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Nós – Ievguêni Zamiátin - Editora Aleph
Digo que sou um entusiasta de livros de distopias, não muito contente cinco dos livros que tenho em minha prateleira são do gênero. Nós foi um amor à primeira vista, desde a capa até a síntese do livro, de autoria do russo Zamiátin, encanta do começo ao fim, te aprisiona em uma sociedade totalmente contrária a nossa, mas nada inusual, um regime autoritário em que suas liberdades são controladas e espremidas na garantia da felicidade, essa ambiguidade é um dos focos do livro que traçam uma linha crítica sobre o regime socialista que ocorrera nos anos de publicação do livro.
Ievguêni Zamiánti nasceu na Rússia em 1884, viveu os períodos da Revolução Russa, inclusive apoiou a Revolução de Outubro, mas sempre foi crítico do controle e da censura feitas pelos bolcheviques, isto, incentivou a criação de suas principais obras, Nós é considerado o pai das ficções futurísticas, que tem livros notáveis como ‘’1984‘’de George Orwell e ‘’Admirável Mundo Novo de Aldous Huxley’’.
A ventos à oeste, atrás do muro, se escondem a promiscuidade, o pecado, o imoral. O Estado Único, que após a guerra dos Duzentos Anos se reafirmaram como nação dominante e se isolaram do mundo, divididos por um muro, de um lado ficaram os selvagens, que são considerados como uma sociedade irracional que abusa de suas liberdades, no outro ficou a cidade-estado autoritária em que situamos. Vivemos na pele do número D-503, que acredita fielmente no regime em que vive, D-503 é um matemático e engenheiro que dispõe de seus serviços para a criação do foguete a ‘’A Integral’’, o número vive em uma sociedade em que os horários são regrados, não há liberdade para atrasos, todos os números vivem em prédios em que as paredes são feitas de vidro, não existe anonimato nesta sociedade, os casamentos são banidos e as relações sexuais são feitas a partir da inscrição de seu nome em pequenos papeis e enviando para o número com quem quer o encontro os números também usam o mesmo uniforme que são chamados no livro de unif . Tudo é como se fosse ‘’A Integral’’, pequenas engrenagens se movem uniformemente todas as horas todos os dias, quem dera que uma dessa engrenagens se rebelassem e parasse de funcionar, todo o restante iria parar também, Nós, quer dizer um conjunto, não existe particularidades, todos são partes de uma peça só, Nós.
Liderados pelo benfeitor, uma figura quase mística e intangível que se auto afirma com seu nome, é único o correto moralmente, protege todos os cidadãos da temida liberdade. Liberdade e Felicidade são temas muito discutidos no livro, dando ênfase em trechos bíblicos, como na passagem de Adão e Eva e o ‘’paraíso’’. Eles viviam felizes, não fomentavam desejos, nem materiais muito menos carnais, estavam alegres na monotonia, até o momento em que descobrem a liberdade, que biblicamente foi uma punição, o ato de Adão ser desregrado nos pune até hoje e é este o paraíso que o Estado Único quer retomar, segundo o Estado Único a repressão de nossas liberdades é a garantia da felicidade.
A alienação de D-503 com o modelo vigente é tão forte que em vários momentos do livro, satiriza e banaliza a cultura dos povos antigos, no caso, nós. Para ele não há nada melhor do que viver nessa redoma. Mas tudo começa a mudar quando ele conhece I-301, uma mulher que o torna vulnerável e que desperta seu imaginário, D-503 se enlouquece por I e tudo muda por aí adiante;
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Ideias para adiar o fim do Mundo - Ailton Krenak - Companhia Das Letras -        Guilherme Rocha da Silva
Diante das mudanças ambientais e sociais no último século, nos tornamos subjetivos ao consumo, uma sociedade hedonista em que os prazeres não são mais usuais como os carnais, mas sim os materiais. Estamos alienados à um ciclo que não se encerra, vimos e nos tornamos produtos em vitrines, somos o que compramos e vestimos, e não o que dizemos e pensamos. Desta sociedade sombria e devastadora, restam-nos alguns dos nativos em que tentam preservar desta terra, os legados do ser humano, como status quo primal de interação em sociedades. Ailton Krenak é o nosso porta-voz, nesta viagem inquietante, exemplificando toda a alienação dada por este Estado de consumo.
Ailton Krenak nasceu na região do Vale do Rio Doce, região assolada por empresas de extração de minérios, e como todos os outros indígenas, a sua luta não cessou. O livro é nada mais do que palestras em que o mesmo deu em dois eventos em Lisboa. Ailton é cativante, pois trata de forma leve suas palestras por mais contraditório que o tema seja.
O livro é dividido em três partes que são quase que esclarecedoras em seus títulos, o primeiro ‘’Ideias para adiar o fim do mundo’’ que leva o nome do livro, é quase que um soco cruzado na boca do estômago, de forma forte e contundente, o plano central deste primeiro capítulo é a nossa alienação a este novo modelo de sociedade, em que Ailton apelida-o de liquidificador, ‘’A modernização jogou essa gente do campo e da floresta para viver em favelas e em periferias, para virar mão de obra em centros urbanos’’, o debate circula por um pensamento de que desprendemo-nos das nossas raízes, abandonamos as nossas subjetividades e tornamo-nos um só, uma Humanidade. Os centros urbanos segundo ele, são iguais, desde Nova Iorque até São Paulo, ampliando esta linha de pensamento. E destes centros, existem as corporações que Ailton exclama-as de ‘’corporações espertalhonas’’ que tomam o controle exaustivo dos recursos naturais.
O segundo capítulo chamado ‘’Do sonho e da terra’’ fala desse sonho de pertencimento a terra, abandonar o ponto de vista capitalista para o ponto de vista paternal, Ailton ressalta que os recursos naturais como dizemos, na verdade tem traços humanoides, o rio em que a tribo Krenak situa, o Rio Doce é na verdade seu avô e esse sentimentalismo e apreço pela natureza está escasso em nossa sociedade. Temos uma falsa impressão que a sociedade em que vivemos não sofreu processos até a nossa data de nascença. Na fala do autor ‘’que as comodidades tornaram fácil a nossa movimentação pelo planeta, também é certo que essas facilidades são acompanhadas por uma perda de sentindo’’ é possível perceber que com esse mundo novo, rodeado de tecnologias que facilitam o nosso modo de ser e de viver, inibe por outro lado, a superação de dificuldades, à exemplo a este texto, não imagino o quão difícil seria escrever em uma máquina de escrever ou até em um papel, os erros não iriam se corrigir automaticamente, eu, como autor, teria um árduo trabalho de apagar e escrever novamente, é como se a borracha não existisse mais, não trabalhamos nossos erros para serem corrigidos, apenas traçamos com grafite, a nossa imaginária linha da vida
No terceiro capítulo por fim, surge o debate sobre a violência social que é feito com os grupos minoritários, como os indígenas. As corporações exercem uma força para que estes grupos integrem esta nova sociedade do consumo, que muitas das vezes são forçados a translocar de suas localidades para outras, motivados pelo movimento exaustivo das corporações sobre os solos e os rios. Isto se adequa também segundo o autor aos cientistas, ‘’Acabaram os cientistas’’, pois esta moda do consumo, atrai os cientistas, que transformam as ideias em mercadorias, ‘’Os laboratórios planejam com antecedência a publicação das descobertas em função dos mercados’’.
Com toda a simplicidade e a leveza de um debate, não demora muito até que todo o livro seja lido. Ailton Krenak exemplifica que fins do mundo já foram vividos, centenas de vezes por toda a nossa humanidade, a Roma antiga já vivenciou seu fim do mundo, os Índios por outro lado, sobrevivem a este, algumas tribos tiveram seus fins, outras sobrevivem por centenas de anos, a expressão fim do mundo pode ter diversos significados à diversos contextos. Adiar o fim do mundo é sempre poder sentar e conversar seja com seus filhos ou amigos, sobre a sua subjetividade e sua história antepassada, a cada passo que damos em integrar uma sociedade em que somos engrenagens que juntas fazem o relógio andar, a homogeneização da sociedade inibe características subjetivas, e talvez temos que aprender um pouco com os nossos nativos, talvez Ailton nos ajude a ressignificar o nosso modo de ver o mundo.
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