VIVA VITALINO! “Nos anos 1920, Mestre Vitalino cria a banda Zabumba Vitalino, da qual é o tocador de pífano principal. Na década de 1930, possivelmente influenciado pelos conflitos armados do período, modela seus primeiros grupos. As cenas que remetem à ordem e ao crime no sertão brasileiro são recorrentes em sua produção. Entre bandidos e soldados, policiais, ladrões de cabra e de galinha, destacam-se as figuras dos cangaceiros Lampião, Maria Bonita e Corisco. […] Boa parte dos trabalhos de Mestre Vitalino se refere aos três principais ritos de passagem do ser humano: nascimento, casamento e morte. O tema do casamento aparece com frequência, em trabalhos como Casamento no Mato, O Noivo e a Noiva, e Noivos a Cavalo. Os enterros também são composições reveladoras dos hábitos e do cotidiano da região. Comparando-se as obras Enterro na Rede, Enterro no Carro de Boi e Enterro no Caixão, por exemplo, percebe a diferença de status dos mortos, de acordo com o modo como são transportados. Somam-se a esses trabalhos as diversas procissões criadas pelo artista; cenas do imaginário popular, como em A Luta do Homem com o Lobisome (sic), O Vaqueiro que Virou Cachorro e Diabo Atentando o Bêbado; e aspectos sociais da região, como a seca e a migração, reproduzidos em obras como Retirantes (1960). Outro tema frequentemente representado por Mestre Vitalino é o trabalho. Suas obras costumam expressar a divisão entre atividades laborais e tipos masculinos – vaqueiros e lavradores – e femininos – lavadeiras e rendeiras. O artista também modela profissões do contexto urbano, como dentista, médico, barbeiro e costureira, em parte para atender às demandas do mercado. Retrata, ainda, seu próprio trabalho, como em Vitalino Cavando Barro, Vitalino Queimando a Loiça e Vitalino e Manuel Carregando a Loiça, e produz ex-votos.” MESTRE Vitalino. In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileira. São Paulo: Itaú Cultural, 2023. #novosparanos #mestrevitalino #vitalino #vitalinopereiradossantos #artepopular #artepopularbrasileira #artebrasileira #artesanato #altodomoura #caruaru #pernambuco #brasil https://www.instagram.com/p/CnvB9Qdv5d-/?igshid=NGJjMDIxMWI=
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SEQÜÊNCIA 5 - A ILHA DO PESCADOR
Quarta parada: llha de Cabo Coral
Parte I
Alertada sobre a passagem do vendaval, a marina manteve um contingente de plantão a postos para emergências. O Albatrozes comunicou do rádio o risco iminente de naufrágio; mas, não pediu nenhum socorro urgente. Por um triz. Quando chegamos, contactamos nossas estadias, que providenciaram prontamente transporte. Mas, dada a carestia deles àquelas horas, isso levou algum tempo. Moídos, nos rendemos ao sono. Antes, porém, um banho quente relaxante distensionou meus músculos, exortando-os a enfiarem-se debaixo dos lençóis.
Cedo a lancha deixou Cabo Coral para a Praia do Maré. Chegou por volta das oito horas. Levou cerca de vinte minutos ... às cinco, nos buscaria. Ali, um Festival do Arrasta-Pé estava pra acontecer: o triângulo, a zabumba e a sanfona fariam a festa.
Refeito dum longo cochilo, pus meus inseparáveis óculos de sol e fui comer na barraca do Toim Zé: uma das mais tradicionais por causa de seu bolinho de peixe e traíra no moquém. A fome ainda não acordara os imprevidentes, que deixavam para lotar na última hora os quiosques e o restaurante. Eu, como sempre, fugia da muvuca.
Até o show ainda iam umas três horas. O suficiente pra depois de perambular por ali, caminhar até a próxima praia sem pressa. Levei apenas minha toalha e mochila menor. Ia me banhar em águas menos agitadas, e sentar numa das palhoças pra tomar notas no meu bloco... e, também, registrar nas lentes coloridas da Eos o humano, o cotidiano, o pitoresco, os costumes locais e a paisagem.
Um barracão que mais parecia um caixote de finas ripas remendadas por pregos - cheias de farpas -, vendia camarão, dos grandes. Especialidade da pequena praia. Havia pescadores ali mesmo, no mar, logo adiante, ainda no campo de visão do horizonte, puxando redes de arrasto, em pequenos barcos. Alguns destes - coloridos -, adormecidos no chão da areia branca, compunham uma bucólica paisagem da pesca comercial. Solitários, àquela hora, pousavam à vontade para belas fotos. A quilha de uma velha carcaça tombada encasquilhava o negro lodo esverdeado contra as conchas esquecidas dos outrora rastejantes caracóis, num amálgama, em meio a outros seres simbióticos e parasitas, que se fundiam na grossa crosta, exalando uma maresia mal-cheirosa.
Comi do camarão, num espeto de bambu, e aceitei uma porção de lambaris. Perto, sentado no toco de um tronco de árvore, um velho pescador tecia sua rede de pesca, alheio a qualquer curioso olhar. Perguntei se o que ele fazia era uma tradição ali. Ele me disse que só ele as fabricava manualmente. Algumas mulheres sabiam remendá-las, só. A maioria das redes era comprada nova, de material diferente do tradicional, porque assim dava menos trabalho. Tinha o problema de arrebentarem mais fácil, e de serem mais caras, mas o povo achava que valia a pena. Também disse que pra fazer a tarrafa tinha que vir com a linha de nylon - a mais resistente -, primeiro por baixo e depois voltar com ela por cima pra dar o nó. Tinha que fazer isso pra rede não embolar. E tinha a abertura certa da malha pra capturar um tipo ou outro de peixe, dependendo do tamanho e do peso. Era importante apertar bem os nós pra garantir que a rede agüentasse. Pra entalhar, enfiados na corda, iam o chumbo e a bóia, um por dentro e o outro por fora. O primeiro, convinha medir metade do tamanho da malha. O segundo, o pescador escolhia: podia ser mais afastado, vindo depois de três malhas; ou, podia ser mais perto, vindo depois de duas malhas. No primeiro caso, a rede ficava mais leve, e flutuava; no segundo caso, ficava mais pesada, e afundava. Pra quem tava aprendendo a fazer tarrafa era melhor começar com malha pequena, com linha abaixo de 10, própria pra pegar peixe menor. Até pegar o jeito. Aí, depois trançava malha maior, pra pegar os maiores. A malha tinha que estar retinha do início ao fim, senão dava problema. O jeito de lançar a tarrafa na água também era um pequeno segredo. Exigia prática e técnica. Ela tinha que ser jogada de um jeito que ficasse completamente aberta ainda no ar, e tinha que ter precisão pra acertar em cheio o diâmetro onde se encontravam os peixes. Então, era puxar e pegar.
Essa era a Praia do Côco! O nome vinha do côco abundante ali. O manuseio desse recurso vegetal criava um incipiente artesanato local, fabricado à base de sua principal matéria-prima, a fibra de côco natural. Pequenos artesãos eram vistos aqui e ali vendendo capachos externos e internos. Seus tapetes de interior eram submetidos a processos químicos para criar padronagens e cores. Era uma tapeçaria versátil com vários tamanhos e formatos. Muito elaborada, com desenhos geométricos, florais, animais e figurativos, bem cobiçada por turistas. Fabricavam também cordas, redes de dormir, chapéus de praia, colares, pulseiras, anéis, brincos e carteiras. Por ser sustentável, a fibra de côco se diferenciava ao agregar valor. Era resistente ao apodrecimento, duradoura, de considerável impermeabilidade e de fácil secagem, além de valorizada por não atrair insetos.
Esse artesanato criativo era visto também na casca do côco: utensílios de cozinha, jardinagem, peças decorativas como luminárias, móveis e adornos, e até miniaturas de barcos saíam das mãos dos virtuosos artesãos.
O despache disso tudo era via mar até o posto nacional de distribuição na Bahia, que facilitava a logística. Um catálogo digital cumpria a função de comercialização no país, e até no exterior. Uma Associação orquestrava todo esse trabalho comunitário a partir de uma sede nos arredores da mata de coqueiros.
Adquiri um colar trançado com um pingente, que usei na mesma hora. Quem me vendeu, foi um homem maduro, forte, barbudo, de chapéu de côco, peito cabeludo, e descalço, apoiando o mostruário numa das pernas rijas e torneadas. Orgulhoso, e rindo, estava sentado num sapé invertido, enrolando um cigarro de palha feito com fumo de corda, de forte cheiro, o qual ia esmigalhando à ponta de um afiado canivete. O rolo, trazia-o numa bolseta amarrada junto à cintura. À minha presença, interrompeu um dedo de prosa que vinha tendo com um mequetrefe, pinguço das redondezas. Sem mais o que fazer se divertia das garatujas que aquele dizia. O que assuntei do artesanato escutei de Nestor, esse homem: artesão, por opção, tinha aprendido o ofício a certa altura, depois de largar uma vida confortável na megalópole paulistana. Surpreso, o fiz saber que eu era de lá. As distâncias aí se estreitaram. Mas, não fui muito longe. Um ponto negro surgiu em mim quando mencionei o que vim fazer nessa viagem: "queria escrever um livro". Disse-lhe. Mas, não sabia qual era a história. Estava em busca de estórias de pescadores em que me inspirar. Mais do que isso eu não sabia: não sabia o que no fundo me levava à Ilha do Pescador, longe de tudo e de todos só para me descobrir em alguma coisa que eu ainda não conhecia. Mas, sentia. Nos familiarizamos nessas conversas. Ele acabou me contando que em Sampa vinha trabalhando num banco privado com carteiras de investimento, chegando a corretor financeiro da bolsa de valores. Tinha na época como hobbie o vôo a vela em planador, nos finais de semana. A cabine, lá em cima, silenciava seu stress. E o azul do céu, coberto de nuvens, em dias quentes de relativo vento formava as condições ideais para amainar o seu espírito e realizar o vôo. Em sua mente, restava apenas seguir os urubus em busca de correntes ascendentes para ganhar mais altitude, ou então seguir o deslocamento das nuvens. Só assim podia relaxar. "Mas, ainda assim, era preciso pilotar", dizia ... "manter o controle e o raciocínio durante todo o vôo com o uso dos três instrumentos básicos de navegação - o velocímetro, o medidor de altitude e o de correntes ascendentes - em busca de um tempo maior de vôo, que podia chegar em torno de três horas. Se o plano de vôo fosse mal conduzido o avião acabava por perder rapidamente altitude, e acontecia até de pousar em apenas dez minutos". Com o tempo ele ganhou experiência. Quase se tornou piloto de avião, mas não era sua vocação. Voar sem motor pra ele era mais emocionante. “A sutileza da navegação, feita com toques delicados no manete, o silêncio, o objetivo único de manter-se o máximo de tempo no ar, a autonomia, o encanto do design e a dimensão do planador” ...
... Nestor sorria ... me contava, e sorria ...
Quanto às outras vivências anteriores, chegou a fazer várias viagens ao exterior enquanto investiu na formação de turismólogo, e virou agente de viagens, indo à Tunísia, Grécia, Marrocos, Tailândia, Nova Zelândia, Emirados Árabes, Turquia. Gostava de lugares exóticos, com roteiros peculiares, que exploravam a gastronomia e o esporte radical de aventuras e de ação. Sabia saltar de pára-quedas, e sempre que possível encarava um novo desafio. Assim, participou de um mini safári de jeep no deserto do Saara, fez uma excursão a uma aldeia de arquitetura antiga berbere com suas casas trogloditas, convivendo com seu modo de vida adaptado ao moderno sem deixar de lado a tradição, andou de bicicleta de quadriciclo na praia, se deslumbrou com uma terma árabe, fez um retiro numa montanha da Grécia, degustando azeite e vinhos, praticou rafting na Tailândja, e snowboard numa estação de esqui da Nova Zelândia, desfrutou de um safári de buggy com um luxuoso jantar de churrasco nas dunas vermelhas do deserto de Dubai, embarcou num canyoning entre cachoeiras e lagoas, praticando trekking na Turquia. Comeu o Pide, que é a “pizza turca”, o Dolma e o Casserole de pernil de cordeiro, seu favorito. Há anos vive retirado na ilha, onde encontrou o contraponto para seu espírito irrequieto em meio ao artesanato e o convívio com os pescadores.
De bobo esse homem não tinha nada. Pensei comigo. Ou era um mentiroso!
***
Desde que eu retornara pra Praia do Maré do passeio e um breve mergulho na Praia do Côco, fotografei cada traço de identidade que encontrei. Por fim, restava só aproveitar o rebuliço do forró arretado, ao sabor de uma cerva bem gelada. Já não era sem tempo. Agora livre das restrições alcóolicas nos translados, bebi o suficiente para anestesiar a inibição, e sentir certa euforia a ponto de me enturmar com a gente ao meu redor, ensaiando pequenos passos da dança. Ora o baião, ora o xote, ora o xaxado, faziam suas evoluções na dança dos casais. Mas, para os iniciantes o básico era um só: dois pra lá, dois pra cá.
Entre idas e vindas, o guarda-sol e a esteira que eu alugara na Tenda dos Milagres, ficaram à minha espera, no mesmo lugar, pra minha sorte e risco. Ao fim do dia, sentei-me por um tempo antes de partir e, em seguida, calcei os chinelos, pondo minha bermuda azul e a regata branca, indo até a tenda devolver os apetrechos. Depois das cinco e meia, à luz dos últimos clarões reluzentes, alcancei a soleira da porta da hospedaria, em Cabo Coral.
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