Festival Cuca Monga 2023: Alvalade chamou por por eles e eles retribuíram
Uma celebração da música portuguesa e da amizade, feita por músicos experientes que sabem o que é preciso para montar um bom espetáculo
Uma celebração da música portuguesa e da amizade, feita por músicos experientes que sabem o que é preciso para montar um bom espetáculo.
A Cuca Monga é mais do que uma editora. É um coletivo artístico, é uma promotora de eventos, é um grupo de amigos, como explicou ao Altamont Domingos Coimbra, dos Capitão Fausto. É, sobretudo, um conjunto de pessoas com uma enorme dedicação a todos os projetos…
Samuel Úria encerra Banhos Velhos em 2022 | Reportagem
Samuel Úria e Silas Ferreira, a dupla da noite // Foto oficial de Ricardo Martins da Lab onze @Laboratorioonze
A programação cultural dos Banhos Velhos respeitante à temporada 2022 encerrou na passada noite de sábado, 17 de setembro, com Samuel Úria. Durante este presente ano no programa constaram diversas atividades diferenciadas como cinema e tertúlias. Como habitualmente houve também lugar, como em anos anteriores, a vários concertos. Entre julho e setembro aturaram: os Paraguaii e os Postcards da Líbia (15 de Julho), Bruno Pernadas com a sua banda (12 de agosto), Manel Cruz (11 de setembro) repetiu presença conforme tinha prometido o ano passado e Samuel Úria (17 de setembro).
Marcaram presença nas Caldas das Taipas com uma generosa adesão de público. Mais uma vez a organização esteve a cargo da Taipas Termal e contou com o apoio do Município de Guimarães. Pelo feedback que fui tendo de várias pessoas e baseando-me igualmente aos concertos em que marquei presença posso afirmar que o evento foi muito bem-sucedido no qual não faltou o dedo programático de José Manuel Gomes.
Samuel Úria repetiu presença na vila das Caldas das Taipas, concelho de Guimarães, depois de ter tocado em 2017 em versão duo com Miguel Ferreira (membro dos Clã). Desta vez, apresentou-se igualmente em duo, porém com o teclista Silas Ferreira.
Samuel Úria em palco // // Foto oficial de Ricardo Martins da Lab onze @Laboratorioonze
Esteve uma plateia bem preenchida, muita gente aderiu ao Polidesportivo, com particular ênfase nos minutos antecedentes ao arranque. Luzes apagadas pelas 22:12h e logo de seguida Samuel Úria surgiu em palco. Ele que fez logo questão de frisar a sua visita anterior para revelar que o público de então foi um dos seus melhores de sempre. De certo modo a impor logo alguma “pressão” aos presentes… Úria esteve sempre muito comunicativo e o seu companheiro de palco foi uma espécie de wingman.
Num arranque a solo , “Ao Tom Dela” e “Fica Aquém” foram as duas primeiras. Úria notou logo de início numa camisola do Tondela (a fazer recordar as origens do músico e a sua preferência clubística) envergada por um senhor na parte frontal. Ficou visivelmente satisfeito por tal. A partir de “Mãos”, o terceiro tema, o duo juntou-se e assim prosseguiu até final. A intensidade do concerto mudou a partir de “Carga de Ombro” (6º tema) e seguiu sempre em crescendo.
Durante a performance houve lugar para duas versões: “Mulher, eu sei” do brasileiro Chico César e “Video-Maria” dos GNR. Ambas interpretadas com um tom e uma batida muito próprias. Efetivamente momentos estupendos.
O público colaborou sempre que os músicos o solicitaram e até houve lugar para um elogio "Caldas das Taipas tem muito ritmo" disse Silas Ferreira após uma bela coordenação de palmas. Muitos fãs estiveram presentes, deu para notar, pela forma como cantavam as letras de forma embevecida.
Visão dos músicos a partir do meio do público // Foto oficial de Ricardo Martins da Lab onze @Laboratorioonze
“A Contenção” não faltou no repertório, nem podia. “Não Arrastes o Meu Caixão”, “O Muro”, “Fusão” e “Teimoso” foram outras interpretadas.
Já na introdução de “Lenço Enxuto” brincou dizendo ser uma canção inspirada por um “cafajeste cujo nome não se podia dizer e que tinha estado ali semanas antes” referia-se a Manel Cruz pois claro. A canção faz parte do álbum ‘O Grande Medo do Pequeno Mundo’ de 2013 e Cruz participou vocalmente na versão de disco.
No regresso ao palco para o encore brincou com a situação de não ter conseguido esconder-se, devido à sua estatura e ao facto das laterais do palco serem totalmente abertas. Para final em beleza foram tocadas “Para Ninguém” e “É Preciso Que Eu Diminua”, foram bem merecidas as palmas finais por volta das 23:35 horas.
A atuação superou as minhas expetativas, Samuel Úria é um dos melhores cantautores e letristas atualmente em atividade em Portugal. Isso ficou devidamente comprovado nessa bonita noite de sábado passado.
Público sempre muito atento // // Foto oficial de Ricardo Martins da Lab onze @Laboratorioonze
Texto: Edgar Silva
Fotografia: Ricardo Martins da Lab onze @Laboratorioonze
E já se passaram 10 anos. Estivemos com Samuel Úria e o "Grande Medo do Pequeno Mundo" no Tivoli BBVA em Lisboa.
O “Grande Medo do Pequeno Mundo” será talvez o mais emblemático trabalho de Samuel Úria, que de Tondela para o Mundo, nos trouxe há cerca de 10 anos as mais belas palavras neste album cantado por quem já foi designado de a nossa “Voz”.
Com duas datas marcadas e antecipadamente oficialmente esgotadas (Lisboa e Porto), tivemos a oportunidade de testemunhar na passada 5ªfeira no Teatro Tivoli BBVA…
22/02/23
MUSICBOX
LUCAS BICUDO
MINERVA
HORÁRIO: 00:00
Lucas Bicudo é curador musical, colecionador de discos, e fundador do 1/4 club, sem meias medidas para uma noite completa cheia de ritmos infundidos de groove, entre os clássicos brasileiros até aos mais frenéticos ritmos house. Minerva tem a sua base em Copenhaga mas voa por toda a europa com o combustível do funk a acender a engrenagem.
Y.azz anuncia-se ao mundo com o seu pop-romântico, movido pela modernidade e surpresa, com ponto assente na sua poderosa voz e figura de cortar a respiração. Vasco Completo fará a primeira parte, com as suas batidas a aquecerem a noite para chegarmos um passo mais perto do futuro.
AMOR SATYR + CHUNGADADDY
HORÁRIO: 00:00
A imprevisibilidade dentro da certeza, é essa a promessa de Amor Satyr. Podemos não saber se vamos estar entre o techno, o jungle, o dembow ou o baile funk mas sabemos que vamos estar no sítio certo para ouvir da melhor maneira.
A cena francesa chega sem meias-medidas e estará muito bem acompanhada pela força local de Chungadaddy, que regressa à nossa cabine depois de ter disseminado o seu encanto por pistas no estrangeiro.
24/02/23
COLLECT
MARTINO BOGA
LADY G. BROW
24/02/23
INCÓGNITO
RUI MAIA
24/02/23
LOUNGE
DJ AAGUILAA
24/02/23
MUSICBOX
B FACHADA (ESGOTADO)
HORÁRIO: 22:00
Escreve canções que dão mostras de ser recebidas como ciência social, mas o inverso também é verdadeiro. Tem muitos descendentes, mas é mais que a soma dos por si influenciados. Na música popular portuguesa do século XXI não há outra figura como B Fachada, o nome artístico de Bernardo Fachada, compositor, multi-instrumentista, produtor. Nascido em 1984, estudou música no Instituto Gregoriano de Lisboa e aprendeu piano. Mais tarde, frequentou a escola do Hot Clube de Portugal e, na Universidade, cursou Estudos Portugueses. Desde 2007 tem-se notabilizado por um espantoso, e até certo ponto impiedoso, ritmo de edições, através do qual frequentemente subverte o cânone e converte os dogmáticos, baralha as expetativas e expetora a maralha, coça rótulos, caça ruturas. Entre formatos físico e digital, lançou cinco EP (destacando-se o remoto “Viola Braguesa”, uma reflexão sobre o conceito da tradição e suas traições, ou o split com as Pega Monstro, de 2015, em reflexo da amizade e acuidade estética), três mini álbuns charneira (“Há Festa na Moradia”, que teve edição física em vinil, “Deus, Pátria e Família”, que aparentou parar o país, e “O Fim”, com que anunciou uma pausa sabática) e sete registos de longa-duração (da discussão das questões de moral associadas ao universo infanto-juvenil de “B Fachada é Pra Meninos” ao manifesto de pop batumada que foi “Criôlo” passando pelo homónimo de 2014, criado com recurso a samples burilados, programações barrocas, batidas apátridas, chegando à obra-prima “Rapazes e Raposas” lançada sem aviso prévio neste ano biruta de 2020). O seu impacto conjunto testa os limites daquilo que, neste domínio, se entende por produção cultural.
Entre 2009 e 2012, fez também parte da banda Diabo na Cruz, com a qual percorreu o país de lés a lés. Ainda em início de carreira, o realizador Tiago Pereira dedicou-lhe o documentário “Tradição Oral Contemporânea”. Com Minta e João Correia lançou uma versão integral do álbum “Os Sobreviventes”, de Sérgio Godinho, com quem já atuou ao vivo. Dividiu igualmente palcos com Dead Combo, Lula Pena, Manel Cruz, Manuela Azevedo, Márcia, Norberto Lobo, Nuno Prata ou Samuel Úria. Fez primeiras partes para Kurt Vile e Vashti Bunyan. Tocou ocasionalmente fora de portas, em Berlim, Barcelona ou Praga, mas nunca foi ao Brasil, onde possui uma dedicada legião de fãs. Apresentou-se nas mais emblemáticas salas de espetáculo portuguesas, mas muitos recordam com mais carinho as atuações divulgadas em cima da hora, em inesperados espaços que continuamente esgotam. E além de se ler tudo o que sobre a sua carreira foi escrito – num dossiê de imprensa sem paralelo entre os seus pares – ou de se testemunhar o ato de comunhão em que se transformaram os seus concertos, basta seguir as sedes virtuais em que opera para se compreender tratar-se de um autor tão ouvido quanto vivido. Talvez por isso se diga que a sua obra é indistinguível de quem a consome. Ou que biografia e alegoria são inseparáveis na sua contundente escrita. Mas, se perto de uma década de atividade artística profissional independente sugere alguma coisa é a de que, como poucos, Fachada está interessado em questionar convenções no seu próprio tom, no seu próprio tempo, nos seus próprios termos.
NOITE PRINCIPE
HORÁRIO: 00:00
Não sabemos quem vai tocar, sabemos que vai toda a gente. As noites são emblemáticas e as expectativas são sempre cumpridas.
24/02/23
LUX FRÁGIL
BEYOND SUPERB: DISCO "SUMO" DE SAM THE KID COM:
MÃO DOBRA LIVE
CLASSE CRUA LIVE
VLUDO LIVE
BAR: TWOFOLD
OGAZÓN
DIANA OLVEIRA
NÚRIA
DJ NEL ASSASSIN
DJ MADDRUGA
DJ KRONIC
24/02/23
KREMLIN - LOST FREQUENCY
TAO ANDRA
HANDERSON
HOSTED BY ROD B
25/02/23
MUSIC SPEAKS - LISBOA RIO
PER HAMMAR
ANDY PHILL B2B JORCA
GEAR/M:RTA/TRUKE
Stckman já tem as costas aquecidas pelo seu passado. Debaixo do veludo das suas músicas com elevada rotação no Soundcloud pintam-se as linhas fluídas desta noite, em que Guigas será também ele leme de tudo o que importa: movimento, momentos memoráveis e muita surpresa.
25/02/23
LOUNGE
NO IDOLS: CVLT
25/02/23
INCÓGNITO
MR. MITSUHIRATO
25/02/23
LUX FRÁGIL - EXTENDED MIX
DISCO: YEN SUNG & NVNO
ÂME DJ SET
RUI VARGAS & DEXTER
ORBE
BAR: TELMA + SEMEDO
BIBI SECK
SLIGHT DELAY
DANNY KRIVIT
DJ CARING & VARELA
26/02/23
MUSICBOX
CIRCA PAPI
HORÁRIO: 00:00
Circa Papi, o pseudónimo de Ronald Bravo Rómulo, “Mestre de Cerimónias” de raízes propriamente viradas ao old & new school Hip Hop & Rap, R&B soul, nunca esquecendo Afro Beat/Swing Amapiano, Baile, Grime, UK Funky House transita entre estes e mais outros géneros musicais sempre de forma cool, groovy e geralmente eclética, providenciando boas vibes para a plateia.
Participa Ciudad Juárez en Circuito del "Festival Internacional Cervantino 2022"*****Este jueves 27 de octubre a las 20:00 horas, se presenta la cantante portuguesa Selma Uamusse en el Teatro Víctor Hugo Rascón Banda; entrada libre
La Secretaría de Cultura invita al concierto de la cantante portuguesa Selma Uamusse, que se realiza de manera gratuita este jueves 27 de octubre a las 20:00 horas, en el Teatro Víctor Hugo Rascón Banda de Ciudad Juárez, como parte de las actividades del Festival Internacional Cervantino 2022.
La artista, originaria de la ciudad de Mozambique en Portugal, estudió en el Hot Clube de Portugal y ha participado en proyectos Souldivers, Selma Uamusse Nu Jazz Ensemble y Tributo a Nina Simone, donde colaboró con múltiples artistas y agrupaciones.
Su álbum debut Mati, que significa "agua" en changana (una de las tres lenguas más habladas en Mozambique), publicado en 2018, fue ampliamente elogiado por la crítica nacional.
En el 2020 lanzó su segundo álbum Linwoningo, donde acentuó la herencia africana intangible de Mozambique que sigue inspirando letras y melodías, pero que se mezcla por todo el mundo. Ha participado en grabaciones discográficas y espectáculos de varios artistas como Samuel Úria, Medeiros, Joana Barra Vaz, entre otros. El año pasado también prestó su talento para proyectos de teatro, cine y artes visuales.
El Festival Internacional Cervantino (FIC), popularmente conocido como “El Cervantino” es un festival que se realiza desde 1972 en la ciudad de Guanajuato, en la región del Bajío mexicano, además es miembro de la Asociación Europea de Festivales y de la Asociación Asiática de Festivales Teatrales.
Para esta quincuagésima edición, el FIC, llevará 68 espectáculos con la estrategia “Circuito Cervantino” a diversos estados de México. La cartelera de todas las actividades que integran la programación del FIC 2022, está disponible en la página oficial www.festivalcervantino.gob.mx
"Conta-me Uma Canção" de volta ao palco do Maria Matos
É já na próxima semana que "Conta-me Uma Canção" está de volta ao palco do Teatro Maria Matos com uma série de quatro concertos que juntam alguns dos nomes mais relevantes da música portuguesa.
É já na próxima semana que “Conta-me Uma Canção” está de volta ao palco do Teatro Maria Matos com uma série de quatro concertos que juntam alguns dos nomes mais relevantes da música portuguesa.
No próximo dia 10 de Janeiro “Conta-me Uma Canção” tem a sua segunda edição ao vivo. Tendo começado por um ser projecto em formato audiovisual, disponível no Youtube, teve em 2023 a sua primeira incursão…
Margarida Campelo tem 35 anos e já uma longa vida profissional no cenário musical português. Ela já integrou vários projetos, o mais proeminente foi na banda de Bruno Pernadas, já tocou também com outros projetos bem conhecidos como: Cassete Pirata, Real Combo Lisbonense, Joana Espadinha, Julie & the Carjackers e Minta & the Brook Trout. Portanto experiência é coisa que tem num volume bastante volumoso, já com cerca de 15 anos de carreira. Por isso não é mesmo nada de estranhar que ela tenha arriscado em editar as suas próprias canções, em boa hora o fez. Margarida Campelo é cantora, compositora e multi-instrumentista.
Esta inspiração musical manifesta-se num som com características óbvias de puro pop. O tom diferenciador surge quando à “panela de condimentos” são-lhe adicionados a dance music, o R&B e uns fortes rebites de jazz experimental.
A sala principal do gnration registou uma audiência em número razoável, nesta estreia a solo, a artista lisboeta merecia uma casa bem mais composta. Esgotada mesmo. O público era composto maioritariamente por pessoas em faixas etárias acima dos 30 anos. Um dado curioso, sem dúvida.
Com alguns momentos de improvisação, as primeiras quatro faixas tocadas seguiram o alinhamento do disco: “Maegaki”, “Physali Fit I”, “Physali Fit II” e “Deusa”. Foram o aquecimento ideal, quer para a banda como para o público.
Margarida esteve sempre com alto-astral, sorridente, bem-disposta e comunicativa. Partilhou sobre o processo de ‘Supermarket Joy’, revelou que tinha canções guardadas no computador há já vários anos e que inicialmente o disco estava pensado para ser totalmente em inglês. Com os temas feitos, faltavam as letras. À última hora fez-se luz e eis que surgiram letras irreverentes e muito catchy escritas em português com a significativa e criativa ajuda das suas amigas, referidas já neste texto.
A balada em inglês “Love Will Never Be Enough“ não ficou de fora por ser demasiada bonita quebrando com a regra das letras em português foi interpretada assim como ‘Love Ballad’. Esta última uma versão dos norte-americanos L.T.D. datada originalmente de 1976.
Na entrada para “Aura de Panda” o aquecimento aconteceu entre a Margarida e as pessoas presentes, o público fez um bonito coro num mini ensaio antes de a banda tocar a música. Este foi um dos momentos áureos da atuação, performance esta muito bonita e desfrutada com a devida reverência por todos.
A outra revelação foi o esquecimento da letra na interpretação de um medley, numa atuação no Festival da Canção em 2017. A gravidade da situação ficou gravada para a posterioridade pois aconteceu em pleno direto televisivo. Foram histórias como esta que geraram gargalhadas e um nível híper elevado de alto-astral por entre todas as pessoas que decidiram marcar presença nesta sexta-feira friorenta e chuvosa. Em abono da verdade, não se pode considerar um esforço a escolha desta sexta-feira, valeu totalmente o preço do bilhete.
Esta minha incursão ao centro de Braga revelou-se plenamente certeira. Foi um enorme gosto ouvir estas canções de ‘Supermarket Joy’. Trata-se de um dos melhores álbuns de 2023 e a audição na sua versão ao vivo só reforçou essa ideia.
Quando o Ricardo Costa sugeriu que os “articulistas do Observador (…) vivem num mundo de aliens”, não contribuindo para o feliz facto de “Portugal ser um país moderado”, senti-me parte de um projecto colectivo com o qual me identifico totalmente.
B de Brasil
Não há volta a dar: Portugal é cada vez mais Brasil. Visitei o Brasil apenas pela segunda vez (desta vez com a Rute) mas cada viagem lá é sentida por mim como um dever. O Brasil também visitou a Família Cavaco de um jeito especial na estadia da nossa amiga Mariana Nogueira cá em casa (que, entre tantos belos passeios de Verão, nos levou à Casa Fernando Pessoa que não visitávamos há uma eternidade). Quanto mais razão reconheço no Pessoa ao dizer que a nossa pátria é a língua portuguesa, mais o Brasil se torna também o meu país—um país novo. Um pequeno exemplo: esta coluna no Observador já me rendeu um contracto do outro lado do mar.
C de Concertos
1. O Manuel Fúria no Centro Cultural de Belém (o Manel gravou um disco chamado “Perdedores”, com o qual estive envolvido desde a audição das primeiras maquetes há dois anos, onde se dedica à perda—uma perda que não é só pose mas também uma vocação cristã).
2. O Miguel Arsénio nas Línguas de Fogo na Escola do Largo no Chiado (o Miguel não é bem cantor nem é bem stand up comedian mas o que faz com piadas tortas, semi-karaokes e confissões destravadas comove-me).
3. O Rui Pregal da Cunha com os Lacraus na Consoada da FlorCaveira no Tokyo Bar, mostrando que o estalo dos Heróis do Mar continua retumbante (baza fazer uma banda, Rui?).
D de Discos
“Os Perdedores” do Manel
“40 oz. To Fresno” dos Joyce Manor
“Éme e Moxila” do Éme e da Moxila
“Jacking For Beats” do N8NOFACE (de 2020)
“Glow On” dos Turnstile (de 2021)
E de Enterros
Em 2022 voltei e fazer enterros. Os primeiros anos do meu ministério pastoral deram-me alguma experiência com funerais e depois, à medida que a Igreja crescia, praticamente desapareceram da minha rotina. Voltaram em 2022. Custou-me especialmente a despedida da nossa Irmã Manuela Correia, com 90 anos. Ela deixou uma nota de despedida à família com indicações práticas, onde estava escrita uma das coisas mais bonitas que já disseram sobre mim: “Contactem [o] Pr. Tiago Cavaco da Ig. Baptista da Lapa onde sou membro. O contacto é 915 XXX XXX. É melhor mandar mensagem se ele não atender logo.” Fui e sou o Pastor da Igreja onde a Irmã Manuela foi membro e, mesmo lento a atender telefonemas, pertenci ao cuidado dela até que Deus a chamasse—a Igreja é a maior invenção do mundo!
F de FlorCaveira
A editora que comecei em 1999 com amigos (o mais conhecido é o Samuel Úria) dispôs-se a trabalhar mais e melhor, agora que ultrapassou 20 anos—ser adulta, enfim. No início do ano experimentámos um pequeno festival evangélico, depois tivemos residência artística na Escola do Largo do Chiado, organizámos outros concertos, lançámos discos, criámos roupa e somos provavelmente a única empresa independente que está no processo de compreender como o negócio da música realmente funciona em Portugal (açambarcadores, tremei!). Fechámos tudo com uma bela Consoada no Tokyo Bar onde o Rui Pregal da Cunha dos Heróis do Mar nos lembrou que “a glória do mundo está no mistério do Senhor” (nada disto teria acontecido sem o nosso miúdo-milagre, o Manuel Ferreira).
G de Gratidão
Se tiver de escolher apenas um motivo que em 2022 arrebita a minha gratidão falaria do meu casamento que fez vinte anos. É ainda melhor estar hoje casado com a Ana Rute do que era em 2002.
H de Homens
Além dos dois homens que me acompanham no pastoreio da Igreja da Lapa, o Filipe Sousa e o Mark Bustrum, tive em 2022 a companhia de outros homens que se aproximaram pedindo mais da palavra pregada. À falta de melhor termo, chamamos mentoria a esse tempo em que investimos espiritualmente uns nos outros. O Newton, o João, o Rodolfo, o Manuel e o Pedro trouxeram um belo recheio aos dias de 2022.
I de Igreja
Amo a Igreja local de que faço parte, a Igreja da Lapa (o nome completo é Segunda Igreja Evangélica Baptista de Lisboa). Pela graça de Deus, este foi um ano de crescimento. Não é nada de explosivo mas é incrível tendo em conta os últimos tempos de encanfuamentos em casa. Em 2023 queremos abrir uma Igreja nova e ajudar antigas. A amizade que recebemos de outra Igreja, a CCLX, pastoreada pelo Pastor Nuno Ornelas, foi especial.
J de Jesus
A letra mais importante de todas na língua portuguesa. Tudo se resume a Jesus.
K de Kierkegaard
A minha obsessão por Kierkegaard é antiga e já inventei o título do livro que quero escrever para honrá-la. “Kierkegaard Para Bateristas” servirá para explicar porque é que o filósofo dinamarquês deve ter impacto na vida de qualquer pessoa do Século XXI que queira viver mais perto de Deus.
L de Livros
Estes são livros que abençoaram o meu 2022 (a maior parte não é edição deste ano).
“Cinema Speculation” do Quentin Tarantino
“Pardais” da Adília Lopes
“Escuta, formosa Márcia” de Marcello Quintantilha
“Moby Dick” do Melville (finalmente li-o!)
“The Critic As Artist” do Oscar Wilde (a edição é de 2019)
“The Rise and Triumph of the Modern Self” do Carl Trueman (é de 2020)
“Naturalmente Hipócrita” do Nuno Ferro (é de 2014)
“Poesia Reunida” da Adélia Prado (é de 2015)
“Rapt” de Winifred Gallagher (é de 2010)
“Sabrina” de Nick Drnaso (é de 2018)
M de Misticismo Invertido
Aos 45 anos estou ainda mais certo de que o meu cristianismo é anti-místico. O que pode parecer para tantos uma contradição é apenas um amadurecimento da ideia de que a visão maior que é dada ao cristão não é a de Deus mas a das trevas. É o paganismo que vê e pinta o divino com as cores mais luminosas e garridas. Para o cristão tudo funciona no paradoxo de ser no escuro que realmente se olha. O nosso negócio primeiro não é publicitar iluminações mas apagá-las num mundo sôfrego de epifanias precoces.
N de Ninho
Com a entrada da nossa filha mais velha para a Universidade (ver a letra U), o ninho familiar pode ser observado de outra perspectiva. Os nossos pequenos, a Maria, a Marta, o Joaquim e o Caleb, já não são crianças (o Caleb, chegando aos 12, alcançou a idade judaica da responsabilidade moral). Uma das vantagens deste tempo é que vamos conversando com os nossos filhos como os companheiros que eles também nos são: a Maria falando-me das aulas de História Medieval, a Marta feita diva de estilo, o Joaquim a testar a sua esperteza com humor corrosivo, o Caleb tornado meu baterista em ensaios excitantes. Fizemos bebés e, de repente, tornam-se amigos nossos.
O de Oceano
Em 2022 contei 126 que mergulhei no mar. Dá uma média de uma ida ao oceano em cada 2,8 dias.
P de Passe
Metade da pouca paz de espírito que tenho é feita de andar a pé. Se juntarmos a esse hábito e prazer o facto da Família Cavaco usufruir do passe metropolitano, melhor ainda. A cidade abre-se não como um espaço em que se transita mas como um espaço que nos pertence. Deambular por Lisboa com passe é poder reagir à cidade à medida que ela nos impressiona. A pessoa não percorre necessariamente percursos do ponto A ao ponto B (como o carro tende a fazer), mas a pessoa escolhe o comboio, o eléctrico ou o autocarro (a opção de que menos gosto, por se manter na mesma lógica do automóvel) como quem segura a mão que a cidade nos estende.
Q de Quinze
Fez 15 anos que me envolvi na abertura de uma nova Igreja. O que começou em São Domingos de Benfica em 2007 continua hoje na Lapa de 2022. A lógica da familiaridade dos pequenos inícios não é a do desenvolvimento num lugar maior e numa comunidade mais complexa. Não sendo melhor nem pior, é diferente.
R de Redes sociais
Apesar de ter passado menos tempo no Instagram, ainda me sinto demasiado influenciado pela overdose de socialização virtual (sobretudo o Twitter). O Diabo adora este uso masoquista que fazemos da internet porque, na aparência de estarmos ligados, o outro é-nos cada vez mais intolerável.
S de Seminário
Depois de uma década de sonho e planeamento, a abertura de uma nova Escola Teológica em Portugal concretizou-se! O homem do leme é o meu cunhado Tiago Oliveira, Pastor da Primeira Igreja Baptista de Lisboa (ao seu lado estão o Joel Bueche Lopes e o Diego Lopes). O primeiro semestre do Seminário Martin Bucer Portugal iniciou em Setembro e tive oportunidade de ensinar a cadeira de “Cristianismo e Cultura”. Ainda lamento o modo como uma matéria destas é estranhada no ambiente evangélico (como se fosse possível ser cristão sem considerar que, enquanto criaturas, somos resultado do cultivo de Deus—tudo é culto e cultura) mas, a pouco e pouco, o protestantismo português faz pela sua emancipação.
T de Trabalho
Uma das coisas boas de ter 45 anos é que a relação com o trabalho muda. Sinto que preciso de fazer menos para fazer melhor. Explico: sobretudo os trintas tinham um nervo em que trabalhava sem me cansar, quando comparado com os quarentas. Claro que chegou em dia em que me vi cansado por todos os anos em que aparentemente não me cansava. A pessoa adapta-se e aceita os novos limites. Hoje não consigo fazer o que fazia aos trinta mas dedico-me mais vagarosamente e com mais prazer.
U de Universidade
A nossa filha mais velha entrou para a Universidade, provavelmente o facto que mais introduzi à força nas conversas que com qualquer ser humano fui tendo desde Setembro. Leram bem? A nossa filha mais velha entrou para a Universidade.
V de Ver filmes
Uma mão cheia de filmes marcantes em 2022, mesmo tendo em conta que alguns são antigos e eventualmente já tinham sido vistos antes:
“The Fabelmans” do Steven Spielberg
“This Much I Know To Be True” de Andrew Dominik
“O Sétimo Selo” do Ingmar Bergman
“Young Mr. Lincoln” do John Ford
“Fátima” do João Canijo
W de WhatsApp
Viva o WhatsApp! Abaixo o WhatsApp! Nesta relação complicada que temos com o facto de podermos comunicar a toda hora, consolida-se uma certeza pessoal: não há-de ser a tecnologia a determinar a minha resposta. Na nossa essência, não somos o que conseguimos fazer, usando os recursos técnicos disponíveis; somos também o limite que conscientemente impomos a esses recursos. Na era dos WhatsApps sou também o tempo que demoro a responder ou até quem não responde de todo. Além da tecnologia, decido existir.
X de Xadrez
O xadrez é o padrão da música ska. Preto e branco na cor, pretos e brancos na plateia. É fácil tomar o ska como uma música quadrada ou desinteressante pelo facto dos guitarristas tocarem o contratempo de um modo básico. Tenho uma regra pessoal: quem goza com o ska para mim está fora.
Y de Young, Restless and Reformed
Há mais de uma década chamava-se Young, Restless and Reformed ao movimento de evangélicos que se metia pelo Calvinismo a dentro. A moda passou, felizmente, e quem ficou no Calvinismo sentiu-se na necessidade de ir além desse rótulo de jovem, irrequieto e reformado. Num extremo, uns tornaram-se mais calvinistas no sentido de mais rabugentos e quezilentos. Noutro extremo, os que não queriam perder a juventude abjuraram do Calvinismo de todo. Gosto de me imaginar no centro: envelhecendo mas sem esquecer que o que me levou ao Calvinismo não foi a capacidade de manter todos debaixo das regras mas de quebrá-las.
Z de Zeros
Esta fica como trabalho de casa para os leitores: quais foram algumas coisas distintamente negativas de 2022?