Tumgik
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As botas já começavam a incomodar. Havia passado muito tempo.
- Ahn… Onde estamos?
- Estamos perdidos? Uh, você podia ter me avisado, eu ia marcar o caminho com os doces que eu não gosto.
- É, como eu ia saber? Eu nem tinha notado que a gente estava andando ainda. O que é...
Do lado do seu meio-irmão menor, uma raposa branca acompanhava a caminhada como um cachorro muito bem treinado, seu semblante era quase humano, e parecia tirar prazer da nova companhia.
- O nome dela é Ellen, só agora que percebeu? Faz tempo que ela está com a gente.
- Ellen? Colocou um nome na raposa? Nós não vamos ficar com…
- Ele não me pôs um nome, eu que disse a ele.
- Ah sim. Mas Buz nós não vamos ficar com… Peraí!
- Ela fala Will! Isso não é legal?
Os três pararam de andar por um instante. Will, o mais velho, mirava a raposa com a boca entreaberta emitindo um som surdo. A raposa devolvia o olhar com condescendência.
- Vocês estão perdidos?
- É, o Will disse que sim mas eu tenho certeza que vamos nos achar. Você pode ajudar?
- É claro. Por que estão vestidos assim?
- É que estamos fantasiados para pedir doces! Bom… Na verdade eu estava pedindo doces, o Will ia para uma festa de fantasias, não é Will? Will?
Will se mantinha com a mesma feição assustada, era a primeira vez que via um animal falando. Isso se você desconsiderar um papagaio. Digamos que era a única raposa albina que Will veria falando. Will estava vestido de cowboy, já Buz, seu meio-irmão de oito anos, estava com algum tipo de vestimenta que deveria lembrar um astronauta. Will agora parecia se recuperar gradativamente do choque, seu rosto estava levemente esverdeado.
- Ellen, não é? Pode nos tirar daqui?
- Não ouviu nada do que eu disse pro seu irmãozinho? Sim eu posso, isso se você não quiser parar em um rodeio no caminho…
- Está caçoando da minha fantasia? Tecnicamente você está pelada. E outra coisa, Buz é meu meio-irmão.
Um barulho interrompeu a discussão. Will então percebeu que a floresta em questão era realmente densa, não conseguia ver mais do que vinte metros ao seu redor, e em algum lugar para sua esquerda algo se mexeu. Uma floresta àquelas horas da noite com o filho caçula de sua mãe. Isso certamente o colocaria em problemas.
- Precisamos sair daqui.
- Calma, acho que tem algo ali, cowboy.
Justamente por isso precisamos dar o fora!
- Will, será que são sapos? Eu sempre quis ver sapos, vem Ellen. - Buz se dirigiu para fonte do barulho mais rápido do que os reflexos de Will poderiam impedir.
Uma luz surgiu entre os arbustos, atrás dela uma silhueta se formou nas sombras. Will e Ellen gritaram em uníssono, Buz apenas disse “olá, o senhor viu algum sapo aí atrás?”
- Crianças? O que estão fazendo no Jardim uma hora dessas? Estão sozinhas? - Era um homem. Ao se aproximar revelou suas feições duras. Certamente um homem que vivia na floresta. Sua barba cheia escondiam boa parte de seu rosto, usava um sobretudo mofado e surrado, um chapéu que não combinava com suas roupas. Em uma das mãos carregava um machado, na outra uma lamparina que cegou momentaneamente os garotos e a raposa.
- Ahn, não senhor, estamos justamente esperando nossos pais… Que são caçadores! Eles foram por ali mas já devem estar de volta em um…
- Do que está falando Will? Nossos pais trabalham em escritórios.
- A minha mãe e o seu pai, talvez, já o MEU pai…
- Psiu, deixa que eu falo. - A raposa sussurrou de canto de boca. - Ei seu… Lenhador? Estamos só de passagem, vamos apenas seguir nosso caminho, ok?
Por um segundo o Lenhador olhou para a raposa e depois para os garotos. Não parecia nada surpreso.
- Não se deve andar pelo Jardim quando escurece, sabem? Existem… Coisas no Jardim. E existe A Sombra. Ao anoitecer é quando ela está mais forte e faminta. Devem passar a noite na minha cabana! E não aceito não como resposta, seria uma irresponsabilidade da minha parte.
E ao dizer isso se virou e começou a seguir uma trilha para dentro da floresta. Os garotos ficaram parados por alguns instantes. Todos pareciam desnorteados, não poderiam ficar ali, e certamente não conseguiriam correr de um homem adulto daquele tamanho com um machado e uma lamparina. Seria uma boa ideia seguir o homem?
- Garotos? Venham logo, fiquem perto de mim, o escuro atrai A Sombra.
- E agora Ellen, confiamos nesse cara ou não?
- Bom, o que ele disse sobre a sombra é verdade, existe um boato muito forte sobre uma sombra que caminha… E enlouquece viajantes de um jeito que é preferível estar morto. Mas é só uma história,  eu acho. Por outro lado, não é seguro andar nessas horas mesmo, a lua está iluminando muito pouco essa noite. Talvez deveríamos mesmo… Ei, cadê seu irmão?
- Meio-irmão. Não sei acho que ele..
- Will! Achei um sapo. Olha só que gordo. Qual nome você acha que...
- Ótimo, vamos indo.
Andaram a uma distância que denominaram segura do Lenhador. Andaram por alguns minutos em silêncio, a floresta ficou menos e menos densa até se abrir em uma clareira onde viram o homem parado. Ao chegarem ao seu lado, ele disse:
- Sabe, não me chame de lenhador. Eu sou um pescador. Não é porquê eu estava cortando lenha que eu sou um lenhador, tecnicamente eu vivo de pesca. Então se puderem por favor…
- Isso é a sua casa?
- Moço, você dorme aí? Eu posso levar o sapo para dentro?
Todos fitavam a cabana. Era completamente feita de madeira, os vidros das janelas estavam quebrados e delas pendiam as cortinas de forma assustadora. A fachada cabana lembrava vagamente um rosto. Um rosto sem vida e gigantesco e todos eles estavam prestes a entrar voluntariamente. Se existe alguma residência com o aspecto mais amaldiçoado que aquele casebre, Will desconhecia.
- Vamos, é mais aconchegante por dentro, eu prometo.
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Ao pegar minha caneca na pia, cheia dO Líquido Preto da Manhã, percebi que em sua asa estava enrolada uma fita azul.
Essa é minha caneca preferida, tenho certeza que essa fita azul não estava aqui ontem. Eu acho.
- Ei cabeçuda, vamos logo. Ainda tenho que passar e pegar a roupa na… Que caixa é essa? - A menina do trabalho esta fazendo aniversario, tenho que levar alguma coisa, né? - Claro, mas aposto que você gastou mais nesse embrulho do que no presente em si. - É, mas pelo menos é de coração, idiota. Vamos passar na padaria, estou com fome.
Terminei de tomar o café o mais rápido possível, a ultima vez que derrubei algo no carro dela acabei o dia todo com a imagem da carranca que ela fez na minha mente.
Ao puxar a maçaneta da porta do passageiro, uma pequena fita azul se enrolou em meus dedos.
- Hum. - O que foi? - Nada. Acho que está na hora da gente pegar um cachorro. - Talvez. - Ela sorriu de um jeito esquisito, as vezes não consigo lê-la corretamente.
Muitas coisas esquisitas aconteceram no caminho, aparentemente ela mudou a playlist preferida para umas musicas de ninar, ou algo assim. Quando fui guardar meus óculos no porta-luvas encontrei um saco com mais duas fitas azuis.
Em algum momento a mãe dela me ligou, me perguntou como eu estava e, evitando usar palavras específicas, pediu para falar com a minha mulher. As duas tiveram uma conversa subliminar. Estávamos perto do meu aniversário, talvez as duas estivessem combinando uma festa surpresa para mim, assim juntando três coisas que eu evito. Aniversários, surpresas e festas.
Começou a chover. Chover mais do que o esperado para uma terça-feira. Uma chuva que nos deixaria encharcados apenas com os oito passos entre o carro e a padaria.
- Chegamos, acho que devíamos pedir um bolo hoje. - Hoje? Terça-feira? Ok. Mas não quer esperar um pouco ver se essa chuva não… Ei! - Ela saiu do carro.
Ao entrar na padaria com o cabelo pingando, percebo que ela está rindo enquanto sacode o cabelo.
- A gente vai passar o dia encharcados até os ossos, você sempre tem um guarda-chuva. - E eu trouxe, esta no carro. Não me olhe assim. Uns seis anos atrás você não reclamaria de tomar um pouco de chuva comigo. - Eu não estou reclamando. Só não estou entendendo esse bom humor todo.
Ela sorriu e andou até o balcão para fazer os pedidos. Eu me sentei no lugar de sempre. O comum para uma terça-feira.
- Hum. - O que foi? - Nada. - Cade a caixa? - O presente? Deixamos no carro, ué. - É que eu queria… Tem razão.
E nossa comida chegou. Duas canecas de café e três pedaços de bolo. Os talheres e as asas da canecas estavam todos enrolados em uma fita azul.
- Hum. - O que foi? - Três? Se estava com tanta fome você podia pegar do meu, eu não gosto muito de doce, você sabe. - Ah! Eu vou comer esses dois e vou pegar do seu também, não se preocupe. - E essas fitas azuis? - Ah… Acho que é por causa do novembro azul, ou algo assim.
Enquanto eu bebia O Líquido Preto da Manhã e brincava com a fita azul entre os dedos, observei ela se lambuzar de glacê às sete e meia. As vezes eu me esqueço o quão sortudo eu sou, mas volto a realidade nesses momentos. Me peguei sorrindo para a chuva enquanto a espiava lambendo os dedos com o canto do olho.
- Vamos.
Ela se levantou e saiu da padaria direto para a chuva. Enquanto eu estava no caixa, olhei pela janela e a vi em pé encostada no carro, de braços cruzados olhando para o chão debaixo de uma chuva torrencial. Sai correndo da padaria, tenho certeza que tinha troco para aquela nota, mas tudo bem.
- Ei! Entra no carro, tá ficando doida? - Vem aqui. - Na chuva? Vem aqui você no coberto. Você ta bem? Amor?
Aquela chuva estava realmente gelada, teria que voltar para casa e tomar outro banho ou ficaria doente. Ela estava fazendo aquilo de propósito, mas qual seria o motivo?
- Ei. - Abre. - E me entregou o “presente” da amiga do trabalho. - Então a senhorita andou me enganando. Eu não gosto muito de surpresas. - Você vai se arrepender em um minuto. Abre logo.
O sorriso dela era contagiante. Desfiz o grande laço, que por acaso era azul. Dentro da caixa, grande demais para o conteúdo, apenas um papel e uma outra caixa menor. O papel estava enrolado em uma fita azul.
Dentro do papel de carta enrolado e decorado, apenas a palavra “parabéns” em letras garrafais. E um pedaço amarrotado de papel, amassado e rasgado, onde se podia ler com dificuldade “HCG… POSITIVO”. Derrubei o papel na chuva. Minhas mãos tremiam um pouco.
Ainda faltava a caixinha menor.
Abri com dificuldade devido ao adesivo que a selava. Dentro dela, um par de sapatinhos minúsculo, ocupavam ⅔ da palma da mão. Segurei os sapatinhos contra o peito. Apertei o mais forte possível enquanto meus olhos se aqueciam em lágrimas. Não consegui falar nada por alguns minutos. O abraço dela me manteve em pé, e não era a primeira vez que isso acontecia.
Quando finalmente consegui falar algo, me desvencilhei de seu abraço e disse:
- Então sua amiga vai ter um filho? Uma pena que eu molhei o presente de… AI! Para, não na costela não. - E a peguei em meus braços. - O nosso primeiro. - Espero que ele puxe o seu soco.
E esse foi o resumo de como àquela terça-feira foi o dia mais feliz da minha vida. Que foi substituído por outra terça-feira chuvosa, seis meses depois.
Nesse meio tempo, contemplei tudo diante de mim. Todas as gargalhadas altas demais, os gols feitos em uma quadra vazia, os livros que li e escrevi, as histórias pelas quais me apaixonei e as próprias paixões que me tiraram o sono durante minha vida. Tudo que eu era não era mais “meu”. Era nosso. Eu era O Pai Dele, e Ele nem me conhecia ainda. Eu já o amava mais do que eu podia imaginar ser possível.
Tentei imaginar qual seria sua primeira palavra, o quão vacilante seriam seus primeiros passos e como seria sentir que ele não está mais ao meu lado e sim ao meu redor. Como seria difícil meu primeiro dia longe dele e como ele lidaria com as outras crianças no seu primeiro dia na escola.
Todos esses pensamentos e devaneios. Tudo me levou a ser exatamente quem eu sou. Um cara em pé no meio da cozinha, com uma caneca em mãos e um sorriso no rosto, enquanto observa a mulher que o fez fazer as pazes com a vida escolher um papel de parede em um catalogo qualquer.
- E qual vai ser o nome dele? - As coisas importantes eu deixo você escolher sempre. Mas não fique mal acostumada. Hoje eu dirijo.
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“Eu lembro que você vivia em conflito. Usando sua influência da forma errada. Às vezes eu fazia o mesmo. Abusando de meu poder, cheio de ressentimento. Ressentimento que virou uma depressão profunda. Me vi gritando em um quarto de hotel. Eu não queria me autodestruir.”
Como uma borboleta da qual só as cores importam, a lembrança dos olhos não me fogem. Porém todo o resto está borrado.
Um cheiro familiar no meio da multidão onde não existe um conhecido. Todos estão perdidos, agindo automaticamente para chegar a mais um dever que não deve.
Sempre atrasados para a próxima parte de um ciclo que não se enxerga o fim. Mas os olhos não me fogem.
Andando pelo mesmo caminho, trilhando o concreto na memória sem notar para onde está indo. A lembrança do toque me acorda, mas não consigo imaginar os detalhes. Os olhos, eles estão claros como nunca.
Um cigano parado no meio do caminho, observando todos andarem sem rumo, procurando a origem do cheiro familiar, talvez ele me leve ao olhar, junto dos cabelos que consigo descrever com detalhes mas não consigo montá-los dentro da minha cabeça.
Sigo o cheiro ou sigo meu caminho?
Não existem garantias de encontrar os olhos.
O ressentimento vai me manter na linha?
Vamos perder tudo que gostamos em nós mesmos seguindo pelo caminho para chegar em lugar nenhum.
Um dia que seja. Siga o cheiro. E tem que ser logo. Os olhos estão começando a parecer anuviados na memória. Assim quando vê-los, não vamos reconhecer.
Os olhos não podem fugir. Mantenha sua âncora que o mantém na realidade por perto. De vez em quando lembre que está vivo.
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A dor atravessava a lateral de sua cabeça como uma faca que lentamente achava caminhos para dentro de seu crânio, sua mão suava frio e tremia levemente. A dor o fazia apertar os olhos e ranger os dentes, mas faltavam apenas cinco quadras.
A dor era inconstante, ia e vinha de forma independente, como se tivesse vontade própria. Um passo mais perto cruzando uma rua familiar, mas não muito. Podia estar na direção errada, mais quatro quadras e descobriria.
Mais uma crise.
Escorria uma gota fria de suor pelas suas costas, diminuiu o passo e apertou os olhos, seus joelhos quase cederam dessa vez. Prendeu a respiração pelos segundos que a dor persistiu, e respirou fundo quando cessou.
Duas longas quadras agora.
Andava tentando parecer normal, como se não estivesse apenas aguardando a próxima pontada. Amenizar sua demonstração de dor era tão exaustivo que seus músculos, tensos por alguns minutos agora, já demonstravam fadiga.
Nada de bom ou ruim que fizera não importava agora, tudo se resumia a próxima oscilação da dor e quantas vezes ele a teria que suportar por mais uma quadra. Olhava para um ponto fixo no horizonte fingindo enxergar.
Mas na última quadra a dor não veio. Desapareceu, como um soluço. Mais alguns passos e chegou ao destino, finalmente. Olhou para trás e não conseguiu achar a dor, ela o tinha abandonado.
Minutos depois ele sentiu falta de sentir.
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E finalmente se sentou. Seus hematomas doíam mais expostos ao frio do ar-condicionado, o sangue já seco em sua narina deixava a respiração um pouco mais pesada que o normal. Voltando sozinho no metrô por volta das cinco da manhã de um domingo depois de ter tomado alguns socos era um pouco pior do que esperava.
– O caminho de volta sempre faz eu me arrepender de ter ido. E hoje então…
Depois de se arrepender amargamente de suas decisões das últimas 8 horas, procurou pelos fones de ouvido em seu bolso. Com seus sentidos ainda confusos pelo álcool, demorou uma estação para achar, e mais duas para desenrolá-lo. Seu celular tinha sete por cento de bateria e mais de uma hora de viagem para aguentar. “Não custa tentar”. Ao colocar sua playlist no aleatório, olhou para seu reflexo na janela do vagão. Aquela camiseta alargada pela força bruta era um presente de alguém especial, mas agora parecia apenas um pijama velho de guerra. Tirar satisfação com o grupo de jovens que assediou sua “ex-amiga” na festa enquanto estava bêbado parecia uma boa ideia, a coisa certa a se fazer.
Não foi uma boa ideia.
Mais uma estação, duas pessoas entraram dessa vez. Um homem com uma mochila e vestes sociais, mas não pareciam extravagantes, na verdade tinham um jeito de uniforme. Sentou-se em um canto afastado do vagão, provavelmente remoendo o seu dia complicado. “Um porteiro de um prédio, talvez?” pensou. Pela porta contraria a segunda pessoa entrou, uma garota. Sentou-se ao seu lado. Não conseguia olhar para o lado pois seu pescoço também doía, fazia força para sua respiração parecer a de um ser humano normal. Percebeu pelo reflexo da janela que estava encarando mais cedo que aquela menina tinha cabelos loiros e curtos, era magra e suas roupas estavam largas para seu corpo, e também parecia levemente bêbada.
“Está voltando sozinha do centro também, mais quatro pessoas como nós e fechamos uma semana inteira de dias difíceis”. Enquanto sorria da própria ideia, percebeu que estava sendo observado. Quando lembrou que estava com hematomas em toda sua pele visível, então seu sorriso desapareceu.
Por mais três estações não tirou os olhos da garota, “esta caindo de sono”, pensou, e ela caiu mesmo. Sua cabeça apoiou gentilmente no ombro dele, como se a ideia desde o começo fosse adormecer bem ali. O garoto viu tudo pelo reflexo da janela, desde o momento em que ela fechou os olhos, até quando ela pendeu propositalmente a cabeça para o seu lado. Poderia estar bêbado ao ponto de julgar mal o que viu? Foi então que sentiu algo novo. Algo diferente de tudo que já tinha sentido. Se sentiu cheio. Cheio não era a palavra. Olhando para o reflexo de si mesmo e da desconhecida, ele sentiu sua própria alma.
Tentou manter sua respiração amena, o sol estava nascendo atrás deles, borrando o céu com um tom rosa e deixando mais difícil de se ver através da janela. Concentrou toda sua atenção para aquele reflexo, fez o possível para decorar tudo sobre aquele momento. Ouvia suas músicas enquanto seu olhar estava perdido no reflexo do rosto da garota, pegou o celular com todo cuidado que podia e digitou um pensamento que lhe ocorreu: “Minha preferência musical é o seu rosto”. Não sabia o porque, mas achava que gostaria de lembrar desse pensamento mais tarde.
Agora faltavam apenas mais duas estações, respirou fundo. A ideia de acordá-la começava a afastar aquilo tudo que estava sentindo, e a bateria do celular finalmente acabou. Agora só falta uma estação, mas antes que pudesse falar algo, ela acordou. Se espreguiçou abertamente fazendo ruídos engraçados. “Só mais uns segundos agora.”
– Se estivesse sem o fone eu perguntaria seu nome.
Ele se desequilibrou enquanto tentava levantar. Tirou os fones de forma brusca. Sua orelha ardeu um pouco.
– Eu não estou ouvindo nada neles agora.
– Oh, bom dia.
Ele olhou para o lado de fora, já conseguia ver a plataforma da estação se aproximando.
– Ahn, eu desço aqui.
– Não tem problema. - Ela sorriu de um jeito que o desarmou completamente. Sentia que ficar parado na frente dela por aqueles últimos segundos o faziam parecer tão idiota quanto aquela roupa estava fazendo.
As portas finalmente se abriram. Ele deu um último sorriso que não parecia ter saído corretamente, e se encaminhou para a porta.
– Peraí. - Ela disse enquanto ficava de pé, ele se virou para ela ainda vestindo aquele sorriso meio maníaco que ele conseguiu forjar de último instante. - Você tem um gosto musical peculiar, sabia?
Seu coração deu um salto tão abrupto que chegou a doer um pouco em suas costelas trincadas, ela parecia sorrir com os olhos. “Ela viu.” Será que ainda estava bêbado a ponto de julgar mal aquilo? A porta fechou às suas costas, ela sorriu.
E assim começava o melhor dia da sua vida, até então.
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Eu sou muito velho para ser adolescente e muito novo para ser adulto. Tecnicamente sou um adulto, mas me sinto assim com alguma intermitência. De tempos em tempos eu sinto que estou velho ou novo demais para fazer certas coisas. Sempre colocar amaciante na roupa no momento certo e administrar meu fim de semana de forma que eu consiga jogar o máximo de horas possível são bons exemplos dos dois casos. Imaginar histórias malucas para não ficar entediado e enlouquecer com a vida de adulto é quase obrigatório para mim. Uma vez eu deixei a janela do quarto aberta e fui trabalhar. É claro que choveu absurdamente naquele dia e molhou minha cama. Imaginei que algum mago rival tinha mandado um pequeno tufão para dentro do meu quarto e gritei mentalmente: “MALDITO BELFELORD”. Faz parte da minha loucura para me manter saudável. Parte da vida de adulto é conseguir dosar todas as partes da sua vida de forma que suas amizades continuem próximas, sua família saiba da sua vida, seu trabalho continue em dia e que seus estudos continuem sendo procrastinados. Bom, pelo menos pra mim. As pequenas satisfações que você normalmente tem quando é criança / adolescente mudam drasticamente ali pelos vinte anos. O passeio da escola para algum parque temático no qual eu não iria em nenhum brinquedo me satisfaria incrivelmente. O mesmo tipo de satisfação de quando eu consigo dormir oito horas seguidas em um dia de semana atualmente. A empolgação de um lançamento de algum entretenimento que eu gosto é quase igual a de finalmente ver algum amigo e fazer a manutenção daquele laço. Será que os adultos que me cercaram a vida inteira também eram ou são assim? Adolescentes que passaram a dar valor a outras coisas e não viram a responsabilidade chegar, até ela destruir seu sonho de viajar para Jundiaí de bicicleta? Quando eu for adulto eu vou fazer muitas coisas legais. Eu sou adulto e não sei quando isso aconteceu. Eu não me sinto tão diferente. É meio decepcionante para o Eu mais novo, mas nem é tão ruim para o Eu mais velho. Na verdade eu gostaria de nunca ficar um adulto completo, sério demais que pensa sobre a politica e como isso afeta as minhas aplicações na bolsa e sobre minhas vindouras férias nas quais eu poderei finalmente terminar a bibliografia completa de José Saramago. Não, quero continuar pensando um pouco sobre esse tipo de coisa e um pouco sobre o Background do mago necromante Belfelord e como essa atualização do MOBA que eu jogo esta pesada. Pensei que na vida adulta eu estaria no controle sobre mim mesmo, mas eu distribui errado meus pontos de habilidade.
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Parecia alto demais, aquela cadeira tinha poucos pontos de apoio possíveis para a escalada, mas não seria um feito inédito se o conseguisse. Parou para analisar suas opções que pareciam escassas e achou um bolso na perna direita que parecia firme para apoiar o pé, era só dar o primeiro impulso e segurar com força na camisa que o resto iria se resolver. Ao perceber o esforço descomunal, seu avô o ajudou pegando-o pelas axilas e o aninhando em seu colo.
Acho que vai dar tudo certo, os primeiros três meses são sempre conturbados. - ele parecia não ter perdido o fio da conversa.
Seu avô era uma pessoa centrada e séria, sua conversa com a esposa já atingirá mais de uma hora e o garoto estava impaciente.
O menino estava ansioso pois era seu primeiro dia na escola. O avô o levaria mas parecia estar conversando há anos um assunto sério demais para interromper, então o neto começou a treinar sua leitura básica recém aprendida para ler as informações do rótulo da maionese, assim evitando contato visual com seus avós para não parecer que estava bisbilhotando.
Ela estava tão pálida bêm, vamos para lá de tarde? Eu quero saber o que está acontecendo. - O rótulo dizia algo sobre “colestrol”, soava como um nome de remédio para o nariz.
Calma, vamos almoçar e levar ele para escolinha, depois a gente vai para lá. Não adianta ficar nervosa, o que tiver que ser vai acontecer. - Tinham algumas receitas de patê que pareciam gostosas, se tirasse aquele coentro seria ainda melhor.
Depois de comer um omelete com batatas começaram sua pequena jornada para a misteriosa escola, o neto sobre os ombros do avô por boa parte do caminho. Perto de onde moravam havia uma praça onde uma mulher cantava algo que soava muito melancólico. As pessoas acumulavam-se ao seu redor com a respiração pesada, algo naquela música despertava um sentimento esquisito no menino, sentia falta de algo que não existia.
Todos olhavam hipnotizados para a mulher de cabelos cacheados da cor de mel que transbordava a praça com sua voz doce e leve. Por um momento a criança esqueceu da ansiedade, das conversas estranhas dos seus avós e das receitas de maionese. Nunca antes uma música o fizera sentir tão estranho. Queria chorar, mas se segurava para não o fazer na frente do seu avô.
E então, de repente como um vento refrescante, a canção chegou ao fim. O garoto se apressou a bater palmas entusiasmadas, completamente fora de tom com a música. As pessoas o seguiram aos poucos. A musicista o olhou e deu um risinho.
Bati palma cedo? Tinha mais? - O menino parecia envergonhado, a pequena multidão sorria.
Não, foi o primeiro a entender que acabou. - A mulher era muito bonita, tinha um ar materno quase familiar. - Bença tio.
Ela estava se dirigindo ao avô, o menino demorou um pouco para entender o que estava acontecendo, nunca tinha visto aquela mulher.
Deus te abençoe Isabel, você melhorou muito nesse violão, ein?
Eu tento, e como vai a…?
O avô balançou a cabeça negativamente com rapidez, Isabel se calou imediatamente.
Me espere na minha casa e conversamos sobre isso, não vou demorar.
Seu neto sentiu um clima anormal na conversa, enquanto observava os brincos da musicista se enrolando levemente em seu cabelo, sua camiseta tinha um desenho familiar que passava na tv, e suas calças rasgadas a faziam parecer como uma adolescente de vinte e poucos anos.
Isabel começou a guardar seu violão enquanto cantarolava a melodia da canção finalizada a pouco tempo, enquanto o garoto e seu avô seguiram seu caminho. O resto do caminho foi sonorizado pelos carros das ruas e o garoto a cantarolar a música aprendida enquanto mexia na careca parcial de seu avô.
A escola ficava ao lado de um campinho de futebol, onde não existia grama e sim uma areia vermelha. Alguns homens corriam em círculos se aquecendo para um treino quase silencioso. O menino olhou para seu uniforme branco e para o resíduo de areia vermelha que se espalhava por toda a rua, percebeu que um conjunto de uniforme seria pouco e sua mãe certamente o chamaria de porquinho.
Ao finalmente chegar na entrada da escola percebeu algo estranho nas crianças que seriam seus colegas dali em diante. Quase todas elas estavam chorando de forma escandalosa. Com isso a expectativa da escola começava a se manchar com a realidade dura de conviver com outras crianças. O garoto pensava que gostaria de novos amigos, mas aquelas crianças gostavam de chorar, e ele não gostava de choro. Desceu dos ombros do avô e ficou olhando estarrecido para as crianças que pareciam estar com medo de passar pelos portões coloridos da escola.
Vô? Por que eles estão chorando? Eles vão bater na gente? - O garoto percebeu um erro nos desenhos representados no portão, onde a Mônica corria atrás do Cascão brandindo um ursinho azul. O menino franziu as sobrancelhas, confuso.
Bater? Claro que não, ninguém mais faz isso nas escolas. Não sei porque estão chorando. Eles vão passar o dia brincando. Estão chorando porque são chorões. - O avô sorriu de canto de boca. Quando seus olhos se encontraram com os de seu neto ele sentiu a confusão do garoto, o medo do desconhecido.
Estou brincando. - E então ele se ajoelhou ao lado do garoto. - Eles estão acostumados a ficar com os pais, tios, avós ou seja lá quem for. É só medo de saudades. Saudades é natural, você sabe disso, faz parte.
Aham… Tomara que eles parem de chorar. Tchau vô.
O garoto pegou a lancheira das mãos do homem e caminhou entre as crianças escandalosas para dentro dos portões, pintados por alguém que tinha pouco conhecimento sobre o bairro do limoeiro.
A tarde na escolinha passava rápida demais, depois de pouco tempo as crianças pararam de chorar esquecendo completamente o motivo para aquilo, começaram a conversar entre si de forma tímida. Aos poucos um murmúrio coletivo passou para um barulho de show de rock, as possibilidades de brincadeiras eram infinitas, mas o garoto se mantinha quieto tentando entender o que a professora dizia. Ele não se conectava tão fácil e rapidamente com as pessoas, crianças ou adultos.
Gente, olha, em cima da mesa não… EI! Não, não, não, essa tesoura não é brinquedo, a gente vai usar só na hora de fazer a… Para de puxar o cabelo dela, Cleber? É, você mesmo, é Cleber, não é? Calma gente deixa eu falar uma coisa… - A professora parecia perdida, suas orientações se afogando num pequeno mar de crianças que tinham acabado de se conhecer.
Olhando a sua volta o garoto percebeu que alguns meninos brincavam com bonecos, coisa que ele se interessava. Mas, quando parou para olhar com atenção percebeu que as crianças estavam o fazendo de maneira desorganizada, brandindo um boneco vestido de bombeiro contra um super herói genérico, como se os dois voassem.
VRUUUM, CHIIIIIIIIiiiiii… PUM, OH NÃO, VOCÊ NOVAMENTE? NÃO VOU DEIXAR ISSO ACONTECER! - O menino sentia que não iria se divertir com eles dessa forma.
Foi até uma estante que ficava do lado de uns cartazes que relacionavam as letras do alfabeto com animais, até mesmo o W, embaixo escrito “windows”, um animal do qual nunca tinha ouvido falar. A estante de onde saíram todos os outros brinquedos estava praticamente vazia, alguns carrinhos quebrados e uns livros sobravam rejeitados em algumas prateleiras. Quando começou a mexer na pilha de livros, o segundo que achou foi uma revista para colorir, quando o abriu encontrou alguns dinossauros.
Oi? Tem lápis de cor? - A professora parecia não ter notado que ele estava falando com ela. - OI?.
Ahn? Oi, não sobrou brinquedos pra você? Qual você queria?
Não, tudo bem, mas e lápis de cor…?
Claro, dentro da gaveta aqui… Sabe mexer com o apontador? Ah, então pode ir lá.
O garoto passou o resto da tarde pintando o melhor que pôde aquelas figuras jurássicas. Quando o sol tocou o horizonte, as luzes do campinho se acenderam, isso era o sinal que o dia de escola tinha chegado ao fim. Na saída, com uma maçã na mão, o garoto tentava enxergar por cima das cabeças das outras crianças para achar o seu avô. Depois de alguns segundos encontrou o senhor na grade do campinho, observando o treino.
Não vai comer a maçã?- O homem disse sem tirar os olhos do campo.
Não gosto de maçã. - O garoto abriu a lancheira e colocou a fruta com cuidado do lado das cascas de pão.
Hum.
O caminho de volta foi melancólico, parecia que dessa vez nem os carros faziam barulho, o menino sentia que não devia cantarolar dessa vez.
Ao abrir a porta da sala deu de cara com Isabel, bebendo um café e conversando baixo com a avó. Ao vê-lo, a musicista deu um meio sorriso triste, parecido com o primeiro mas num outro tom.
Fica com ele um pouco, Isabel? Deixa eu conversar um pouco com o bêm.
Sem problemas tia. - A musicista se virou para o garoto. - Ei, quer ver meu violão? Ta ali no quarto, vem.
Ao passarem pelo corredor o garoto notou a porta da sua mãe fechada, o que era estranho pois ela estava viajando.
Entraram no quarto do garoto, Isabel fechou a porta atrás deles.
Como foi na escolinha?
Não sei, não gostei muito das crianças.
Eu também não gostava das crianças da escola. Você sabe onde está sua mãe?
Viajando.
Isabel se sentou na cama e começou a dedilhar o violão emitindo um som muito baixo.
Na verdade ela estava no hospital, ela passou mal.
É? - Tudo que estava estranho parecia fazer um pouco mais de sentido. - Ela está bem? Quando ela volta?
Ela já voltou, está no quarto dela, mas você tem que deixar ela quietinha hoje para melhorar.
O garoto se sentou do lado dela, tirou os tênis, colocou os joelhos embaixo do queixo e os abraçou olhando para os adesivos na parede sem pensar em nada em especial. Pensou que talvez fosse um bom motivo para chorar.
Depois de alguns minutos, Isabel quebrou o silêncio.
Você quer um irmão?
Não, crianças são chatas.
Mas você não se sente sozinho?
Às vezes, mas passa.
Isabel sorriu novamente, saía dela um fio de tristeza que aquecia o quarto.
Sua mãe queria que você tivesse um irmãozinho, mas não deu certo.
Amanhã eu falo pra ela que não tem problema.
Sabe, se seu problema é criança, eu posso ser sua irmã de consideração. Eu já sou meio que sua prima, mas finge que não.
Tudo bem.
O garoto sentia algo incomodar sua garganta, o fundo dos seus olhos ardia um pouco.
Minha mãe não quer me ver hoje porque eu não queria um irmão?
Não é nada disso, existem muitas pessoas boas. Você é uma pessoa boa, sua mãe é uma pessoa boa. - A musicista tirou o violão do colo e puxou a cabeça do menino para ele deitar em seu lugar. - Mas duas coisas boas não ficam boas juntas… Entende?
Não entendi nada.
Isabel soltou uma risada. A tensão da casa parecia pesada até para ela. Do lado de fora da casa, o garoto ouviu o gato miar, provavelmente procurando algum outro gato para brincar.
As pessoas precisam ficar sozinhas as vezes, aposto que você gosta de ficar sozinho.
Eu gosto.
Então, puxou sua mãe. Ela não ta brava com você, ela só está tentando ficar bem.
Será que ela quer patê? Eu aprendi hoje e… - Finalmente começou a chorar, não conseguia controlar, enxugava os olhos nervosamente enquanto as palavras saíam bambas da garganta. - Ela deve estar com fome, eu trouxe maçã...
Calma, tudo bem. - Isabel brincava com os cabelos negros do garoto, um cafuné esquisito. - Vamos fazer um patê irmãozinho.
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E se tudo der errado?
Na faculdade existem professores que todos gostam (normalmente pelos motivos errados), que todos odeiam e aqueles que são neutros na opinião pública da galera. Em qualquer curso ou escola existe isso.
De qualquer forma, uma dessas professoras do terceiro tipo e eu conversamos por uma hora sobre a vida, o universo, e tudo mais em uma sala praticamente vazia. Acontece que eu descobri que ela é uma pessoa muito diferente da imagem que eu tinha gerado automaticamente na minha cabeça.
Contei alguns dos meus medos acadêmicos e profissionais, e ela me aconselhou do melhor jeito que conseguiu. Em algum momento da conversa perguntei: “e se tudo der errado?”. Ela disse que tudo já deu errado.
Se tudo der errado em 5 anos eu vou estar exatamente onde e como eu estou hoje. O fracasso é relativo e a síndrome do impostor está aí pra todo mundo sentir um pouco.
Provavelmente todo mundo se sente assim, como o nosso meio estivesse errado. A justiça deu errado, então tatuamos a testa de um menor de idade por uma tentativa de furto. O futebol deu errado, então nos concentramos em frente ao centro de treinamento esperando alguém sair para poder bater em alguma coisa. O namoro deu errado, então a gente… Você entendeu meu ponto.
Nada dá o resultado esperado (desconsiderando a lei de Newton). Tudo está errado e quebrado se pensar bem, somos naturalmente insatisfeitos.
Definindo prioridades a pergunta não é “e se tudo der errado?”, e sim “do que eu desisto e o que eu conserto?”
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Depois de assistir algumas coisas sobre paternidade e tudo mais eu me perguntei se realmente quero ter filhos, se realmente quero ser pai. É uma coisa que eu sempre quis, desde que eu me lembro eu penso que gostaria de ser um bom pai, e como meus filhos seriam. Um pensamento levemente feminino, admito.
Bom, depois de um tempo pensando bastante sobre isso eu descobri algo sobre mim. Talvez eu não queira de verdade. Talvez isso seja apenas olhar para o mundo e projetar em mim os sonhos de outras pessoas.
Existem 3 pontos fortes de indecisão, ter um filho, adotar um filho ou não ser pai. Admito que a opção mais próxima de um win/win seria adotar uma criança. Atitude altruísta e linda, concordo, mas o egoísmo ainda coça um pouco, sabe? Pra mim ter um filho tem um pouco de relação sobre ser uma continuação de você mesmo, e isso faz parecer a experiência da adoção incompleta. Eu sei o quanto isso parece mesquinho.
Se eu não tiver um filho eu posso me sentir sem propósito em algum momento, algumas pessoas sentem isso em uma idade. Mas se eu tiver um filho eu vou estar obrigando alguém a existir, por conta do meu desejo e só por isso, em um mundo que eu ainda nem sei se vale a pena estar com 50% do que eu sou, defeitos e qualidades. Não parece muito justo, eu diria.
Eu queria tanto ter certeza, pelo menos nesse assunto, sobre o que eu quero. Pelo menos nisso…
Espero saber disso antes que seja tarde para tomar uma decisão. Se eu decidir que não quero essa responsabilidade, eu não vou precisar mudar muito do que eu já sou. Se eu decidir que eu quero, eu vou ser um ótimo pai, posso te prometer isso.
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Em algum momento entre 2009 e 2011 uma professora pediu para fazermos um exercício prático, colocaríamos os nomes de todas as pessoas da sala e diríamos as qualidades que mais apreciamos nessa pessoa. Alguma menina de um outro grupo de pessoas que não o meu tirou o meu nome do saco cinza com um cordão. Ela não tinha nada a dizer sobre mim, tínhamos conversado uma quantidade de vezes que cabia em uma mão em todos aqueles anos.
Acontece que ela disse que eu sou um bom amigo, e que essa é minha qualidade que ela mais gostava. Não inteligente, não bonito, não engraçado, mas um bom amigo. Por muito tempo considerei isso algo ruim. “A minha qualidade mais aparente e forte é a amizade?
O que isso quer dizer exatamente?”
A professora, que devia ser de sociologia ou filosofia, que é exatamente o tipo de professora da qual você espera esse tipo de dinâmica de grupo, falou que isso é uma qualidade e tanto. Acho que ela estava tentando me animar devido a cara de derrota que eu fiz.
Mas, anos depois, descobri que isso é realmente uma qualidade e tanto. Amizade é uma das poucas coisas que pesam na resposta da pergunta “sua vida valeu a pena?”. Outro exemplo de peso para essa resposta é sua quantidade de horas jogando joguinhos eletrônicos, obviamente.
A amizade é com certeza uma das coisas mais importantes da vida. A amizade é construída, como qualquer relação humana, mutuamente.
Saber qual amizade é verdadeira está implícito no manual básico da vida, não é uma coisa que sua você é ensinado desde pequeno. Sua mãe provavelmente te ensinou a desconfiar de tudo e de todos pois o mundo é cruel e tudo mais.
Em algum momento as pessoas acham que o grupo delas é o melhor possível, e que não restam pessoas legais para se conhecer. Ou o contrário, que ela não tem amigos e que não EXISTEM pessoas legais pra se conhecer. As duas possibilidades estão erradas.
Existem milhares de pessoas que você ainda não conheceu, algumas delas vão ser um desperdício de esforço e tempo, mas as outras vão valer a pena.
Quando se muda da escola (ensino fundamental e médio) para a faculdade, você mantém pouquíssimos amigos, e faz muitos outros. Depois você vai trabalhar e conhece mais gente, depois você se muda e conhece mais e etc.
O sentimento mútuo de preocupação sem a obrigação para tal. Simplesmente gostar de gastar seu tempo com uma pessoa. Isso é o que um amigo faz, e amigos existem para todo mundo.
Don't you worry child.
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Os minutos se passaram e o céu continuava incrível. O sol tinha acabado de desaparecer no horizonte mas as cores engraçadas ainda raiavam de onde ele tinha desaparecido. Os dois garotos se mantinham sentados na grama fitando o mesmo ponto colorido no horizonte, compartilhando os fones de ouvido.
O céu estava ficando escuro aos poucos, um poco a direita de onde olhavam a lua aparecia, mais redonda, branca e grande do que de costume. Algumas estrelas acompanhavam. Normalmente não se viam estrelas na cidade, mas nesse dia em especial elas resolveram aparecer. O céu parecia ter uma lampada maior que o de costume em uma parede negra com sardas.
O silencio já prevalecia no ar fazia alguns minutos, a garota parecia inquieta com isso enquanto ele parecia bem e confortável. Ela gostava de falar, e ele sabia disso. Estava em silencio em parte porque gostava, em parte para brincar com a cabeça dela.
- O que acha da lua?- Ela não se aguentou dentro de si, precisava falar, e precisava conhece-lo melhor.
- Acho misteriosa, o que será que tem nela?
- Dizem que é feita de queijo.
- Dizem? - Ele agora sorria, nunca tinha ouvido falar disso. - Quem te disse isso?
- Ahn.. Meu pai disse, quando eu era pequena. - Levantou os olhos para a lua novamente, parecia distraída com um sorriso no canto do lábio. - Onde esta sua mãe?
- Eu não sei, não a vejo desde que tinha 8 anos. - Ele pausou a musica por um momento, a playlist já estava no segundo loop. - Onde esta seu pai?
- Ele faleceu... Ele era policial, todo dia eu o esperava na escada do nosso prédio, olhando para a lua para abstrair o tempo que demorava. Quando ele chegava a gente ficava mais um tempo olhando para o céu. Ele sempre dizia que a lua é do tamanho do nosso dedão, e que ele chegaria em casa antes dela andar o suficiente no céu para sair de dentro do meu dedão. Só que um dia ele não chegou antes disso, só recebemos noticias dele pela manhã... - Ela então levantou seu polegar em direção ao céu e cobriu a lua com ele enquanto fechava um dos olhos.
O garoto observou aquilo com um gole de tristeza em sua garganta, e fez o mesmo. Novamente os dois estavam em silencio, mas mais confortáveis do que nunca. e permaneceram assim até a lua sair de dentro dos seus polegares.
Quando finalmente aconteceu, os dois baixaram suas mãos em direção a grama e se tocaram levemente. Rapidamente recolheram as mãos para si.
- Minha mãe, ela sempre amou o pôr-do-sol, então sempre que eu lembro disso eu paro para ver... Por isso eu vim aqui hoje, acho que na esperança de estar olhando para a mesma coisa que ela no mesmo momento... Ouvindo as musicas que ela cantava para mim quando era pequeno. Me faz sentir algo como a presença dela, ou algo próximo o suficiente.
Ela olhou para o horizonte onde o sol tinha desaparecido, seus joelhos levantados, braços entrelaçados cobre eles e a cabeça apoiada neles. Ele novamente voltou a cobrir a lua com seu dedão. Os dois perdidos dentro de pensamentos.
- Seus amigos foram embora, você percebeu? - Perguntou ele com um dos olhos ainda fechados.
- Percebi.
- Acho que esta ficando tarde, melhor irmos embora.
- É... Você vai para o metro? - Ela pareceu um pouco preocupada.
- Sim, e você? - Ele se levantou e limpou os fundos das calças com alguns tapas, logo depois estendeu a mão para ela.
- Vou pegar um táxi, eu moro perto.
Os dois desceram a colina do parque pôr-do-sol enquanto a garota comentava sobre a ótima sorveteria que tinha ali perto. E como adoraria ir ao aquário municipal. "Eles tem pinguins lá" ela dizia. Ele ficou em silencio boa parte do caminho, concordando periodicamente. Gostava de ouvi-lá falar, sua voz o fazia esquecer.
Finalmente chegaram ao portão do parque, um ponto de táxis do lado indicava que a noite tinha acabado.
- Então... Tchau?
- Tchau. - Ele virou as costas e começou a se afastar.
Ela estava um pouco decepcionada, pensou que aquilo foi algo mais que uma conversa casual. Quando ela pegou na maçaneta do táxi teve um pequeno surto. "Desgraçado". Virou-se e correu para ele.
- Hey! HEY!
- Oi? - Ele já estava de novo com seus fones de ouvido, parecia estar se divertindo com a situação.
- Você não me disse seu nome nem nada.
- É, eu não disse mesmo.
- Não vai dizer? - Ela começou a ficar irritada, sabia que ele estava implicando com ela.
- Hoje não. - Ele sorria para ela, a testa franzida que ela estava fazendo o fazia sorrir quase involuntariamente.
- Então a gente vai se ver de novo? - O taxista buzinou ao longe, ela fez um sinal brusco para ele esperar um pouco e se virou para o garoto aguardando sua resposta.
- A gente se encontra em algum pôr-do-sol. Ou talvez eu te espere um pouco e a gente se encontra embaixo de uma lua dessas.
- Quando?
- Sempre.
Deu um ultimo sorriso e virou as costas. Sabia que ela vinha ao parque regularmente, e agora ele certamente também o faria. Colocou seu fone novamente enquanto andava para a estação. Olhou para a lua logo acima dele, e a cobriu com o dedão enquanto fechava um olho e sorria.
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O dia estava cinza como de costume. As pessoas se amontoavam para poder chegar aos seus destinos. A faculdade, o trabalho ou onde seja. Mas ele só queria passar. Estava com a cabeça cheia demais e não estava ligando para tudo que estava acontecendo à sua volta. Estava simplesmente levando seus pensamentos para uma volta na cidade.
Talvez ver pessoas de todos os tipos o fizessem sentir menos sozinho, mas não foi o caso. Seu celular não parava de vibrar e a playlist estava acabando, isso estava começando a deixá-lo nervoso, tinha que dar tempo. O centro da cidade era igual independente do dia, era cheio e barulhento, às vezes mais às vezes menos, mas sempre parecia cheio e barulhento.
Olhou em volta à procura de uma placa que indicasse o caminho certo, mas viu que estava realmente perdido. Por algum motivo, estar perdido era como ele queria estar no momento, apesar daquele lugar ser familiar. O parque estava perto, podia-se sentir a densidade da poluição diminuir.
Ao virar na rua certa avistou árvores ao longe. Finalmente. Apertou um pouco o passo ansiosamente sem perceber. Seu rosto estampava expectativa como se tivesse achado um baú destrancado enterrado sob um X. Ao passar das quadras ficava mais fácil de andar, ali não era tão cheio e barulhento.
Parou de frente á entrada do parque, uma placa dizia “ Parque pôr-do-sol”. Olhou para o celular finalmente, muitas mensagens… E estava atrasado. Pausou a música e correu para dentro. Era uma caminhada complicada de se fazer mesmo devagar, uma colina íngreme até para os padrões das colinas.
Não estava preparado para corrida, seu sapato machucava o calcanhar e sua calça jeans não o deixava se mover livremente, mesmo assim foi o mais rápido que pode até chegar ao topo. Lá muitas pessoas estavam juntas olhando para o mesmo lado, eram muitas, mas não parecia cheio e barulhento. Olhou para onde todas elas olhavam. O sol acabara de tocar o horizonte onde não estava cinza, uma nuvem encobriu sua parte de cima criando um borrão laranja rosado.
Era como esperava. Na verdade era melhor.
Colocou seu fone de ouvido novamente e deu play no que restava da sua música enquanto recuperava o fôlego da corrida inesperada. Quando finalmente organizou seus pensamentos, descobriu o que sentia. Era saudades. Saudades de casa. Era estranho, pois tinha uma casa, mas não conseguia chamar de lar. Sentou na grama enquanto observava o sol ir embora. Enquanto os minutos passavam seus olhos ardiam como nunca, mas as lágrimas teimaram em não cair.
Uma garota do grupo de desconhecidos tocou seu ombro.
-Hey, você veio sozinho?
-Oi?- ele tirava os fones sem desgrudar os olhos do horizonte.
-Perguntei se veio aqui sozinho.- ela parecia um pouco intrigada.
-Vim.
-Ué, por que? Não trouxe uma namorada, nada? Pra que veio aqui, se me permite perguntar, estranho.- ela sorria levemente, orgulhosa do seu gracejo.
-Porque isso me faz lembrar da minha mãe.
O sol finalmente desapareceu, mas o céu ainda estava com uma cor engraçada.
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A casa parecia vazia de coisas inúteis. Estava cheia de coisas realmente essenciais, mas mesmo assim sobrava muito espaço pois as coisas essenciais não são numerosas ou espaçosas. Ela cheirava a nada em especial, e suas paredes eram sem graça. Ela era perfeita para ser o que era: uma casa para se passar a noite. Ela tinha uma cozinha onde se poderia cozinhar coisas, tinha um banheiro que funcionava, uma lavanderia com tudo que se precisa para lavar as roupas e manter a casa em ordem, uma sala de estar onde não existia televisão, apenas três cadeiras e um quarto com um guarda-roupa com poucos cabides devido a pouca roupa e uma cama de onde poderia se puxar uma segunda cama de baixo.
Era a casa do pai de Dan, um homem que acabará de chegar em seus 40 anos e recém divorciado. Dan via seu pai pela primeira vez desde o ocorrido, dois meses antes, e ele parecia surpreendentemente bem. Não parecia triste, e isso era bom, pois tinha que perguntar-lhe algo sobre relacionamentos e não queria ter que lidar com um surto de choro do seu velho.
Seu pai estava lavando alguns copos sujos enquanto a pizza que pediram ainda não chegava, Dan sabia que seu pai sabia muito bem cozinhar mas mesmo assim escolheu a pizza porque não queria incomodar.
- Pai? Como vão as coisas? - Estão bem Dan, tudo bem. - E no trabalho? Conseguiu aquela promoção? - Dan tentava contornar os assuntos e esquentar a conversa de pai e filho enferrujada à anos para poder tocar no ponto que desejava. - Sua mãe pediu para você perguntar isso? - Não! Quero dizer... Ela pediu para ver se você está realmente bem... Ela se preocupa contigo. - O garoto estava nervoso consigo mesmo por ter deixado a conversa cair sobre algo incômodo para seu pai. - Ainda não consegui Dan, e não me entenda mal, eu sei que ela se importa, perguntei só por curiosidade mesmo. Como vai na escola? Precisa de ajuda com alguma coisa?. - seu pai finalmente tocará no assunto desejado. A escola. Disso ele poderia facilmente mencionar a garota. - Está tudo bem na escola, nenhum problema. Bom, talvez um pequeno... Sabe, tem essa garota... - Ele sentiu seu rosto aquecer de forma esquisita, queria perguntar logo e acabar com isso.
O pai de Dan sorriu abertamente, baixou o copo que estava lustrando e se virou para o garoto. Parecia realmente satisfeito com algo.
- Porque está sorrindo assim? Não é engraçado. - Não estou debochando de você Dan, é só que eu sempre esperei ter alguma conversa mais íntima contigo, e esse é um momento interessante de isso finalmente acontecer. De qualquer forma, o que tem ela? - O pai não parecia envergonhado com a situação mesmo sendo a primeira vez que estava tendo uma conversa não superficial com o filho. O sorriso sumiu, mas ele ainda carregava felicidade nos olhos que fitavam os de Dan, aguardando. - Bom, ela é da minha sala e ela é tão inteligente... Ela... Sabe tanto de física e mesmo assim escreve poemas muito bem, e desenha e... Ela é linda também, ela tem cabelos loiros e olhos verdes e quando a gente conversa parece que ela está olhando dentro da minha cabeça, e ela é engraçada e... Você está sorrindo de novo. - Dan estava um pouco aborrecido, seu pai estava agora sorrindo abertamente sentado em uma das cadeiras que ele tinha puxado para a cozinha enquanto Dan estava perdido dentro de sua descrição. - Estou, é realmente nostálgico ouvir tudo isso. Então você gosta dela? - Então... Eu acho que... - Dan fez uma pausa, o que estava prestes a dizer poderia ser motivo de arrependimento em alguns segundos, e vergonha por muito mais tempo. - Amo essa garota.
Seu pai continuou sorrindo, não parecia surpreso. Os segundos se passaram como dias e aquela pequena espera estava sufocando Dan, queria dizer alguma coisa e quebrar aquele silêncio, mas seu pai parecia perdido dentro da própria cabeça. Finalmente ele levantou os olhos e disse:
- Que bom Dan, espero que dê certo e espero conhecer essa menina incrível um dia desses. - Se levantou da cadeira e foi para pia dar atenção ao resto da louça. O filho parecia muito confuso, aquilo não parecia certo, seu pai não tinha entendido alguma parte do seu monólogo, tinha certeza disso. - Pai! Acho que você não entendeu... Eu quero dicas, o que eu faço? Isso é amor de verdade? - Não sei Dan. - Seu pai o olhou novamente. - Talvez seja, só você pode dizer. Quando for amor você vai saber. Pra ser sincero com você... - Ele se sentou novamente e Dan puxou outra cadeira e sentou na sua frente. - Eu acho que o que você ama, se ama, é a idéia que formou dessa menina. Acho que não a conhece o suficiente para dizer que a ama. Mas não desanime, acho que isso pode ser amor mesmo, e vai ser seu primeiro amor acredito eu. E vai ser ótimo. Agora seu pai o olhava, ainda sorrindo, esperando o filho assimilar tudo que foi lhe dito. - Mas e se eu tiver certeza, e se for... O que eu faço? - O garoto sentia um frio na barriga, seu pai talvez tivesse a resposta certa para isso. - Você faz algo a respeito. Não tem segredo, você age para conseguir o que ama. Dan parecia inspirado, por alguns momentos ele se imaginou correndo para contar para sua mãe o que tinha descobrido. Que seu pai tinha a resposta! Então ele olhou para seu pai e percebeu. Ele continuava sorrindo mas seus olhos não estavam mais alegres, seu brilho tinha diminuído. - Pai... Você não ama a minha mãe? - Seus olhos ardiam horrivelmente, não queria chorar na frente de seu pai, mas sentiu que talvez não iria conseguir segurar. - Claro que eu a amo Dan, você sabe disso. - Então porque deixou ela ir? - Uma lágrima finalmente se soltou, molhou levemente sua calça jeans. - Ah Dan... Não foi isso que aconteceu. Eu e sua mãe somos um caso raro de amor verdadeiro, não duvide disso. O que aconteceu é que nossa história acabou antes de um de nós morrermos, e em respeito à nossa história, decidimos pôr um fim nela antes de arruinarmos. Eu amo sua mãe, e ela me ama, somos maduros o suficiente para perceber que iríamos matar nosso amor se continuássemos forçando. O amor existe Dan. - Mas... Se é amor vocês deviam estar juntos sempre. - As lágrimas de Dan finalmente perderam a vergonha e estavam caindo sem controle mas o sorriso do seu pai parecia verdadeiro novamente, ele parecia satisfeito. - Você Dan, enquanto você existir nós vamos estar juntos. Comer pizza enquanto eu ouço meu filho, fruto do relacionamento que eu tive com o amor da minha vida, falar sobre a menina incrível que ele conheceu na escola. Isso é o melhor final feliz que eu poderia imaginar, Dan. Uma buzina ressoou pela casa enquanto os dois se olharam sorrindo. - Acho que a pizza chegou. - Enquanto ele se encaminhava para porta, bagunçou carinhosamente o cabelo do filho.
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Minha mãe me ensinou muitas coisas. Duas delas são: não podemos ter tudo que queremos e não deixar o que eu sinto interferir na vida dos outros. Inclusive essas duas coisas precisam ser mantras para a vida das pessoas.
Nem tudo vai dar certo, seus planos vão falhar, alguns dias vão parecer ter horas demais ou momentos bons vão parecer ter horas de menos. Tudo bem. A vida é assim, não podemos ter tudo.
Às vezes dizer o que sente é só egoísmo.
Vão existir situações em que você vai conhecer uma pessoa incrível e não vai dar certo. Tinha tudo para dar certo, mas não deu. As pessoas mudam e as situações mudam.
“Eu te amo, amo mesmo, mas o que temos está quebrado”. A rotina matou o que tinham. Sua pessoa querida mudou e você não viu. Vocês vão se olhar e sentir que existe algo, que ela(e) é familiar, mas não é reconhecível. É um velho conhecido que você costumava saber tudo sobre mas agora não se lembra do nome completo.
Eu não acho que o destino tenha algo para vocês no futuro, para que um dia, quando se virem por aí, tudo voltar. O nome da pessoa estava na ponta da língua o tempo todo e agora você finalmente lembrou, tudo faz sentido, tudo foi por uma razão e vocês foram feitos um pro outro. Viveram felizes para sempre.
Às vezes só não deu certo, você apostou no cavalo que perdeu. Mas isso não é nada demais. Todos já passaram por isso. Tentam ser amigos mas está tudo tão estranho, costumavam ser amigos mas o contato estragou aquilo também. Vê-la(o) feliz só causa mais dor. Depois de dias, meses, anos ainda existe algum impacto quando uma foto simplesmente aparece quando não estava esperando.
Não diga que ainda ama, não diga que ainda se importa, não finja que consegue manter uma amizade madura depois de tudo. Quando você diz “ei eu ainda estou aqui e eu nunca te esqueci” você está sendo egoísta. Simplesmente empurrando um problema que é seu para a outra pessoa, você não são mas um “nós”, você é só você e tem que aprender a lidar com seus sentimentos.
Aprenda que existem momentos que você precisa dizer o que sente, porque guardar algo bom para você mesmo é horrível. Mas existem momentos que compartilhar um sentimento que na verdade é um problema, é só compartilhar um problema. Você tem que se resolver sozinho e aceitar que você não é o protagonista do mundo.
Outros amores vão vir, muitos deles não vão dar certo. Alguns deles vão, mas vão ter um fim mesmo assim. Nem tudo é como a gente quer.
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Já escolhi meu futuro.
Se tudo der certo eu vou ser um engenheiro, me mudar para o Havaí e virar uma piada pronta.
A segunda parte é mentira.
Eu escolhi meu caminho quando não tinha a menor estrutura para saber o que eu queria. Você não sabe de nada aos 18, por mais inteligente que seja. Com 13 se acha mais esperto que seus pais, com 18 acha que já está tudo resolvido e seu futuro está lá só esperando sua hora de chegar.
Você vai achar seu Eu de hoje tão idiota daqui 3 anos… Vai lembrar das coisas que pensava e falava e vai sentir vergonha. Vai lembrar que achava american pie um humor refinado.
Nossa geração está enlouquecendo.
Eu não sabia que existiam tantas pessoas quebradas no mundo, como brinquedos com defeito. Parte disso vem dessa pressão de ser.
Você TEM que superar seus pais, seja lá o que isso queira dizer. Você TEM que ser o melhor, o mais novo, o único em alguma coisa e de alguma forma ou você FALHOU.
Tenho um amigo que defende o curso que ele escolheu com unhas e dentes. Eu conheço ele faz 12 anos. Eu sei que ele nunca gostou de química. Eu sei que ele está tentando se convencer que ele acertou na escolha. CLEBER, SE VOCÊ TÁ LENDO ISSO FICA TRANQUILO CARA, NINGUÉM TEM CERTEZA DE NADA.
Aproveita e passa lá em casa pra pegar um teco daquele frango se não vai estragar, tamo junto.
Temos medo de escolher errado e temos mais medo de escolher “tarde demais” o que queremos. Nos comparamos com o filho do vizinho e chegamos a conclusão que estamos atrasados para o amanhã.
O topo do iceberg que as pessoas veem da gente de realizações pessoais são só uma pequena parte. O que está sob a água é um pedação de frustrações e expectativas feitas de gelo.
Quem ja teve uma crise existencial sabe que nos compararmos com outras pessoas é normal. Mas nos compararmos e sentir-se menos, muito menos, quase como se fôssemos acabar. Ai é onde você questiona sua motivação.
Um segredo sobre a vida é que a perfeição não existe. O emprego perfeito, a alma gêmea, a satisfação plena… É mais coerente acreditar no hexa do brasil que nesse tipo de coisa.
Isso não é pessimismo, é só um pensamento da madrugada.
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Felicidade é, em sua essência, um sentimento. As pessoas gostam de atribuir o sentido da vida à ela. Tem gente que passa a vida pulando de um momento de felicidade para outro, procurando a felicidade como viciados.
E é exatamente por achar que superestimam esses pedaços da suas vidas que eu acho mais importante fazer feliz do que ser feliz. A felicidade individual não ajuda ninguém. A sua felicidade é um sentimento como qualquer outro.
Demonizar a tristeza, dizer que uma pessoa não pode ser/estar triste e que ela tem que parar com isso não faz sentido. A tristeza também é um sentimento, e como TODOS os sentimentos, é involuntário senti-la. Fugir da tristeza e correr atrás da felicidade como um viciado é fraqueza, é covardia.
Quando você mistura tudo isso e faz uma sopa sem forma e atribui um sentido àquilo, isso é a vida. Igual quando tu olha para uma nuvem e vê um dragão. Felicidade, tristeza, ciúme, raiva, vergonha. Todos sentimentos são importantes e precisam ser sentidos, assim você se conhece e se respeita.
O medo de sentir qualquer coisa desagradável te torna incapaz de melhorar como pessoa. A felicidade te amolece.
Me ensinaram pra controlar meus sentimentos para que não afetem os outros negativamente. Mas para aprender isso você precisa primeiro sentir.
Se gosta tanto da felicidade, busque-a. Não se deixe influenciar por um texto qualquer. Eu só peço que pense sobre isso.
Quantas vezes você deixou de ir por medo? Quantas vezes negou sentir raiva? Quantos filmes de comédia você viu para afastar a tristeza?
Talvez a vida seja mais do que satisfação.
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01-01-1992
Querido diário
Hoje está muito calor, acho que estamos no meio do verão. Tenho medo do outono, pois sempre que ele chega é um problema e tanto. Está bem tranquilo por aqui hoje, parece que todo mundo foi viajar ou algo assim. Apesar que ninguém vem aqui faz muito tempo. Pelo menos estou melhor regado que aquela macieira do outro lado do jardim. Meu tronco é muito mais bonito.
03-04-1993
Querido diário
Hoje uma menina veio ler encostada em mim. Ela é esquisita, fica rindo sozinha. E pelo que eu vi nem era um livro de comédia, ele tem umas figuras esquisitas. Mas fazia tanto tempo que ninguém vinha aqui. Foi um dia bom.
14-07-1993
Querido diário
Aquela garota não me deixa em paz! Ela vem aqui dia sim dia não há meses! E ainda teve um dia que ela teve a audácia de sentar junto a macieira do outro lado do jardim. Que insulto. Estou muito ofendida. Eu sou claramente a macieira mais confortável daqui, oras.
16-11-1993
Querido diário
Estou começando a gostar dessa menina, vou chamar ela de Maçã. Ela já leu mais livros do que eu consigo contar, e sempre está rindo ou chorando deles. Uma vez ela riu igual um porquinho, quase não consegui me segurar. As vezes ela vem a noite também e fica olhando para o céu. É uma vista muito bonita, tenho que admitir.
03-12-1993
Maldito diário
Faz alguns dias que um grupo de garotos vem sentar naquela macieira do outro lado do jardim enquanto a Maçã está lendo comigo. Parece muita coincidência para o meu gosto. Espero que eles deixem a Maçã em paz.
11-12-1993
Querido diário
Um dos garotos veio falar com a minha Maçã, ele a chamou de Eliza, que bobagem! Vou chamá-lo de Caroço. Não sei se foi impressão minha, mas Maçã parecia satisfeita de isso ter acontecido.
01-01-1994
Querido diário
Fazia duas semanas que não via a Maçã. Hoje ela passou por aqui, mas sem um livro. Apenas para ficar se beijando com o Caroço. Tenho medo dela começar a gostar muito de beijos e deixar de gostar de ler comigo.
21-03-1994
Querido diário
Desde a última vez que escrevi que não vejo a Maçã. Estou começando a ficar preocupado, será que o Caroço sequestrou minha menina? Para que ela nunca mais leia perto de mim?
27-05-1994
Ufa diário
Maçã finalmente deu as caras, ela e o Caroço, é claro. Mas eu estava morrendo de saudades, não me importo. Eles ficam namorando na minha sombra enquanto eu torcia para ouvir uma risada da minha menina.
12-08-1994
Querido diário
Durante todo esse tempo Maçã e Caroço vieram para minha sombra frequentemente, até em dias de chuva, ficar namorando. Mas hoje a Maçã trouxe um livro e está sozinha. Ela não deu risada hoje, mas chorou. Não acho que seja por causa do livro. Acho que é porque ela engordou um cado.
11-10-1994
Ai meu diário
Tem algo de errado com a Maçã, ela está engordando muito e não está mais rindo pra mim. Um dia desses o Caroço apareceu por aqui, eles gritaram um com o outro. Ele queria porque queria que ela tirasse, enquanto ela batia o pé dizendo que decidiu deixar. O que? Não sei dizer. Talvez seja aquelas unhas com cor de abacate. Estavam meio esquisitas mesmo.
02-12-1994
Querido diário
Faz algumas semanas que eu não vejo a Maçã. Talvez a minha menina tenha decidido tirar aquelas unhas feias numa cirurgia.
28-09-1997
Querido diário
Você não vai acreditar em quem veio aqui hoje. O Caroço. Estava com tantas saudades dele, e olha que eu o odeio. Acho que ele veio procurar a Maçã. Ele me disse que a perdeu. Pelo menos ele pode andar por ai, eu tenho que ficar plantada aqui literalmente esperando por ela. Talvez ela tenha me perdido.
Caroço se despediu de mim, acho que é a última vez que o vejo.
01-01-1998
Diário! Diário!
A Maçã! Ela veio aqui hoje! Passou o dia inteiro comigo. Ah que saudade da minha pequena. E ela me trouxe um livro, o primeiro livro, aquele que tinha figuras, lembra? Ah que saudade da risada dela. A macieira do outro lado do jardim está com muita inveja. Ela emagreceu. E trouxe um filhote de humano, uma menina. Essa menina nova é muito chata, eu queria ficar sozinho com a Maçã.
Ela é esquisitinha, fica rindo sozinha das figuras. Ela tem o riso igual a da Maçã.
Acho que no final das contas ela não é tão esquisita assim, parece fazer a Maçã feliz.
Vou chamá-la de Flor.
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