicam a vida triste do povo, rodeada de colegas que não interessam absolutamente nem do ponto-de-vista intelectual, nem de qualquer outro ponto-de-vista, depois voltar pra casa, enfrentar a cara feia do ditador, outra vez meninos e meninas berrando e brigando, finalmente o estreitíssimo quarto de dormir, embora nem tão pequeno assim, mas apertados porque os dois corpos vivem uma intimidade que constrange, sufoca, dá náuseas... se viro na cama o pé esbarra na perna de um estranho, e este estranho será meu companheiro a vida inteira: faz sentido? É razão pra viver?
Tumblr media
Queria tanto que não fosse assim. Um apartamento que não fosse local de desencontro, mas de encontros. Um contava as novidades para o outro, a gente, comentava, esquecia, ouvia musica, até discutia, mas discutia o mundo e não a conta da luz. Sem tomação nem prestação de contas, atoamente, falar, ouvir, ideias, lembranças, bobagens engraçadas, carinho. Ou carinho já era demais, bastaria a convivência pacifica, alguma coisa parecida com um lar, sem exageros sentimentais.
Estou nessa: dubitativa, difícil, exausta. E ceguinha e mudinha, por cima de tudo. Se vejo, reprovam-se. Se falo, não sou entendida. O nome disso é casamento de onze anos de duração.
Tumblr media
Não estou pedindo a você que me salve com seus conselhos e orientações. Uma paz que me viesse de fora seria indigna, alias, não existe paz soprada. Porque então me exponho tão cruamente a um cavalheiro distante, de quem não espero nem pretendo nada senão receber minhas cartas sem respostas? Necessidade de desabar não explica bastante. Claro que desabafo na medida do possível, mas não digo tudo, e talvez o restante é que seja o essencial, o terrível (sem deixar de ser cotidiano). Já te escrevi pra te dar prazer, agora escrevo, quem sabe, pra te fazer infeliz pelo menos um instante, ferindo a sua sensibilidade com as minhas amargas trivialidades. E por que você foi o escolhido? Ou eu estou praticando pra escritora, com inveja da Rachel, da Clarice, da Grazia Deledda? Você pode pensar isto e mais alguma coisa de mim, que me importa? Importa é saber que neste momento, enquanto escrevo, escrevo e não me angustio: divirto-me. Sou uma outra mulher me ouvindo contar. E meu conto me diverte como se fosse de outra mulher. Ciao.
Carlos Drummond de Andrade.
PS. As “Cartas de Brasília” foram publicadas na coluna de Drummond, no Jornal do Brasil, em outubro de 1981.
T:
0 notes
fdeoliveirabr · 9 years
Text
ALEXANDRA DAVID- NÉEL: O GÊNIO DA AVENTURA
Tumblr media
fotos Felipe e Brigitte de Oliveira
Alexandra David-Néel (1868 - 1969) consagrou sua vida às viagens e ao estudo das culturas orientais. Uma mulher que incarnou diversos personagens-cantora de ópera, budista, orientalista, jornalista, escritora, aventureira, exploradora- e fez da sua existência um destino excepcional. Portadora de uma vontade de ferro, sempre em avanço sobre o seu tempo, foi a primeira Europeia a penetrar no Tibete proibido, em 1924. 
Tumblr media
Alexandra é hoje um símbolo da magia das viagens e da curiosidade dos encontros e descobertas. Ela sempre percorreu a vida acreditando nos seus sonhos e levando seus estudos sagrados do budismo ao limite do conhecimento.
Ela é feminista antes do feminismo. Numa época aonde o lugar das mulheres se resumia à função de esposa submissa e mãe, Alexandra sempre defendeu a necessidade das mulheres estudarem e trabalharem para se tornarem independentes.
 Sua personalidade fora do comum se revela cedo numa infância triste e sem amor. “Eu revi com mais discernimento, do que quando eu era jovem, o que os meus pais foram um para o outro durante 53 anos de casamento. Os dois não foram feitos para a vida em família que deseja a união, a solidariedade e o amor dedicado. Como eles foram infelizes e como tornaram minha juventude triste.”
Tumblr media
Partir sempre esteve no seu sangue, aos 15 anos, escondida dos pais, viaja para a Inglaterra e Itália. Na juventude frequenta anarquistas, vira franco-maçom e termina se convertendo ao budismo. Aos 23 anos uma herança lhe permite de visitar durante um ano a Índia e o Ceilão. O vírus das viagens finalmente a contamina e este contato com o continente asiático vai lhe abrir os grandes horizontes. Dai em diante as viagens farão parte integrante da sua vida. Ela percorre a Grécia, Indochina, Espanha, Argélia, vive dois anos em Londres e 11 anos na Tunísia.
Ainda jovem, põe em prática as suas teorias e começa a ganhar a vida como cantora de Ópera em Hanói (Indochina). De 1897 a 1900, ela vive com um pianista em Paris, aceita convites para cantar nas Óperas da Grécia e Tunis. Na Tunísia encontra seu futuro marido, Philippe Néel, engenheiro dos caminhos-de- ferro. Ferrenha feminista, durante quatro anos, ela vive uma relação fora do casamento com Néel. Finalmente, aos 36 anos, se deixa convencer e aceita a proposta de casamento. O cotidiano do casamento a deixa infeliz e o vírus das viagens vão lhe contaminando a alma. “A igualdade de um casal é a união inteligente e forte de duas forças e de duas inteligências. A amizade que torna dois indivíduos em um só.”
Tumblr media
monasterio de Rumtek-Sikkim
Finalmente, em 1911, abandona essa vida tranquila que a sufoca e parte para as Índias. Promete ao marido que retorna dentro de 18 meses, a curta viagem finalmente se entendeu por 14 anos. Durante toda a sua vida ela sempre manteve uma correspondência com o seu marido.  Numa de umas cartas, depois de anunciar o retorno, ela se queixa da sua falta de entusiasmo pela sua volta. Não somente ela retorna 14 anos depois, mas vem acompanhado do jovem lama tibetano, Yongden, que se tornara seu filho adotivo em 1929.
Durante todas as suas viagens ela sempre mostrou uma coragem e uma dureza psicológica e física excepcionais. A autora de “Místicos e Mágicos do Tibete” finalmente estava realizando o seu sonho: uma vida independente, livre e cheio de aventuras. Sua maneira de viajar e estudar as filosofias e as religiões asiáticas colocou-a em avanço do seu tempo. Nunca menosprezou os habitantes das regiões, numa época em que todos os colonizadores desprezavam os colonizados. Aprendia o idioma do país, vivia dentro dos costumes e sempre frequentava as mais altas celebridades religiosas, homens de letras e sábios do local. A sua sede de conhecimento é enorme, estuda as diferentes escolas do budismo indiano, tibetano, chinês e japonês.
Tumblr media
fonte internet
Não se contendo de simples lições teóricas, ela passa três anos num eremitério no Himalaia, para receber os ensinamentos de um lama tântrico tibetano. Sobre esta época, ela confessa: “Eu cheguei ao máximo do meu sonho.” O seu livro “O Lama das Cinco Sabedorias” torna-se o primeiro romance tibetano.
Tumblr media
Durante toda a sua existência ela se sentiu enfeitiçada pelo Tibete, que segundo ela, parecia pertencer a um outro mundo. Este “país de titãs e deuses” foi anexado a força pela China em 1959. A grandeza de Alexandra David-Néel era por em prática as suas ideias. “Viajar é o mesmo que estudar, realizar um longo contrato com a juventude.”
Em 1924, pela primeira vez, uma mulher estrangeira, consegue penetrar em Lhassa, capital do Tibete, oito meses foram necessários para chegar à cidade proibida.  Ela já tinha feito várias tentativas, mas era sempre expulsa pelas autoridades locais. Resolveu se disfarçar de mendigo tibetano e através da solidão das montanhas, enfrentado tempestades de neve, frio insuportável e lugares perigosos, repletos de bandidos, parte para a capital do Tibete. A sua única companhia, era o seu filho adotivo, o lama Yongden. “Qualquer que seja o preço a pagar, valeu a pena ter percorrido este estranho país.” Quando ela começou essa aventura rude e perigosa já estava com 55 anos.  Essa viagem a torna célebre e todos os jornais relatam as suas aventuras. Ela escreve “Viagem de uma Parisiense à Lhassa”.
Tumblr media
Ela se instala na França e passa nove anos estudando o budismo, os textos sagrados e dando conferências por toda Europa. Novamente o vírus das viagens retorna, aos 69 anos, começo de 1937, ela parte novamente em China. Desta vez a viagem será curta, somente alguns meses, mas a guerra sino-japonesa começa, logo em seguida a guerra civil em China e em 1939, a Segunda Guerra Mundial.  Impossível o retorno. A curta viagem vai finalmente durar nove anos. Somente em 1946 no final das hostilidades, ela volta para a França.
Tumblr media
No final da vida ela continua seus estudos e escritos, embora sofrendo de reumatismo, escreve todos os dias e próximo de 101, ela pede a renovação do passaporte, pois queria retornar às terras tibetanas. Os sonhos de viagens vão lhe acompanhar por toda a vida. Na idade de 101 anos, ela parte para uma última viagem, desta vez sem retorno. Suas cinzas, junto com a do seu filho adotivo Yongden, serão espalhadas pelo Ganges, o rio sagrado da Índia.
0 notes
fdeoliveirabr · 9 years
Text
A SOLIDÃO DO DRAGÃO
Tumblr media
fotos brigitte de oliveira
Ando descrente de tantas coisas. Nada me interessa verdadeiramente. Penso que estou perdendo essa faculdade preciosa de sentir algo pelo próximo. Às vezes, até me emociono, mas por ninharia, nada demais. Por exemplo: um voo de um pássaro, uma criança que brinca ou uma mulher que sorrir. Tudo ao meu redor deixa-me indiferente. É como se as pessoas não existissem realmente. Estou vacinado. Elas não conseguem despertar os meus sentimentos.
Tumblr media
As coisas do coração não têm mais essa capacidade de me envolver. Estou meio vazio. Isto é bom e ao mesmo tempo ruim. Vou seguindo meu caminho, solitário, sem olhar para trás. Por vezes, tenho medo deste itinerário e tento reagir. Esboço projetos. Invento coisas. Disfarço tão mal, mas logo em seguida, tudo volta à mesmice de sempre.
Vivo num mundo em branco e preto. Uma fotografia velha escondida no fundo do baú. Existo num mar de tranquilidade e incerteza. Fico prisioneiro desta inércia. Sinto-me bem e mal. Aos poucos, essa inércia se instala e a sensação de bom e ruim não tem mais nenhuma relação comigo.
Pareço imunizado contra o amor ao próximo. Aqui e ali, algumas mulheres, ainda têm o dom de me despertar paixões. Um deslumbramento. São raras é verdade, porém, não qualifico isto de amor. Eu as desejo e pronto. Como se deseja uma bebida gelada ou um prato de comida fumegante. Na realidade, quero me saciar o mais rápido possível, me lambuzar, sentir prazer, pagar a minha conta e depois partir. Se possível, sonhar por breves instantes um futuro entre nós e depois esquecer completamente.
Tumblr media
Como uma canção inacabada, vou seguindo pelo ar, leve e pesado. É possível dizer que me sinto como um avião: leve o bastante para voar, mas pesado para compreender como isto é possível. As coisas vão indo e sigo com elas; impassível, descolorido de sentimentos.
As coisas não me importam mesmo. Ou pelo menos, aquelas coisas que todos julgam por demais importantes. Minha maior preocupação é a sobrevivência: ter dinheiro no bolso para tomar minha cerveja e fumar meus cigarros. Há um hiato dentro de mim e não sei como superá-lo. Talvez, mesmo não queira superá-lo.
Não posso dizer que me sinto bem, nem que me sinto mal. Acho mesmo que não posso dizer que sinto. Creio mesmo que estou perdendo essa capacidade vital do ser humano. Nada me comove. É aí que me preocupo… Estou preocupado, pareço perder a humanidade. Ou será a humanidade que me perde?
Tumblr media
Qualquer que seja a resposta, o fato é que não estou bem. Divido-me, estilhaço-me, conflito-me. Não consigo sequer equacionar as perguntas às quais busco responder. Não tenho mais medo da morte, nem de morrer. Se partisse hoje, talvez ficasse chateado por não ter me despedido de umas poucas pessoas. Mas isto também seria absolutamente superável.
Sinto-me podre por dentro. Um mau cheiro horrível, como se, em vez de sangue, escorresse dentro nas minhas veias um riacho de água suja. Uma lástima. Por mais esforço que faça, existe sempre algo que me deixa com essa sensação de imundície. Sinto-me rabugento. Um esgoto a céu aberto que fede e incomoda à vizinhança.
Preciso urgente de um renascer que desabroche em algo de bom e belo. Eu traço diretrizes que abandono em pouco tempo. Mentalmente refaço projetos que nunca executarei, eu sou um erro e, minha vida ou este erro, se desenha em minúsculas pinceladas. Todo dia é a mesma coisa: a mesmice de sempre. Eu não ponho ardor nos meus atos e sentimentos. Deixo-me levar pelo marasmo, pela sonolência da vida e não coloco uma gota de verdade nas minhas ações.
Tumblr media
Estou perdido entre dois mundos, a poucas horas de um terrível naufrágio, porém, não encontro forças para gritar e pedir socorro. Deixo-me afogar suavemente, não esperneio, desisto facilmente. Um quadro clínico mortífero e tudo isto é culpa exclusivamente minha.
Sejamos francos e realistas: eu não me amo o suficiente. A verdadeira vida foge diante desses dias imaturos e corriqueiros. Meus sonhos não me aquecem como outrora, envelheço a cada dia, sinto as horas insuportáveis aonde sou obrigado a suplantar mais um dia. Eu sonho escondido a minha vida em vez de vivê-la. Estou aniquilado e sinto o abismo aos meus pés. Tenho saudade do homem que eu era: saudável, confiante, apaixonado, amoroso de tudo.
Talvez eu seja um enigma para mim mesmo. Se eu pudesse reunir todos estes pedaços desencontrados. Tenho tanto a realizar e tão pouca coragem para concretizá-los. Toda a minha vida se resume nesta falta de ambição crônica. Vontade de não mudar, de nada tocar, de se deixar guiar pelo acaso.
Tumblr media
Existe algo que tiraniza. Uma infinidade de sentimentos antagônicos que se disputam, aniquilam-se e trocam segredos que desconheço. Dirijo inseguro nesta autoestrada. Uma voz ordena: "Por aqui!" Outra voz toma o relevo e diz: "Por ai não, vamos por aqui." Hesito. Falta-me ousadia.
A solução é perambular sem desejo. Sou apenas uma sombra do antigo homem que eu era. Viver desta maneira não vale a pena: é humilhante demais. Tenho piedade de mim. Faço parte desta caravana de derrotados. Caminho de cabeça baixa sob a fúria desses dias sem fim.
1 note · View note
fdeoliveirabr · 9 years
Text
JE SUIS CHARLIE
Tumblr media
Eu sou charlie!
0 notes
fdeoliveirabr · 9 years
Text
OS GRITOS DOS MUROS DAS CIDADES
Tumblr media
Fotos: Felipe e Brigitte de Oliveira
As cidades nos deixam mensagens através dos seus muros. Algumas gritam por justiça, outras por amor, outras simples desabafos. Não é preciso muito para desvendar os mistérios, bastam olhos abertos, sensibilidade apurada e uma curiosidade para aceitar os seus gritos.
Tumblr media
La Rochelle (França): Ei você! Eu te amo!
Tumblr media
Nepal: Os olhos de Buda
Tumblr media
Burkina Faso: É preciso lutar contra o fatalismo suicidário.
Tumblr media
Buenos Aires: Maradona
Tumblr media
Burkina Faso: acidentes da vida
Tumblr media
Paris: Aos ricos o trabalho, a nós os prazeres.
Tumblr media
Veneza: Máscaras
Tumblr media
Parque Ouagadougou:Toda forma contra o pudor é proibida.
Tumblr media
Londres: Tate Gallery
0 notes
fdeoliveirabr · 9 years
Text
PERIGORD: O PARAISO SOBRE TERRA
Tumblr media
       Todos os anos, cerca de três milhões de turistas de todas as partes do mundo, vêm descobrir e usufruir as delícias desta região. O Périgord e suas três principais cidades, Périgueux, Bergerac e Sarlat, concentram nada menos do que 39 monumentos tombados como históricos.
Tumblr media
       A região, durante o verão europeu, de junho à agosto, transforma-se num grande festival a céu aberto. Quase todas as cidades têm o seu próprio festival de música (jazz, clássica, popular, rock) ou festival de teatro ou cinema. O destaque é para o festival de Artes e Mímica, na cidade de Périgueux, criado em 1983, em homenagem a Marcel Marceau, hoje considerado um dos festivais mais importantes de mímica da Europa.
       O Périgord, com seus rios, vales e natureza intacta, concentra nada menos que 33 parques e jardins abertos ao público, 14 deles têm o label “jardim extraordinário”. Não se pode ir à região sem visitar o jardim de Eyrignac, bem no centro do Périgord negro, que existe depois do século 18. O jardim de Marqueyssac, em Vézac, é outro deslumbre para os olhos. Pode-se admirar o vale da Dordogne, cortado pelo rio do mesmo nome, com suas vinhas, vilarejos e castelos. Os estrangeiros são unânimes ao afirmar que é um dos panoramas mais bonitos do mundo.
Tumblr media
       O vale da Vézère, conhecido também como “O vale do Homem”, tem 15 sítios históricos inscritos ao patrimônio mundial da UNESCO. Próximo à cidade de Eyzies-de-Tayac, existem 37 grutas e abrigos, assim que numerosos sítios da era paleontológica superior. A pré-história é parte integrante desse patrimônio cultural excepcional. Uma visita obrigatória é o Museu Nacional da Pré-História, situado a Eyzies-de-Tayac. O museu com seus 3000 metros quadrados, reúne a mais importante coleção paleontológica da França.
Tumblr media
                           A ARTE DE VIVER À LA FRANCESA
       A cozinha do Périgord, conhecida no mundo inteiro, tem suas bases no fois gras, trufas (“diamante negro” do Périgord) e Cèpes (cogumelos). Uma cozinha rústica, impregnada de produtos naturais, mas refinada, faz o charme e o savoir-faire do Périgord. Numerosos são os cozinheiros que utilizam os produtos da região e perpetuam a “cozinha à antiga”. Outros “chefs” tentam modernizar essa cozinha ancestral. O turista tem a escolha de comer, num pequeno restaurante e degustar um bom fois gras ou escolher os inúmeros restaurantes, com chefes cozinheiros estrelados que propõem uma cozinha requintada e moderna.
Tumblr media
       Claro, quando se fala na França, o vinho é rei. Os vinhos de Bergerac com seus 2000 anos de tradições é, depois da região de Bordeaux, que possui as mais importantes vinhas do sud-oeste da França. São 13 000 hectares de vinhas que se estendem por 93 comunidades. O Périgord é dividido em quatro regiões: O Negro, Verde, Branco e Roxo. Cada região tem a sua especificidade. A região de Bergerac, o Périgord Roxo, oferece ao amador de vinho uma fabulosa diversidade.
Tumblr media
                                 Lascaux: arte pré-histórica
       A gruta de Lascaux, conhecida como a “Capela Sistina da arte rupestre”, recebe cerca de 270 mil visitantes por ano, é de longe, o sítio turístico mais frequentado do Périgord. A gruta foi descoberta em 1940, porém a grande afluência de turistas, nos anos que se seguiram, causou danos às pinturas. A solução foi fechar às portas de Lascaux ao público em 1963, senão, o acerco de pinturas desapareciam por completo devido aos fungos e gás carbônico exalado pelos milhares de turistas.
         A gruta foi reconhecida como patrimônio da humanidade pelo UNESCO, em 1979, devido ao testemunho excepcional da história da humanidade. A poucos metros da gruta original foi construída, Lascaux II. Uma réplica idêntica da caverna original, aonde os visitantes têm acesso.
Tumblr media
       A gruta de Lascaux com 200 metros de galerias fica na cidade de Montignac-sur-Vézère, a 50 km de Périgueux. Lascaux não é a única caverna do Périgord, mas junto com a gruta de Altamira, na Espanha, são as mais importantes graças ao acervo pré-histórico excepcional. As 600 pinturas, na grande maioria, cavalos, veados, touros, felinos, cabras selvagens, foram feitas há 17 mil anos pelos homens de Cro-Magnon. O homem de Cro-Magnon viveu cerca de 35 mil anos. Estudos mostram que este Homo Sapiens tinha entre 1.70 e 2 metros e possuía um físico idêntico do homem moderno.
       No começo século XX, arqueólogos achavam que essas pinturas rupestres foram feitas numa necessidade ligada essencialmente a caça, sem nenhuma conotação religiosa ou mágica. O arqueólogo, André Leroi-Gourhan (1911-1986), foi um dos primeiros a interpretar essas obras de arte pré-histórica de uma maneira diferente. Ele viu estes abrigos como santuários religiosos e denomina Lascaux como a “Capela Sistina da pré-história”. Leri-Gourhan, nos alerta para a compreensão dos tesouros espirituais e artísticos mais antigos da humanidade.
Tumblr media
                               SARLAT: CIDADE MEDIEVAL
       A cidade medieval de Sarlat com mais de mil anos de história, recebe todos os anos, cerca de dois milhões de visitantes, a sua arquitetura medieval excepcional e sua reputada gastronomia, fazem dessa cidade um local privilegiado de arte e história.
       Também conhecida como Sarlat-la Canéda, foi fundada no século 9, ao redor de um monastério, hoje com 10 mil habitantes, consolidou através dos tempos, uma reputação de cidade prestigiosa; aonde a história se mistura com as especialidades gastronômicas, trufas, fois gras, nozes, licores e conservas renomados de patos e ganso, especialidades que são admiradas no mundo inteiro.
Tumblr media
       Sarlat possui um dos perímetros urbanos medievais mais importantes do mundo. O turista segue meio ao acaso as ruelas da cidade, e se rende imediatamente à beleza e o charme das casas e hotéis particulares. Uma arquitetura intacta da época medieval e começo da Renascença.
        A cidade atual tem a sua própria dinâmica e possui um label mundial turístico e gastronômico. Os festivais de teatro e cinema estão entre os mais importantes da França. Pode-se destacar como tempos fortes: o festival de teatro (julho-agosto), de cinema (novembro), feira das trufas (novembro-março) e famosa festa da trufa, do fois gras que se realiza nas ruas da cidade nos três finais de semana do mês de janeiro.
0 notes
fdeoliveirabr · 10 years
Text
A MISTERIOSA VIOLËNCIA DOS ELEFANTES
Tumblr media
fotos Brigitte e Felipe de Oliveira
Tumblr media
Nesta mesma época, no parque natural de Uganda, a milhares de quilômetros, alguns elefantes começaram a ficar agressivos e, sem uma razão aparente, agrediram vários carros de turistas.
No Quênia, outro país africano, os elefantes voluntariamente atacavam e matavam os bovinos dos guerreiros Massai. Os únicos que têm permissão de criar gado dentro da reserva, aonde vivem milhares de animais selvagens.
A comunidade científica ficou abismada e sem compreender tal comportamento dos elefantes. Foi consultada uma série de especialistas para tentar descobrir os motivos dessas agressões. Essa agressividade dos mamíferos era inusitada, pois todos sabem que os elefantes vivem em paz com todos herbívoros da savana.
Tumblr media
O problema era difícil de resolver, mas aos poucos, o mistério começou a ficar mais nítido na cabeça dos científicos. A resposta veio por etapas.
Durante a ditadura do sanguinário Idi Amin Dada, em Uganda, o tirano ordenou que fossem massacradas grandes manadas de elefantes para se apoderar do marfim e vendê-los no mercado negro internacional.
No Quênia, o governo retirou algumas parcelas de terra dos Massais, os guerreiros para se vingarem desta decisão, resolveram massacrar os elefantes. Os paquidermes como não podiam matar os habitantes das savanas, resolveram se vingar no gado dos Massai. Os elefantes sabiam que o gado é uma das maiores riquezas deste povo das savanas.
Tumblr media
Os exemplos de Uganda e Quênia, podem se compreender perfeitamente, mas porque os elefantes do Kruger que são protegidos e não conhecem a crueldade dos homens fariam essas aberrações de matar herbívoros. Por que motivo alguns elefantes resolveram atacar os pobres rinocerontes? A resposta não chegou a tardar. Descobriu-se que alguns elefantes que foram introduzidos no Kruger Park, para uma melhor diversificação do patrimônio genético, tinham vindo de Uganda e do Quênia.
Os veterinários compreenderam que estes jovens elefantes, introduzidos no Kruger, eram os sobreviventes dos que foram massacrados em Uganda e caçados no Quênia. Estes jovens elefantes, traumatizados pelo massacre dos seus semelhantes, tinham perdido as diretrizes e sofriam de um comportamento psicológico estressante. Os animais, de alguma maneira, tinham perdido a referência familiar e comportavam-se de uma forma violenta.
Tumblr media
A solução encontrada foi introduzir elefantes mais velhos que nunca tiveram traumas. Na tentativa de guiar os mais novos e ensinar os comportamentos da manada. O resultado foi surpreendente, em poucas semanas, os ataques dos elefantes jovens cessaram. Os elefantes mais velhos orientaram os mais jovens, dando normais e diretrizes de comportamento. Poucos meses depois, os ataques cessaram nos três países.
Transportar esses parâmetros para o comportamento selvagem dos nossos jovens e chegasse à conclusão de que falta uma diretriz moral e humanista. Os jovens delinquentes perderam a noção do valor de uma vida e principalmente a noção do bem e do mal. Os pais não tem mais autoridade sobre eles. Estes jovens ficam a mercê de influências nefastas e abandonados às regras da selvageria.
Tumblr media
 As estatísticas provam que a maioria dos menores delinquentes não tem a autoridades dos parentes. Estão abandonados a si mesmos e sob a influência das drogas. Não é possível que se tire a vida de outro barbaramente por causa de um telefone portátil, um carro ou simplesmente num momento de fúria bestial. Essa violência gratuita, não somente da juventude, é fruto da decadência dos valores morais e humanos da nossa sociedade capitalista.
0 notes
fdeoliveirabr · 10 years
Text
Parque Nacional Kruger: A Descoberta dos Big Five
Tumblr media
Fotos: Felipe e Brigitte de Oliveira
Os cincos grandes mamíferos: leões, leopardos, rinocerontes, elefantes e búfalos, conhecidos como os “Big Five”, atraem turistas do mundo inteiro a procura de sensações fortes e aventuras. Dirigindo o seu próprio carro ou nos safaris, organizados pelo parque ou acampamentos privados, o visitante penetra num mundo livre e selvagem do reino animal. 
Tumblr media
O turista com todos os seus sentidos em alerta e uma máquina fotográfica nas mãos, tem a chance de ver e fotografar de perto, os animais mais belos e nobres sobre a face da terra. Quando se fica frente a frente com um dos “Big Five”, tem-se a sensação de viver uma das experiências mais inusitadas e ousadas. Mas é bom lembrar que neste paraíso animal não vive somente os “Big Five”. A diversidade dos animais selvagens, os pássaros, os rios repletos de crocodilos, as paisagens exuberantes, o cheiro da savana e o espetáculo de um pôr do sol, deixam lembranças inesquecíveis.
                              O NASCIMENTO DO KRUGER PARK
O Parque Nacional Kruger é a maior reserva animal da África do Sul, cerca de 20 mil km quadrados, fazendo fronteira com o Moçambique e o Zimbabué, longo de 350 km do norte ao sul e largo de 60 km de leste a oeste. A título de comparação, o parque Kruger é quatro vezes maior do que o Distrito Federal. Recentemente, o Kruger Park, aboliu as fronteiras no extremo norte e os animais podem circular livremente pelo Park National Gonarezhou, do Zimbabué e o Park National Limpopo, do Moçambique.
Essas duas reservas fazem fronteiras com a África do Sul. A união desses três parques fez nascer uma das maiores zonas de proteção animal do mundo. São 95 mil metros quadrados de superfície, aonde os animais podem circular livremente sob a proteção dos guardas florestais.
Tumblr media
O parque Kruger nasceu em 1896, sob a proteção do presidente sul-africano, Paul Kruger. No começo era apenas uma pequena reserva perto do rio Sabie. Em 1902, o major James Stevenson-Hamilton foi nomeado o primeiro presidente da reserva. O Major Stevenson-Hamilton, foi um dos pioneiros na proteção da fauna. O militar possuía uma visão ecológica bastante evoluída para o seu tempo. Aumentou o parque adquirindo novas terras e proibiu à caça dos animais selvagens. Expulsou tribos das áreas protegidas e fez renascer uma fauna selvagem que tinha sido aniquilada pela caça indiscriminada e pelas epidemias.
Somente em 1926 é que todas as reservas da região foram reunidas, dando nascença ao primeiro parque nacional da África do Sul. O Kruger National Park é aberto ao público e o sucesso foi imediato, em1935, a reserva animal já recebia cerca de 26 mil visitantes por ano. Naquela época, a principal atração dos visitantes eram os leões e continua sendo até os dias atuais.
Tumblr media
                         PIONEIRO NA PROTEÇÃO AMBIENTAL
Os cincos grandes animais, antigamente os preferidos dos caçadores, hoje são os preferidos de milhares de turistas que tentam captar este instante de vida selvagem através de uma fotografia. O Kruger Park possui uma fauna fantástica de 147 espécies de mamíferos, destacando-se 15000 leões, 1000 leopardos, 200 guepardos, 2000 hienas, 350 cães selvagens, 11700 elefantes, 5000 rinocerontes brancos, 350 rinocerontes negros, 32000 zebras, 3000 hipopótamos, 9000 girafas, 25000 búfalos, 150000 impalas e um número incalculável de outros animais.
Depois de 1989, os guardas florestais (rangers) do parque, não abatem mais os elefantes. O controle da população desses mamíferos é feito através de transferências para outros parques. O censo desses mamíferos, que é feito através de helicopteros, mostra que atualmente a população de elefantes chegou a 12 mil animais. A reserva suporta somente uma população de oito mil elefantes.
Tumblr media
Das 18 reservas animais na África do Sul, o Kruger Park é um dos pioneiros em matéria de preservação e ecoturismo e um líder mundial quando se fala de tecnologias avançadas sobre a proteção do ambiente. O Kruger Park abriga mais de 517 espécies de pássaros, alguns só são encontrados dentro da reserva. Uma vegetação diversificada com mais de 300 espécies de árvores. Sem contar 114 espécies de reptis, 50 espécies de peixes e uma diversidade enorme da fauna e da flora que faz do parque um local único no mundo.
                            UM MUNDO LIVRE E SELVAGEM
A biodiversidade, a história pela preservação dos animais selvagens e a enorme superfície, faz do Kruger Park, uma das primeiras e mais famosas reservas animais do planeta. Devido ao fácil acesso, via estradas asfaltadas ou aeroportos nos acampamentos, alguns turistas acreditam que o parque seja um enorme zoo, aonde os animais perambulam livremente. Puro engano. O Kruger Park é uma reserva animal selvagem, aonde a vida e a morte travam uma luta incessante todos os dias.
Tumblr media
Através de um sistema de estradas asfaltadas muito bem sinalizadas, pequenas estradas de barro e acampamentos confortáveis, o turista pode ter a falsa impressão de que não existe perigo. O perigo está lá, escondido, mas sempre presente. O perigo surge em cada esquina, na presença de um elefante de seis toneladas que deseja preservar seu espaço vital ou de uma manada que protege seus filhotes. Dos leões que se camuflam sob o capim alto, do leopardo nas árvores ou nas margens dos rios infestados de crocodilos. Basta lembrar que centenas de moçambicanos são devorados pelos leões todos os anos, ao tentarem atravessar a reserva, na esperança de penetrar ilegalmente na África do Sul.
Estima-se atualmente a 25 mil o números de rinocerontes vivendo no estado selvagem no mundo. Oitenta por cento desses animais vivem na África do Sul. Somente este ano, cerca de 800 rinocerontes foram abatidos ilegalmente por traficantes em todo o país. O Kruger Park teve 476 rinocerontes abatidos. Os traficantes são na grande maioria moçambicanos, oriundos de um dos países mais pobres do mundo, aonde quase todos os rinocerontes foram exterminados.
Tumblr media
A MAGIA DOS SAFARIS
O ponto culminante de uma estadia na reserva são os safaris. A diversidade das paisagens e a variedade dos animais deixam lembranças de uma rara intensidade. Os três mil km de estradas do parque que o visitante explora e admira, sentindo a natureza selvagem, a poeira das terras africanas e beleza de um continente completamente estranho e belo.
         Os animais estão por toda parte, mas determinados lugares, recebem a preferência de certos animais. A maioria dos leões prefere estabelecer seus territórios na parte central do parque e em torno dos acampamentos de Crocodile Bridge e Lower Sabie. Nesta área se concentram o maior número de zebras e gnus.
As maiores manadas de elefantes ficam na zona norte do Rio dos Elefantes. Os elefantes do Kruger Park são conhecidos por suas grandes presas de marfim. Nos anos 70, o parque abrigou o que hoje é conhecido como “ As Setes Maravilhas”, sete grandes elefantes dos quais as presas mediam até 3,17 metros de comprimentos e pesavam cerca de 45 quilos. Algumas dessas presas estão expostas no Elephant Hall du  Goldfields Environmental, no acampamento de Letaba.
Tumblr media
Não deixe que os “Big Five” faça esquecer os outros animais. As elegantes girafas, os maiores animais terrestres do mundo, algumas com 6 metros de altura, são uns dos animais mais populares do parque. A quantidade enorme de pássaros, de todas as cores e tamanhos, é uma fonte de prazer para os visitantes apaixonados pela natureza.
Tumblr media
                                      ACAMPAMENTOS
O turista que visita o parque por um final de semana ou vários dias, tem diversas formas de acomodação. Pode-se optar por um lodge num dos acampamentos do parque ou nos lodges dos acampamentos privados de luxo. O camping ou a caravana também são boas opções. Fica ao gosto do cliente e de suas opções financeiras. A grande maioria dos acampamentos possue restaurante, supermercado, posto de gasolina, piscina, cafeteria.
Tumblr media
Os principais acampamentos são Pretoriuskop, o primeiro acampamento aberto, perto de Numbi Gate. Na parte sul do parque, Berg-en-Dal, lower Sabie e Skukuza, estes três mais fáceis de acesso e com todos os requisitos para receber confortavelmente os turistas. Na parte central, encontra-se o acampamento de Satara, o segundo maior campo de repouso que fica nas zonas mais verdes do parque. Um dos melhores em termos de paisagens exuberantes é o acampamento de Olifantes, preferir o lodge que tem vista para o rio Olifantes. O campo de Letaba, aonde se encontram as presas das “Sete Maravilhas” é uma das melhores opções. Na parte norte do campo, de difícil acesso, fica os acampamentos de Mopani, Shingwedzi e Punda Maria.
0 notes
fdeoliveirabr · 10 years
Text
SARTRE-SIMONE-DOLORES
Tumblr media
Simone de Beauvoir aceita a condição e anos depois dirá: “Quando nos separamos, depois daquele encontro no começo do mês de agosto de 1929, eu sabia que ele jamais sairia da minha vida.” Para Simone, o relacionamento com Sartre era algo essencial, um amor necessário, permanente, a união dos dois intelectuais vai durar toda a vida, embora, cada um do seu lado colecionará amores paralelos.
Tumblr media
Sartre parte em 1945 para os EUA como enviado especial do jornal Le Figaró e Combat, lá ele encontra uma jovem chamada Dolores Vanetti. Os dois vão se conhecer e deste encontro nasce uma grande paixão. Numa entrevista, anos mais tarde, Dolores diz: “Ele era de uma alegria efervescente, contava um bocado de histórias somente para me divertir e me fazer entrar dentro da sua vida.” Sartre e Dolores, aproveitam o que existe de melhor nestes anos em New York. Em 1974, aos 70 anos ele confessa numa série de entrevistas a Simone de Beauvoir: “Dolores me deu a América.”
Sartre é obrigado a retornar a Paris e a sua rotina continua: escritos, livros, artigos, encontros, festas em Saint-Germain-des-Près. Essa rotina intelectual parece não ser suficiente. Falta qualquer coisa. Seis meses depois ele planeja uma nova viagem a N.Y e retorna para se encontrar novamente com Dolores. A Simone, ele escreve quase pedindo desculpas: “Vou parar essa história estúpida que não tem nem rima nem razão.” Sartre não era homem de se deixar dominar pelos remorsos. Era Dolores que ele queria, ela era o centro das atrações, e somente ela estimulava a sua imaginação. “Ele tinha, diz Dolores, um modo de amar que era único. Sempre colocava toda sua energia, inteligência e talento em me escutar, compreender, em amar; tudo isto acabava criando em você uma irresistível atração.”
Tumblr media
dolores vanetti
Sartre ama essa vida nova iorquino e vive dois meses e meio com Dolores: dividindo sua vida, frequentando os seus amigos e os lugares favoritos dela. Numa carta ele confessa a Simone: “Aqui a vida é doce e sem histórias.” Sartre se integra completamente a N.Y e adia ao máximo o seu retorno. Inventa desculpas para si mesmo, mentiras, promessas, jogo duplo, presentes, sedução, viagens amorosas. Seu talento e sua imaginação serão cada vez mais aprimorados para sair deste emaranhado de emoções. Ao explicar a Simone as suas razões, ele prometia a Dolores: “Venha para Paris e eu caso com você.”
De retorno a Paris o grande sujeito de conversa entre Sartre e Simone será o “dossier Dolores”. Simone vai ter que usar todas as suas forças e artimanhas para convencer Sartre: “Ao seu retorno dos EUA ele fala muito de Dolores. Eles tinham projetos de passar três ou quatro meses por ano juntos. As separações não me assustavam, mas ele evocava com tanta alegria as semanas passadas em N.Y que eu ficava inquieta. Eu me perguntava se ele não estaria mais apaixonada por ela do que por mim.”
Tumblr media
Diante de tal situação Simone impõe a Sartre a eterna questão burguesa da esposa traída: “Você tem que escolher: ela ou eu?” E Sartre dá a sua famosa resposta de ambiguidade: “Eu gosto enormemente de Dolores, mas é com você que eu sou.”
Numa viagem pela América Central com Dolores em 1949, eles finalmente vão terminar o romance. A situação começava a ficar confusa entre os três. A história de amor deles termina como tantas outras histórias banais. Sartre propõe a Dolores não terminar completamente e lhe oferece um apartamento e encontros regulares. Um contrato de amizade para a vida e o posto de amante oficial na vida do escritor. Dolores recusa. A distância e o tempo deixam Dolores magoada, ela chega mesmo a falar de uma “crueldade monótona” que se instalou entre ambos. Nunca acusa Sartre diretamente, mas deixa a entender a destruição de inúmeras vidas.
Tumblr media
Em 1974, Simone confessa: “Dolores foi a única que me fez realmente medo.” Sartre morreu em 1980, aos 75 anos, provocando uma das maiores manifestações intelectuais do século XX. O pequeno homem solitário, o anarquista, o pai de existencialismo, entra dentro de uma espécie de legenda literária. Em Nova Iorque, o consulado da França, neste mesmo dia, organiza uma homenagem a Sartre. No meio do público, uma pequena mulher, sozinha, triste, anônima, olha melancólica as últimas imagens do escritor. Era Dolores Vanetti. 
0 notes