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luvdeathrobots · 4 months
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POV: Yoruwahonoka (Sussurros de Uma Noite).
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   Em breve.
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luvdeathrobots · 5 months
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POV: Raison D'Etre (Parte 2)
*t.w.: possível teor melancólico, seringas, alucinações. clique aqui para ler a versão no google docs.
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   SE HAVIA ALGO que há muito tempo passava pela mente de Ren Yamamoto e pouco o incomodava, essas coisas poderiam ser consideradas suas memórias; memórias não do dia em que perdeu seu pai e tampouco de quando uma lâmina o tatuou o peito, mas sim memórias verdes, como ele mesmo denominava, e que em seu rosto preenchia um sorriso de nostalgia. Eram esverdeadas como o fluorescente de seus pijamas, da tinta de seu velho cabelo ou das plantas de seu quintal quando tinha 10 anos. 
— Yi-sensei — E é claro, eram verdes como os antigos olhos de Mestre Yi. — Qual a arma mais forte do mundo?
   Naquele tempo, Yi e Ren costumavam descansar no jardim de casa. Sentavam-se no banco de madeira frente a cachoeira de carpas, deixavam suas espadas bem guardadas às pedras e então discutiam sobre toda e qualquer dúvida infantil que a criança Yamamoto pudesse ter. 
—  Que pensa que é, meu pequeno espadachim?
— Minha espada! — Ren era sempre certeiro em suas escolhas, até mesmo fadado ao orgulho. Yi sempre ria daquilo. — Wano com toda certeza é a arma mais forte do muuuundo todo! 
— Mais forte que metralhadoras, canhões imperiais e até mesmo as criações? — E claro, seu professor sempre o ensinava a ir além do que sua cabeça mandava. Não adiantava muito. 
— Mais forte que metralhadoras, “caminhões” imperiais e até mesmo as criações! 
— Mais perigoso que tudo isso, marimo, é o conhecimento. — Suave como era a voz de Yi, pelo menos nas lembranças do artífice, era o toque em seu nariz. Tédio, entretanto, era a cara da criança sempre que suas expectativas eram quebradas em aprendizados. — Até mesmo monstros e deuses podem ser esquecidos se não há a quem lembrá-los, meu gafanhoto. Conhecimento é  legado, e um dia você deixará o seu. […]
   E agora, aos 24 anos, memórias verdemar como aquelas levavam Ren Yamamoto a retirar a espada Enma de sua bainha, bater na porta mais estranha do Mercado das Maravilhas e suspirar em alívio ao ver a figura de seu velho professor. Quando falamos do presente, da realidade, não nos referimos ao verde natural e tampouco de filosofias; talvez aquele homem ainda estivesse conhecendo o amarelo, ou quem sabe aos poucos voltava para o melancólico azul em sua vida. Não importava. Quer que cor fosse refletida em sua alma, nenhuma se comparava ao vermelho incessante da lâmina de Enma espelhada aos olhos de Yi, o então crescido Yamamoto e a casa.
   Outra vez, o artífice havia fugido das horas limite de seu castelo para visitar seu velho amigo sangrador, cujos olhos não mais refletiam mais o verde. 
   Yi não estava tão chateado com o atraso de sua visita, mesmo que por todo o percurso até o centro da casa reclamasse do quão precisos eram dez a vinte minutos. E assim como Ren pensava que o tempo deixava as pessoas mais rabugentas, talvez as transformassem em melhores ouvintes; como quem sabe era o caso do próprio gafanhoto, que tomava tempo para escutar melhor seu eterno professor ao invés de constantemente refutá-lo em suas ideias e reclamações.
   Depois de muito ouvir e absorver um monólogo sobre o tempo, o espadachim pôde enfim se sentar ao sofá. O sorriso infantil de eterna crianças às vezes invadia seu rosto, quase como acontecia quando de repente ele pediu:
— Me conte uma história. 
   Não foi negado, apenas enrolado. Yi ainda tinha um trabalho naquela noite — afinal, para que Ren pudesse domar Enma, ajustes em seu corpo eram necessários. 
— Que gostaria de ouvir? — Indagava o senhor.
   Naquele momento em específico, as prateleiras unicamente eram exploradas atrás de seringas; diferentemente da primeira noite de visitas, suturas não eram mais necessárias.
— Quero ouvir sobre Frostalia — Pediu Ren. — E sobre as peças de fim de ano.
   O sangrador sorriu. Inda que seus olhos não passassem do cinza, suas lembranças guardariam eternamente o brilho eterno de Frostalia. 
— Estamos falando aqui de um trio de irmãos, figurinos roubados de armários de seus pais e um ataque nada violento de shibas — Lembrou-se. Pelos sentidos da Essência, o velho homem foi guiado ao sofá. — Estou certo? 
— Sim, senhor. — Foi rapidamente respondido. Ren levantava pouco de sua camiseta, de jeito que seu braço fosse exposto e bem recebido pela ponta da seringa. O vermelho líquido de seu conteúdo era tão cativante quanto o vermelho da espada Enma guardada na mesa em sua frente. — E sobre Volo, Cogita e Cíntia. 
— Uma vez — Era iniciada não só a história quanto a transferência do cinábrio do vidro ao sangue. —, você e seus irmãos decidiram inovar: fariam uma peça teatral no dia de Frostalia. Você não gostou muito. Não queria gravar as falas que Raiden escreveu e tampouco usar as roupas que a Reiko escolheu. Você nunca gostou de muito frufru. — Riu o velho. Em paralelo, mesmo que a história soasse atraente para seus ouvidos, Ren não conseguia muito bem reagir; e não reagir não era bem sua vontade naquele momento.  — Mas de algum jeito, eles te convenceram a entrar nessa. 
   O senhor percebeu a frequência cardíaca de Ren aumentar; era o efeito quase que fixo de quando sua mente e seu corpo se fundiam em um — ou melhor, quando seus sentimentos se revelavam meio ao efeito do cristal então líquido. A garganta travava, sua respiração falhava e o corpo travava. Era perdida a noção de espaço, mesmo que o tempo ainda passasse em seus olhos e ouvidos. Yi, com o auxílio de sua Essência, tocava-o as costas no intuito de acalmá-lo. 
— … E então se dividiram: Cíntia foi o primeiro papel criado, já que era Reiko a precursora de toda ideia. Então, Cogita veio ao script quando Raiden aceitou as ideias de sua irmã. Você, por ser teimoso, ganhou Volo quase no final de todo enredo. — Era retomada a história. — Conhecimento, o sentimento e o querer; respectivamente, da língua antiga estudada por vocês, significavam Cogita, Cíntia e Volo — eu sei, eu sinto e eu quero. Eram juntos os princípios que uma consciência deveria ter para conquistar o espaço-tempo.
   A boca do ouvinte abriu, mas nada saiu. 
— Seus rivais, o Espaço e o Tempo, viviam em guerra; e naquele tempo, nada mais poderiam ser senão seus cachorros. Coitados! — Um riso se ouviu outra vez, mas apenas de uma parte da conversa. Yi estava em um novo monólogo não por vontade própria, mas por paralisia inconsciente de seu ouvinte. Ren o ouvia, ouvia-o como se fosse som único no mundo, mas o fervor em seu sangue era suficiente para que ele travasse no seu espaço-tempo. — E então…
   E então que de repente, não era mais Yi no campo de visão de Ren, mas sim uma Reiko de cabelos ainda pretos bagunçados pela correria, vestido rosa roubado de sua mãe e uma jóia santa pendurada em seu pescoço. Ela gritava algo que ele ainda não era capaz de decodificar, pelo menos não enquanto sua mente criava um borrão entre a realidade e a alucinação — e se podemos aliviar sua situação, talvez aquele borrado fossem apenas memórias. 
   Do outro lado da cena, com um terno de mangas tão grandes quanto os braços poderiam caber, o pequeno Raiden pulava do sofá; ou melhor dizendo, caía do sofá.  Ele ainda era bochechudo, principalmente quando acumulava vento em suas bochechas pela chateação da própria falha de cálculo entre a altura do móvel e o chão. Aquilo com toda certeza não estava em seus planos, mas a admiração breve de seu reflexo no espelho que segurava com toda certeza estava. 
    Eram outra vez pequenos. 
— Vamos, Volo, não temos tempo para perder! — A criança de Ren, ou pelo menos seu estado atual de pertencimento, finalmente pode ouvir uma vez. Raiden estava perto demais, Reiko estava perto demais. As vozes eram sincronizadas em sua mente de jeito que ele não sabia diferenciar quem falava o quê. — O Tempo vai roubar o peito de peru! Corre! 
       E os três involuntariamente correram, mesmo que Ren perdesse tempo em descer os olhos e flagrar uma farpa — ou melhor, uma agulha — em seu braço esquerdo. Ele a tirou sem cuidado algum. 
   O plano dramaturgo infantil era infalível: Cogita (Raiden), o conhecimento, ficaria na linha de trás atento a todos  os movimentos inimigos. Ele saberia a hora exata de gritar partida ou recuada, como ditaria aos outros irmãos alternativas em seus caminhos. Cíntia (Reiko), o sentimento, acompanharia então o duelista Volo (Ren), a vontade, para que assim o pudesse auxiliar na balança de seus sentidos frente a bravura. E realmente foi um bom plano; Cíntia, Volo e Cogita juntos conseguiram deter o Espaço, de jeito que apenas sobrasse o vilão Tempo e seu peito de peru — troféu esse que script escrito por adulto algum poderia pensar em uma noite de Frostalia.  
   A dupla da vontade e do sentimento então ouviu seu conhecimento e partiu para cima do tempo. Com sua espada de madeira, a vontade de sobressaiu frente ao tempo graças ao orgulho exposto de seu sentimento, uma vez que ouvira seu irmão conhecimento. 
   Frente a espada, o Espaço havia sido cortado e o Tempo estremecia. Volo, Cogita e Cíntia começavam a desintegrar e o borrão se fazia outra vez presente em sua mente. 
   E então não existiam mais roupas largas, espadas de madeiras, peitos de peru, cachorros vilões e tampouco historias a serem relembradas do verde. Ainda que tudo deixasse de existir tanto para sua audição quanto para sua visão, Ren não estava tão bem consciente, mas não delirava mais como fazia quando tinha uma seringa em sua pele. 
   Assim como acontecera com Volo e Tempo, o vermelho da espada de Ren cintilava em sua mão e refletia o rosto trêmulo de Mestre Yi, senhor esse que por um momento se encontrava caído ao chão, cercado pela força dos braços de seu eterno aluno e a espada de Enma.
Mas Volo ainda precisava de Tempo. 
Aquele ainda não seria seu legado.
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luvdeathrobots · 5 months
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POV: Raison D'Etre (Parte 1)
clique aqui para ler a versão no google docs. *t.w.: tortura, sangue, tom melancólico. 
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[13/12/23. 22h]
   Os ventos frios presentes no Mercado das Maravilhas eram quase indiferentes ao frio que Ren Yamamoto sentia na barriga. No escuro da noite, uma lanterna baixa guiava o corpo do artífice ao ponto mais vazio da região, cujas árvores altas cobriam qualquer território de caráter duvidoso que pudesse existir ali — e como bem conhecido, o mercado ilegal e o refúgio de figuras atípicas pelo entorno de Ouroboros. Naquela noite específica, por exemplo, era o abrigo do velho sangrador especializado em armas e combates orientais, cujo conhecimento inspirava a Ren desde que se via como gente. 
   Três toques na porta de madeira foram dados em padrão de sinalização e identificação. O espadachim tinha em suas costas uma mochila sem fundo quase que vazia, apenas com pertences simples do rapaz, o que contrariava o tamanho daquele acessório. Ainda naquela noite, Yamamoto esperava preencher aquele vazio em sua visita — e não seriam coisas permitidas ou bem aceitas ao brilho do dia. 
— Entre. — Uma sombra surgia e desaparecia frente a porta. O corpo de Ren era puxado para entrar. —  Não é todo mundo que pode saber que você está aqui. — Ou melhor: que aquele senhor estava ali. 
   A figura do sangrador não era tão acabada quanto a que Yamamoto lembrava ser. Tinha em torno de sessenta anos, mas seu físico era semelhante ao padrão de uns cinquenta. Seus cabelos eram bem cuidados e por trás daquele coque firme, havia uma longa cabeleira digna de antigas tradições orientais. Aquele homem carregava consigo trajes chiques apesar do horário, do local e a sua visita em questão; e seu sobretudo cobria parte da única katana que o hidrius levava em suas viagens. Ren, pelo contrário, era só um garoto agasalhado com uma mochila vazia. 
   Havia algo diferente naquele clima. Ren não se sentia nervoso pela busca de objetos ou os perigos da fuga, mas sim pela incredulidade em ver aquela figura que tanto o colocava para andar e puxava assuntos que sequer conseguia prestar atenção. Eles tinham muito o que conversar, imaginava, mas do artífice nenhum som corria o vento. Ele não conseguia falar. Sua boca se abria, sua mente formulava uma frase e a sua garganta travava sempre que qualquer sílaba tentasse escapulir. 
— Ah, sim. Esqueci que não te ensinaram bons modos em casa. — A voz do sangrador se misturava ao som do toque fraco da bainha de sua espada nos cabelos de Ren. Aquele impacto doía mais em suas memórias de infância, mas não naquele momento. 
— Você veio. 
   O velho revirou seus olhos e um riso foi capaz de ser ouvido. Ren se sentiu feliz, mesmo que não expressasse aquilo de maneira literal. 
—  Claro que vim. Sua última carta me convenceu. 
— Pensei que mandaria alguém em seu nome. — Confessou para o hidrius. — Ou que os correios ainda te ajudassem. 
— Se eu soubesse que me encontraria com o mais sem educação de todo o Oriente — Agora a lâmina coberta cutucava as botas de Ren. Ele entendeu seu recado e foi deixá-las no tapete frente a porta. —, teria mandado alguém em meu lugar. 
— Como estão? — Perguntava o artífice ao cumprir a etiqueta tradicional oriental e voltar ao seu diálogo. Seus olhos em momento algum abandonaram o sangrador.  —  Enma e Shusui. 
   O hidrius guardou sua espada no sobretudo e passou a caminhar com Ren diante do terreno. Definitivamente, tinham muito o que conversar. 
— Vamos começar por partes. Primeiro, você foi às minas. 
— E então monstros atacaram. — Falaram basicamente juntos. Aquilo despertou no senhor um olhar de canto. 
   Uma porta foi aberta. A luz baixa da região não revelava muita coisa a não ser uma mesa de centro, uma televisão, duas poltronas e diversos papéis espalhados na mesa. Tinha até mesmo um ventilador. 
— E você, por instinto, atacou-as de volta. — Retomou o sangrador. — E suas espadas começaram a ficar estranhas. 
— Começaram a brilhar. Na primeira noite, não consegui tirar as gosmas das lâminas. Tive que deixá-las em quarentena. Na segunda noite, brilhavam no caixote. Na terceira, o caixote começou a corroer. Quando fui ver, a gosma agia como um ácido. — Lembrou-se Ren. As memórias faziam seus pelos se arrepiarem. 
— Sangue. — Corrigiu. — A gosma era sangue. E  você e eu sabemos que aquele sangue não era puro, muito menos as criaturas. 
— Não, senhor. Eram terríveis e descontroladas. Pareciam predadores de eterna fome. 
— E eram. Nada naquele lugar está em boa forma, garoto, e você viu com teus olhos. — O velho suspirou. Em passos curtos, dava a volta pelo quarto para revelar a Ren o par de katanas brilhantes e cobertas por seus estojos, mesmo que o brilho avermelhado sobressaísse o couro. — Olhe-as com cuidado. 
   Ren ficou parado por alguns segundos. Sentiu receio de abrir o estojo, de não vê-las ou ser algo totalmente novo — e tinha medo de não ser mais digno daquela dupla. Seu medo foi farejado pelo sangrador. 
— Me diga o que aconteceu com elas, com Enma e Shusui. 
— Primeiramente, a lâmina de Shusui quebrou. — Era separada a mesma katana para demonstração. Ren o olhou torto. — Veja bem, a gosma, como você mesmo chama, não foi muito bem aceita. Materiais fracos levam a fins óbvios, e com o tempo Shusui vem se degradando. Peço para que me deixe analisá-la por mais tempo, inclusive, para que eu consiga te explicar melhor os efeitos do DNA animal modificado com cinábrio. E eu acredito que não vá querer uma espada quebrada… 
   O artífice suspirou. Ele pensou em passar os dedos diante da chapa partida, mas se conteve. Era o mesmo que ignorar toda explicação. O velho retomou: 
— Agora, Enma é outro caso. — Shusui foi devolvida para dar espaço a espada denominada Enma. Seu brilho era ofuscante, cujo vermelho era capaz de cegar caso o ambiente fosse um pouco mais mal iluminado. Até sua curvatura parecia mais afiada.  — Veja bem, sua lâmina está mais pontuda e a espada está mais pesada. — Com cuidado, passou-a para Ren, que quase deixou-a cair  ao não reconhecer seu novo peso. — E está mais forte. Minha teoria é que quando entrou em contato direto com as criaturas, com as minas… por alguma razão o tamahagane se fundiu ao cinábrio. 
Yamamoto levou seus olhos ao senhor. 
— Como um tratamento térmico. — Adivinhou. 
— Se preferir entender assim, sim. — O velho tomou a arma pelo cabo outra vez. — Acredito que com a alta exposição do cristal e até mesmo o clima das minas com o incidente ocorrido tenha ajudado a aquecer o cinábrio e o fixado. — Os olhos de tom quase cinza se encontraram aos pretos de Ren. — Um presente e tanto de graça, eu diria. 
   Felizmente ou não, o ocorrido de Enma não era uma maldição — hipótese essa presente por certo tempo incômodo nos pensamentos do espadachim. Aquilo ainda não era um alívio e tampouco algo simples: era de tamanha agonia que o artífice se sentiu ofendido ao ter sua arma distanciada de si. Ele se aproximou de seu superior com feições inquietas, tentando identificar visualmente todos os detalhes descritos, mas falhando. Imaginação não era bem seu forte. 
   O sangrador saltou para trás e deixou uma mão frente ao corpo de Ren. O espadachim não entendeu muito bem aquele feito e deu outro passo à procura de tomar sua espada. Foi bloqueado por uma tela d’água. 
 — Por que não me deixa chegar perto dela?!  — Yamamoto exclamou em irritação. Suas sobrancelhas se encolheram e ele trouxe ao momento um olhar confuso. 
 — Marimo — Aquele apelido o arrepiou. O assunto agora não era mais sobre estudos. —, você precisa merecê-la. Ela é sua, não há para quem mentir. Você a comprou, pertence a você; mas você realmente a merece? 
 — Claro que mereço! — Bateu a mão na mesa, cuja resposta foi um olhar de morte vindo do sangrador. Ren ajeitou a sua postura e corrigiu seu tom de voz.  — Por favor, senhor, me devolva Enma.  
 — Quando recebeu Wano — Era referenciada a katana recebida após a morte de Hinata, seu pai. —, por que a recebeu? 
— Para proteger meus irmãos. — Adivinhou.
   A lâmina desembainhada encontrou o queixo desprotegido de Yamamoto e o ergueu não em movimentação, mas em ameaça. Ele engoliu seco. O senhor riu.
— Porque perdi para Wano — O artífice retificou sua memória e suspirou fundo em sua confissão. — E prometi um dia ser digno. 
   O velho hidrius parecia disposto a fazê-lo falar mais daquela história, mas conhecia ela o suficiente para negar lapsos de lembranças adicionais. As botas de Yamamoto foram observadas por curtos segundos e ele se recordou de suas manchas. 
 — Ren Yamamoto  — A voz que antes ocupava sua frente então diminuía à direita e aumentava à esquerda. Ren relaxou seu corpo por um instante.  — Por que não fala de suas boas memórias? 
   Antes que ele pudesse responder, seus olhos se arregalaram e suas costas foram arqueadas em reflexo. O tom doce e calmo do sangrador não era nada parecido com o toque da ponta de Enma em seu ombro e muito menos do corte que se estendia na pele. Sua boca se abriu, mas nada saiu. Seus músculos se contraíram em nervoso, as mãos tocaram os ventos e ele pôde jurar que por um momento, sua visão ficou turva. 
— Por que não fala de quando a roubou de seu pai para treinar nas árvores? — A espada permaneceu parada na pele. Para Ren, as palavras ouvidas eram mais torturantes do que a dor que sentia. — Ou quando largou a espada de bambu para brincar com uma de verdade? 
   Yamamoto tremeu. Como no início da noite, não conseguia falar — e naquele momento, não era contentamento que o tirava todo tipo de expressão. Ele fechou seus olhos, desejou com que aquilo acabasse e que finalmente pudesse voltar para casa; mesmo que casa já não tivesse o mesmo significado para ele há muito tempo. 
   O velho esperou um olhar. O silêncio de Ren não era respeitado e quanto mais memórias de sua infância eram jogadas ao ar, mais Ren sentia o frio da lâmina em sua pele. 
— Eu mereço Enma! — Gritou a voz grossa e firme do artífice. Finalmente a coragem tomou forma ao vento e ele deu um passo em distância da katana para se virar frente a o sangrador. Mesmo que seus olhos lacrimejassem em eterna melancolia, ainda era possível flagrar em suas orbes o brilho feroz refletido da espada. O tecido de sua camiseta era pressionado por uma das mãos no ombros na tentativa idiota de conter o sangue. — Mereço as vezes que a ergui, que a deixei cair, que a fiz conhecer os duelos mais estranhos que poderíamos ter na vida! — Quão mais sua mente enchia, mais era a raiva presente nos atos de Ren. Ele largou seu ferimento e com as mãos manchadas, tomou a base de Enma para segurá-la com força. O brilho do cristal presente na arma aumentou e ela foi devidamente posicionada frente ao corpo do velho, quase a mesma posição de quando conheceu o amargo do cinábrio. E mereço toda cicatriz de todo erro que tive com ela. Mereço a desgraça que a minha vida virou quando entreguei ela a você e mereço a sua marca de agora. 
   Um lapso de memória correu a mente do hidrius. Ele sorriu, ou pelo menos trouxe à suas expressões algo similar a tal enquanto, sem Ren perceber, deixava com que o sangue do artifíce esquecesse a saída do corte em rumos distantes. Pelo menos era o que conseguia fazer enquanto seu garoto tinha seu momento de honra. 
— E eu mereço a tua visita. Eu mereço que você esteja aqui agora, Yi, porque pensei que em algum momento não aguentaria mais. — E então, a mesma postura antes forte e raivosa desabrochava. O artífice caiu de joelhos ao chão e deixou com que sua espada fizesse o mesmo, ainda que a tivesse em mãos. A verdade é que Yamamoto seria uma eterna criança frente ao velho combatente e sangrador. — E mereço teus treinos, teus ensinamentos… E eu mereço uma chance. Yi-sensei, eu mereço viver! 
   Palavras não eram mais necessárias. Da garganta de Ren, o choro tomava final liberdade e sua voz podia falhar sem o medo de se sentir fraco. Ren Yamamoto não era fraco. Por mais que ouvisse muito e sentisse muito, Ren Yamamoto não era fraco. Por mais que a Essência o esquecesse, Ren Yamamoto não era fraco. Por mais que o cinábrio o matasse cada dia  a outro, Ren Yamamoto não era fraco e nunca seria. O sangue agora cuidado em seu ombro, suas cicatrizes e seus feitos no mundo comprovavam cada momento de que sua existência não era à toa — por mais que aquele fosse seu desejo por muitos anos. 
   Mestre Yi, o sangrador, aproximou-se de Ren. Assim como o artífice, seus joelhos tocaram o chão e suas mãos, o rosto de seu aprendiz. Na pele do oriental, a luz ofuscante de Enma era refletida e o cinza dos olhos de Yi tomavam vermelhidão não cruel, mas sim cuidadosa. Por mais que nada dissesse o velho, muito sentia por seus cuidados. O sangue contido, a espada não reclamada, os xingamentos não censurados e a vinda do oriental eram formas de que Yi tinha de se expressar ao no lugar de simplesmente dizer:
— Ren Yamamoto, você merece viver. 
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luvdeathrobots · 6 months
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OBRDROP: invasão na rádio.
*t.w.: agressão. Clique aqui para ler a versão no Google Docs.
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   A rádio caiu às oito e meia por todo o castelo ao que um grito se espalhou em Ouroboros. O artífice Ren Yamamoto havia acabado de escapar da enfermaria para entender o que se passava ao redor do Salão Principal. Apesar do receio de sua namorada perante aquilo, ele não via problema algum em se esbarrar com a guarda, tirar suas dúvidas (a partir da observação) e então voltar para sua visita a Flora. Coisas simples, imaginava, que talvez respondessem metade das perguntas em sua cabeça. 
   Um rapaz loiro se aproximou com um sorriso orgulhoso, olhos bem atentos e o espaçamento perfeito entre as mãos para um aplauso. Assim como o artífice, aquela carapuça amarela e feia, como Yamamoto mesmo julgava, havia descido quase toda longa escadaria e se atentava à multidão, àquele aperto, àquela censura tão literal. Seus olhos brilhavam em admiração pelo feito do Império, de orgulho, realização ou qualquer outro sinônimo facilmente julgado como nojento. 
— Não é bonita? — Começou o loiro. Ren ignorou. — A purificação do sangue.
   A verdade era que se cada um presente no Salão Principal prestasse atenção nos detalhes, nos mínimos  possíveis, poderia sentir o cheiro incômodo, ver o vermelho atípico nos uniformes e narrar o volume coberto acima de tantas cabeças padronizadas e fardadas. Não era um desmaio ou um socorro de um corpo; era a morte presente com destino às estradas do Império, àquele cemitério tão cheio de números, mas tão vazio de almas. Pelo menos era assim que Ren pensava, via ou se sentia ao realizar o que tinha na sua frente, mesmo que longe assim em questão de tato — Nighe estava morto. Ponto final. 
   Acontece que qualquer sentimento que tivesse ali seria pequeno demais se Yamamoto pensasse nos últimos momentos de Nighe. Conhecia o desespero e a adrenalina da quase morte, mas da certeza dela, e aquilo sim o causava arrepios. Tinha a incerteza de considerar aquele ato coragem, idiotice ou libertação; acontece que no fim, independentemente do julgamento daquele oriental, nada mudaria a sentença final daqueles considerados rebeldes — seja isso considerado  injusto ou não. 
   Um riso incomodou os ouvidos de Yamamoto. De repente, a inquietude do loiro ao seu lado havia sido trocada das palmas aos risos. O artífice levou seus olhos até o julgado intrometido ao seu lado — e mal ele imaginaria que essa atenção irrelevante o daria tanta dor de cabeça para aquela noite. 
— Graças a aquele cara ali — Como se não bastasse a ousadia do aplauso, da admiração ou do riso, o “insuportável moleque” apontou para o corpo carregado na frente dos dois logo ao extremo do salão. — ... a recompensa pelos rebeldes vai ser bem maior.
   Ren suspirou. Seus olhos alcançaram o topo e ele pressionou os dedos em seus braços cruzados.
— A caça, o fogo, a guerra, tudo voltará a ocorrer. E vai ser melhor, vai ser maior... — Retomou o loiro. Seu riso aumentava. A empolgação daquela figura parecia incomparável aos demais presentes no momento. Era criminosa a forma em que pouco respeitava o acontecido. — ... Vai ser grandioso! 
   Outra vez, afastou-se. Não queria se estressar mais, mesmo que aquilo já estivesse feito. O rapaz em seu lado parecia um idiota com aquela feição, com aquela tentativa de aproximação. E quanto mais ele falava, mais ele aplaudia, mais a mente de Ren explodia. 
  — É, é isso! — Certamente era “o arrombado”, como Ren pensava. — A purificação pela prata! 
   E dali Ren Yamamoto não se aguentou: voz irritante, nariz enxerido e falas sem cabimento — seus critérios para o estresse. Tão de repente quanto a aparição daquele garoto, tão de repente era a forma que o corpo leve era arremessado contra a parede daquela escada. Se uma vez os braços de Ren se cruzavam em análise, agora se separavam para segurar tanto o rosto trêmulo em sua frente quanto a camiseta rica e engomada, cujo pingente de ouro reluzia no tecido em seu sobrenome de carreira podre: Clifford. 
— Cala a boca, porra. Não é hora de ficar vomitando besteiras, vagabundo. — Firme, a palma de Ren dobrava o vento no estalo de um tapa ao rosto pálido em sua frente. Não tinha medo de flagras, de guardas ou nada do gênero. Estava estressado não só aquela noite, mas toda a semana - e aquilo era mais que o suficiente para fazê-lo explodir. — Você não entende, imbecil? Ele pode ter sido um idiota, a porra de um sacrifício público, mas ainda era um de nós. Era gente.
   Ren puxou o loiro ao chão, aos degraus que os sustentavam, e ali manchou a calça branca com a sola de seu sapato. Era um chute, um aperto, tudo que sua raiva conseguia externalizar. Ele cuspiu ao lado no chão limpo, da mão cheia de jóias do rapaz. Os olhos do “pilantra mal fodido”, apelido aquele que Ren o dava agora, arregalavam-se no misto de surpresa e medo. Ele até tentou revidar, tentou se segurar no torso do artífice e fugir, mas nada adiantaria. Os braços de Yamamoto mantinham força suficiente para não deixá-lo sair. Era raiva, era a cabeça acumulada, era a palavra da injustiça tomando significado renovado em sua cabeça. Não havia nada no mundo que mudasse a natureza agressiva daqueles olhos, daqueles punhos, daquele peito cheio.
— Que porra é essa, cara?! — Clifford olhava para Ren incrédulo, sem muito entender; afinal, da bolha que ele vivia, poucas eram as pessoas que abriam a boca e contestavam nomes caros. — Seu filho da puta, eu não menti! Você está com eles?! Não é possível! — Tentava escapar de novo e de novo, mas em desespero escorregou a própria mão no chão. Ren, pelo contrário, não tirava os olhos dele. — O que você quer de mim?! Eu posso comprar tua família, saia de mim! 
— E eu a porra de um subsolo pra te enterrar. — O artífice refutou em tom firme, forte e alto. Yamamoto também era um sobrenome caro, por igualdade de discussão. — Quero que cale a boca. Pare de falar merda. Um cara morreu na tua frente, seu vagabundo, e o único esforço que tu faz depois de ouvir tudo é aplaudir. — Soltou-o outra vez contra as escadas, levantando-se à procura de manter superioridade. — Vê se aprende, animal imundo. Vá na porra da enfermaria. Vá para aquela porta logo ali — Apontou para os guardas que a pouco sumiam na saída. — … e entenda, seu vagabundo. Estaríamos melhor sem um imbecil como você. 
   Outro chute, outro olhar de desprezo, outro suspiro; foi assim que Ren censurou totalmente todo grunhido, grito ou pedido de socorro do outro rapaz enquanto o artífice se dirigia para caminho qualquer que não fosse seu anterior, que não tivessem mais rostos imprestáveis quanto o daquele loiro. “Saia daqui, fodido”, ele ordenou. 
   Pensando em seu mundo, em seu universo nada perfeito, talvez não fosse mais tão Yamamoto quanto sua mãe gostaria que fosse; aquele pensamento de vingança, de ódio e de desprezo imperial, tudo aquilo contrariava totalmente os ideais de sua casa. E ele não ligava. Não ligava de, aos poucos, se tornar um rebelde.  
   O quão pouco valiam as almas rebeldes, afinal, se por quase nenhum tempo respiravam ao redor daquela guarda? Quão insignificantes eram suas vidas?
O quão insignificante ele era?
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luvdeathrobots · 7 months
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POV: Monstro.
*tw: agressão, tentativa de homicídio. Clique aqui para ler a versão no Google Docs.
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   Era a última apresentação da noite de eventos das Indústrias Yamamoto. Hana Yamamoto, atual industrial, subia ao palco em meio ao eco de palmas, ao brilho das luzes e ao incentivo dos milhares de sorrisos comprados vindos do palco. Esbanjava em suas expressões nada mais nem menos que o orgulho sólido. 
— Obrigada, obrigada! — Apesar da calmaria na voz, seu sorriso era sádico, era esperto. Não havia vitória maior nos olhos de Hana que não fosse a atenção de seu público. — E é com extremo prazer que nós, das Indústrias Yamamoto, apresentamos a vocês a nossa mais nova invenção: ABR-005! É maior! É melhor! É o soldado perfeito! — Quão mais intensos eram seus adjetivos, mais alta era a voz que a líder trazia. — Conheçam, então, o futuro de titânio! 
   Havia silêncio até Hana sair do palco, as cortinas se abrirem e Ren Yamamoto ser revelado pelas luzes amarelas, vermelhas e azuis. Depois, muito pouco se podia ouvir das vozes presentes na plateia quando ABR-005 surgiu no centro de tudo. A máquina era grande, robusta, de quase dois metros e forma humanóide. Em seu corpo, era destacável a armadura de titânio e detalhes feitos a ouro, assim como o Cinábrio que brilhava em seu centro. Estava preparada para a guerra, aquilo era óbvio; o vermelho misturado ao preto em sua pintura não denunciava outra coisa senão a obsessão pela violência. 
   De início, Ren sabia muito bem com o que lidaria. Conhecia aquele dispositivo desde os esboços duplicados, rasgados e rabiscados de anos atrás. Era, finalmente, o dia que veria o esforço de alguns dos muitos funcionários tomando vida — e futuramente, sabia ele, tomando a vida. Ren não tinha o que temer. Conhecia cada movimento, cada surpresa que aquela máquina tinha a oferecer. Sabia seus limites. Era somente uma brincadeira planejada que futuramente traria a toda sua família não só o nome no topo como a pilha de dinheiro que ele sabia que sua mãe, Hana, gostava. Pelo menos ele achava que era só isso.
   Sua apresentação começou como qualquer outra: um resumo quase inútil sobre ABR-005 e para o que servia. Logo, a luta. Ren era ágil, era preciso. Suas mãos se alternavam em tiros disparados por uma pistola e então pelo arranhão de uma espada, tudo certeiro e totalmente calculado no titânio. Certamente, nada daquilo era suficiente para parar ou ao menos impedir avanços do robô; era apenas uma forma de demonstrar a resistência daquela besta. Do mesmo jeito que aquilo sabia se defender, sabia atacar, e assim foi: golpes precisos, eficientes para apagar qualquer um, mas totalmente ensaiados pelo garoto de magia artificial que simulava uma luta no momento. De maneira bruta e ligeira, ABR-005 apresentava a conversão de uma mão mecânica para uma lâmina totalmente afiada, extensa e de forma similar a uma foice; afinal, não havia nada que simulasse a morte tão bem quanto uma foice. Era esse seu diferencial de todas as máquinas criadas anteriormente: não teria piedade. Aquela força, aquele peso, aquela resistência e aquele gume, tudo era feito para ser preenchido pelo sangue. 
   Ren e ABR-005 ficaram em zigue-zague por certo tempo, tempo o suficiente para o apresentador imaginar que estava no fim. Não estava. O artífice podia jurar já ter visto tudo ensaiado nos dias anteriores, desviado ou acertado, mas havia algo de errado com ABR-005. A máquina brilhava mais. Brilhava o roxo do Cinábrio, brilhava o vermelho de seu corpo. Diferentemente dos padrões ensaiados, a besta começava a tomar tom mais agressivo e desregulado. A lâmina de sua foice outra vez foi vista e nada resumia mais Ren que o susto escancarado em seus olhos. Não conhecia aquilo. Não era aquilo que havia combinado com sua mãe. 
   ABR-005 impacientemente abandonava suas configurações iniciais. Em passos frenéticos, passava a derrubar seu rival com uma rasteira. A foice era cravada em seu rosto e todas as luzes do ambiente se apagavam. Era o preto, o vermelho da máquina e o reflexo das cores em Ren. Se alguém olhasse única e exclusivamente para aquele rapaz, seja a olhos nus ou pela câmera de seus celulares, sentiria nele o desespero de uma enrascada. Estava imobilizado. Não havia disparo de arma, acerto de lâmina ou golpe algum que invertesse sua situação. Então, de repente sentiu a força dos punhos de aço em sua barriga. Nunca em sua vida um golpe o doera tanto quanto aquele; afinal, era misturada a dor física da dor da humilhação pública. 
   Ren só foi capaz de ver outra vez a plateia quando seu corpo foi erguido e carregado pela máquina. Seus amigos, seus irmãos, sua namorada e diversas outras pessoas que ele talvez nunca fosse saber seus nomes gravavam aquele momento tanto em suas memórias quanto em seus celulares. Ele fechou seus olhos em esperança que aquilo acabasse, mas era só o início de seu pesadelo. A voz de sua mãe e industrial Hana roubou dele míseros segundos de atenção — e raiva.
— E é com extremo prazer que nós, das Indústrias Yamamoto — Era sufocante, era duradouro, era mortal. A besta mecânica refletia nos olhos de Ren o desespero eterno de sua alma, assim como sua mãe o fazia pela nada empática voz. —, apresentamos a vocês ABR–005! 
   O barulho dos aplausos invadiram os ouvidos do artífice como um incômodo ruído. Preso ao frio das mãos robóticas de ABR-005, ele não sentia nada mais que a angústia da morte — ou pelo menos do gosto azedo dela. A besta mecânica sorria. De algum jeito, aquele monte de peças sorria dentro do vidro preto e as luzes brancas. Era cruel, era persistente, era programado para aquilo. Os simulados dígitos gélidos apertavam sua garganta de maneira lenta, torturante e psicótica. Aquilo sabia a hora exata de largar seu ponto vital, deixar o corpo cair e então se curvar em total sucesso de sua criação. 
   Nas memórias de Ren Yamamoto, os Eventos de Lançamento sempre foram bons — no passado, no exato passado; agora, jogado ao chão como um nada, eram meras ilusões de respeito, de progresso e de orgulho. Sua visão diminuía aos poucos como a cortina do palco se fechava. Era primeiro o amarelo das luzes, o azulado da besta em seu caminho e o cinza de sua mãe. O ar era rarefeito. Um borrão, um sussurro e um riso; era tudo que conseguia identificar nos curtos segundos consciente, mesmo que não estivesse morto.
 E então tudo era breu.
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luvdeathrobots · 7 months
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Essentia Animarum: Amarelo, lareiras e saudade.
t.w: luto, teor melancólico.  *clique aqui para ler a versão no google docs.
   A MAIOR DIFICULDADE QUE REN TINHA EM SUA VIDA ERA COMEÇAR; começar a aceitar suas decisões, suas perdas, suas vontades, suas necessidades e a falta de suas qualidades. Era péssimo em aceitar, por exemplo, as múltiplas e infinitas palavras em sua cabeça que insistiam para que ele levasse algo à fogueira. Provavelmente o melhor a se fazer era ir embora, deixar seu pertence quieto no bolso e apenas ouvir as preces dos outros. Pelo menos ao longo de todos os seus quase vinte e quatro anos de vida, “ir embora” era a melhor opção para Ren.   A verdade é que havia certa melancolia naqueles olhos. Em toda a sua vida, desde que  a falta de seu pai se fez presente em seu cotidiano, não existia motivo sequer no mundo que o fizesse pensar em tons amarelos. Era primeiro o azul, o cinza e o branco. Aquela fogueira que queimava em sua frente era, senão fogo que o arrepiava, fogo azulado que refletia na imensidão preta de sua íris o medo de continuar. Isso mesmo, continuar; continuar com as tradições, com a sua coragem, com a sua vontade de sair dos malditos tons azuis, de permitir que os raros momentos rosas e vermelhos se tornassem reais em sua vida. 
   Se conseguia começar, conseguia continuar. E se Ren Yamamoto podia continuar, ele podia viver. 
   Ren deu um passo, exato um passo rumo a fogueira. Receio era o nome de seu medo. Ele colocou a mão em seu bolso, agarrou o pequeno anel de seu pai e o apertou. Naquele momento, o mundo parou. A chama que antes queimava em sua frente de repente não era a mesma senão a lareira que queimava em sua casa sábado à noite enquanto ouvia histórias de seu velho. Era a lareira, era a flor de cerejeira, era a espada e então era o homem que há muito tempo não lhe dedicava um sorriso. A fogueira era, por fim, a notícia triste que o assombrava desde janeiro de muitos anos atrás.
   Ele se sentiu paralisado. Por pelo menos alguns segundos, seus olhos foram incapazes de piscar como sua mente foi incapaz de voltar à realidade. Precisava sentir o fogo, precisava vê-lo de perto. Precisava sentir o real, precisava se sentir real. O anel que era protegido pelo punho pouco teve tempo de ver o mundo. Caía, perdia-se nas chamas e então sumia. Foi nessa distopia que Ren Yamamoto tocou o fogo. Com suas próprias mãos, ele se desafiou a sentir. A lareira, as flores, as espadas e as histórias de seu pai logo queimaram na mesma despedida que o ouro velho do aro caído recentemente. 
   Mas ele conseguiu ver o amarelo, sim. Ele tinha quase certeza que tons amarelados, alaranjados e avermelhados tomavam conta de sua paleta. Afinal, por um momento, ele viu sua família. Em um vislumbre, um pequeno vislumbre, Ren Yamamoto conseguiu enxergar seu pai ao seu lado com aquela barba mal feita, aquele sorriso torto e aquele cabelo que Ren esperava não herdar tão cedo. Fosse pela adrenalina, a emoção, a dor ou a agonia do fogo, seus olhos se encheram e ele precisou fechá-los para que aquele momento fosse, outra vez, único. E então, do fundo de seu coração, ele desejou algo. Algo que algumas pessoas faziam Ren perceber que talvez não fosse ruim. Algo que há certo tempo realizava não como um costume, não como uma lei, mas um luxo concedido pela coragem de tentar se permitir. Diante a fogueira e a profecia de Arkaween, ele desejou nada mais nem menos do que viver.
   Afinal, se conseguia viver, conseguia sonhar. E se Ren Yamamoto conseguia sonhar, conseguia realizar.
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luvdeathrobots · 8 months
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pinned.
full lore. about. selfpara's guide. cnns. pinterest.
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