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gninraey-noitceffa · 8 months
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onde é possível estar num estado de loucura?
em que se pode gritar, urrar, tacar coisas, quebrar, se contorcer até deformar
sem que isso gere prejuízo?
talvez agora eu saiba o por quê da escolha por um certo isolamento na tentativa de deligny
uma resposta possível a essa dúvida que me ocorreu a respeito do isolamento, depois que li caosmose e todo experimento de guattari
que convida a uma mistura, uma vontade de mistura.
será que é possível acessar esse estado de loucura – de contorcimento, de grito – em um contexto de mistura, ou apenas em isolamento?
não estou me referindo ao isolamento do confinamento, mas a uma certa separação, para não sofrer danos – prejuízo (será que isso é confinamento?)
essa pergunta – onde é possível estar num estado de loucura? – me veio depois de assistir a um filme, e de pensar: “quero fazer isso”. o “isso” era atuar, mas o que estava pensando mesmo era: “quero fazer isso, isso aí que esse cara está fazendo nessa cena: gritando, batendo, tacando coisas, etc.”
esse estado é possível numa cena de filme porque ali, na hora em que isso foi feito, existia um suporte, uma preparação, uma equipe que cuidava para que aquilo fosse possível sem causar danos – prejuízo.
e hoje, hoje mesmo, falei sobre o risco de se bater, o risco de se agredir, o risco de tornar isso algo que foge do alcance de qualquer percepção capaz de compreender até onde aquilo pode acontecer sem causar danos – prejuízo. a gente banaliza, e segue vivendo a autoagressão como possível. banaliza e não enxerga o risco. o risco de perder a mão. perder a própria mão em si mesmo. porque não vai ter ninguém por perto pra dizer: “corta!” e finalizar a cena. não existe brecha para sentar, tomar uma água, fumar um cigarro, descansar e voltar para o set mais tarde. e, quem sabe, a próxima cena será a de um diálogo calmo, feito apenas de palavras.
mas, então, o que fazer com essa vontade de fazer isso – isso aí que esse cara está fazendo nessa cena – o que fazer?
o que fazer com os gritos, com os pratos a ser quebrados?
com essa avalanche que não é de neve mas de fogo, porque é quente como marte
quente, mas revolta como o mar durante uma tempestade –
netuno vai te engolir numa onda enorme e te levar para o fundo do mar, porque as águas são assim profundas e misteriosas
enganam
enganam e levam
levam e já não é possível ver a nitidez
que nitidez?
que nitidez é possível, quando se olha para o horizonte com as gotas de chuva caindo sobre os olhos?
esse pensamento não tem uma conclusão
está mais para uma névoa cheia de nada que envolve e entorpece
mas hoje, hoje mesmo, também falei de harmonia, equilíbrio
um certo equilíbrio para não perder a mão
mas o equilíbrio de uma harmonia é sua dança com o caos
que caos é esse de que guattari fala? será que é o caos do grito, do contorcimento? AAAAAAAAAAHHHHHHHHH
e aqueles que viviam separados em meio à tentativa de deligny, será que poderiam fazer seus caminhos de errância aqui, agora, na rua, no metrô?
cadê a dança?
a dança, onde está a possibilidade de uma explosão que não cause danos – prejuízo?
cadê a dança?
e, antes de mais nada, te digo isso: essas são apenas perguntas sem juízo – de valor (ou qualquer outro que seja).
você é capaz de suspender seu juízo?
mas não é disso que se trata a loucura? (ou, não é isso que se trata na loucura?)
ah! então saber julgar é o “normal” – ter juízo? estranho, porque é isso que me traz danos – prejuízo.
(alguém me ensina a etimologia dessas palavras, porque minha cabeça já está embolando com tanta sugestão de sentido)
dano – prejuízo – juízo – julgar
não, não me ensina
deixa isso assim, como uma falta
uma falta de palavras. porque, afinal, as palavras sempre faltam.
deixa eu ficar com essas sugestões de sentido, que podem fazer sentido pra você, que podem fazer sentido pra mim. que podem suspender meus sentidos – juízo.
me deixa aqui com essa falta que talvez se transforme nessa loucura, essa loucura que procuro descobrir qual o estado possível de estar
talvez essa falta faça vir à tona uma voz, uma voz que vai encher e transbordar, criando essa avalanche de fogo e de mar na tempestade
e a falta, afinal, será a falta de sugestões de sentidos nada de vazio, mas um excesso, esse que faz quebrar porque já não cabe em si
já não cabe aqui, não cabe aqui essa tentativa de contenção
quebra os pratos de louça, que parecem feitos de ossos – brancos e frágeis, duros e aerados
tem ar, tem ar dentro dos ossos
tem ar por toda parte. você consegue ver?
você consegue ver como o mesmo ar que está em você está em mim, e em todo resto?
esse ar que está em mim e em você, está na loucura
nem só as coisas palpáveis têm ar dentro. você sabia?
você sabia que para absorver o ar as plantas mudam? dependendo do ambiente, dependendo das condições em que se encontram? você percebe que elas se contorcem?
será que você perceberia, se elas gritassem, se quebrassem coisas?
e, veja, elas não se adequam, elas transmutam. não se preocupam com danos – prejuízo
não existe um pré
elas seguem
se contorcem, mudam de cor, vão para a água, para a terra mais ou menos úmida, seca, árida, se tornam pequenas, grandes, dão voltas pra chegar onde tem mais luz, ou menos:
‘aqui, entra aqui, que tá mais escurinho, dá pra se proteger melhor desse sol forte, não precisamos dele em sua máxima potência.’
‘não, não, eu vou subir, vou me apoiar nesse tronco pra chegar onde tem mais luz, dividir o sol com essa copa.'
ah! e sim, elas quebram coisas! você percebe?
você percebe a força que há em quebrar coisas, gritar, se contorcer?
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gninraey-noitceffa · 4 years
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nós, essas pessoas que se perguntam se são monstros
(texto apresentado no encontro Sexta do Mês - Stonewall: do Village para o mundo, organizado pelo Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social da USP, em agosto de 2019) 
O que quero compartilhar com vocês é um mistério. Sendo assim, tem algo de inacessível, e isso produz um problema. Mas esse problema não é só meu, é nosso. E, pra mim, só dá pra viver sustentando e convivendo com esse problema... como é pra vocês? Pra mim é como correr atrás e nunca alcançar, mas continuar correndo. Porque assim os poros se abrem com o vento que bate na pele sem pedir permissão e qualquer coisa que seja – tudo – entra e sai. Já não existe dentro e fora. Ou então, como ficar parado numa quase imobilidade, na qual tudo me atravessa e todo micro movimento que faço decorre dessa permeabilidade. "Desculpai-me mas vou continuar a falar de mim que sou meu desconhecido, e ao escrever me surpreendo um pouco pois descobri que tenho um destino. Quem já não se perguntou: sou um monstro ou isto é ser uma pessoa?” (a hora da estrela – Clarisse Lispector)
Isso aqui, que escrevo/leio/falo agora, talvez seja uma carta, pra ninguém, ou pra todo mundo que me escuta, ou especificamente para l., t., j., h., r., p., a., c., m…. e tantas outras letras que iniciam tantos outros nomes, daqueles que um dia ficaram sem nome, ou que ainda estão.
Porque um pouco desse problema diz respeito à nomea��ão. nomeação de nós nomeações de cada
Tenho dito pra mim que tenho três nomes, já que esses três nomes são usados pra me chamar. E que isso é só mais uma coisa desse tanto de atravessamento constante que é a vida.
Então, como ou quantos são a nomeação de nós? não-binário O que é isso? Alguém aqui sabe? Alguém espera que eu dê uma resposta?
“Tudo no mundo começou com um sim. Uma molécula disse sim a outra molécula e nasceu a vida. Mas antes da pré-história havia a pré-história da pré-história e havia o nunca e havia o sim. Sempre houve. Não sei o que, mas sei que o universo jamais começou.” (a hora da estrela – Clarisse Lispector)
Há tempos atrás uma pessoa mexicana, artista, indígena (dentre as nomeações que posso dar para dizer dela) falou que “os idiomas do ocidente não dão conta de uma concepção de vida e mundo na qual a humanidade não está no centro. Inglês, português, espanhol, não dão conta de um mundo fora do antropoceno.”
Talvez a língua que uso para escrever/falar não dê conta de um mundo fora do antropoceno, mas foi a língua que me deram, vou continuar tentando usá-la para inventar outras línguas, outras linguagens e outros nomes…
não-binário é só uma das tentativas
Pra mim é uma tentativa de saída do antropoceno. Pra mim, esse nome que nega, tenta afirmar que uma molécula disse sim a outra molécula e nasceu a vida… e digo ‘pra mim’ porque essa é uma relação particular que tenho tensionado com esse nome, percorrendo caminhos para achar outros nomes – que não neguem algo a fim de afirmar outra coisa.
Mas, o que estava tentando dizer é que não-binário coloca em tensão uma estrutura de ser, um modo de existência, um certo tipo de humanidade… coloca em tensão o corpo nessa estrutura.
Outro dia escrevi em outra carta: “Sou feito de folhas pontudas e aqui/agora, enquanto te escrevo essa carta uso uma prótese fálica que não é pontuda mas serve para penetrar penetrar meu próprio corpo de terra, água, gás, fogo porque nasci nessa vida com dois orifícios e um mini-pau, e às vezes aumento ele com a prótese fálica, enquanto diariamente faço ele crescer com o gel transparente e aderente na minha pele. Faço isso porque nesse tempo meu corpo está em constante diálogo com essa humanidade identitária, como você bem disse. E esse tempo é colonizador. Ele disse que meu corpo é feminino porque tenho clitóris. Mas, se chamo esse clitóris de mini-pau e faço ele crescer diariamente transmuto o tempo?”
Num tempo em que eu só tinha dois nomes encontrei alguém que não tem gênero e que coloca isso nas palavras, num movimento de alargar a linguagem para além do feminino e do masculino dentro dessa língua que chamamos de português. Mais ou menos ao mesmo tempo li alguém que dominando três línguas sente que nenhuma lhe pertence, e que ao usá-las e misturá-las cria linguagem, num texto que flui entre referências e dizeres de outros – pensamento crítico/político –, e vômitos de vivências, auto experimento, exposição de atravessamentos – corpo sensível/político.    
E eu aqui sendo todo dia atravessad pela deslegitimação dos movimentos que tento fazer com esse corpo/linguagem, me perguntando quais são os gestos possíveis e quais desejo alcançar. Lembro que uma vez escrevi: não dá pra deslocar corpo sem deslocar linguagem. porque essa vivência pobre de corpo está praticamente presa nessa linguagem pobre.
Mas, será que deslocar linguagem é o suficiente para deslocar corpo? Deixar o ela para usar o ele, deixar o a para usar o o, pode gerar movimentos perceptíveis para os trânsitos desse corpo e para os atravessamentos com os outros corpos? Porque não são pronomes ou artigos que definem o que seria feminino e masculino. Essas palavras tentam delimitar os gestos fabricados por sistemas de categorização da vida em dicotomias. Invenções sociais que estamos constantemente produzindo e acessando (ou sendo negads a produzir e acessar), às quais podemos hackear, quebrar, reinventar.
Já não sei diferenciar meus gestos dentro desses códigos binários de gênero, e me pergunto o quanto tods nós, fiscais das construções subjetivas alheias, fazemos essa diferenciação a cada movimento de mãos, pernas, boca… E o que vejo é que não importa o quanto você desloque a linguagem, se os fiscais não quiserem enxergar (respeitar), não vão. Não importa o quanto desloque os gestos. Se o corpo não é binário estarão sempre tentando encaixá-lo em algum desses dois lugares, mesmo que seu movimento seja para um outro lugar.
Essa necessidade de nomear é estritamente da experiência humana, mas a vida é muito mais, muito mais ampla, larga, complexa no nível de escapar nomenclaturas, porque sempre em movimento. Então, estou procurando adentrar em transições que não dizem respeito apenas a ordens do humano. Sair da normatividade não apenas pelo deslocamento dos discursos (linguagens) que estratificam os processos de subjetividade, mas por caminhos que desloquem o corpo dos contornos do que seria humano e do que podemos ter de não humano a partir dos contatos e trocas com outros seres que já estão aí, e/ou com seres que criamos (substâncias).
Isso me faz lembrar do Nascimento de Urana, da Jota Mombaça. Dos cinco dias que tivemos numa oficina sobre ficção visionária oferecida por ela, com colaboração de Bibi. Durante esses dias, nós, essas pessoas que se perguntam se são monstros, inconformes com normas de gênero e sexualidade, pensamos junts sobre como somos a ficção visionária daqueles que vieram antes. Pra gente existir outras pessoas tiveram que imaginar mundos onde fosse possível viver de outro jeito. Imaginaram, viveram, morreram e construíram esses mundos nos quais eu posso estar aqui/agora falando sobre isso, imaginando, vivendo, construindo e morrendo – o tempo é espiralado. E, não se enganem: “não sou um intelectual, escrevo com o corpo. E o que escrevo é uma névoa úmida. As palavras são sons transfundidos de sombras que se entrecruzam desiguais, estalactites, renda, música transfigurada de órgão. Mal ouso clamar palavras a essa rede vibrante e rica, mórbida e obscura tendo como contra-tom o baixo grosso da dor.”  (a hora da estrela – Clarisse Lispector)
Digo isso, também, para trazer ao corpo as aberturas provocadas pelas impossibilidades do presente. O que imagino, e, que, se apresenta como impossível para viver aqui/agora, poderá ser vivido por Uranas que estão por-vir. Porque aqui/agora nomear nem sempre é possível para nós, dentro da estrutura social regida por códigos binários, nos quais as tramas significantes privilegiam o sentido da visão.
“você pode mudar seus documentos, mas precisa continuar seguindo esse padrão (do sexo na certidão de nascimento ser feminino ou masculino)”, foi o que me disse a pessoa do cartório, quando perguntei sobre a possibilidade de declarar outra coisa, ou de, apenas, não declarar o sexo/gênero, não classificar meu corpo. Mas, se pra mim essa nomeação, esse dizer institucional é negado, talvez daqui há 20, 50, 70 anos, alguém possa dizer que é a ficção visionária daquels que vieram antes. E isso implica não só em institucionalizar e, assim, acessar estruturas necessárias para a sobrevivência nesse mundo, mas também (e, talvez, principalmente), em inventar outros contornos de si, outras formas de viver, que vão ser atravessadas por outras questões e vão impulsionar outras mudanças. Nós e o mundo estamos em movimento – nós somos o mundo, o mundo somos nós.
Nessa relação corpo/linguagem, que é a potência de minha força vital e minha maior vulnerabilidade ao mesmo tempo, estou sempre a perguntar: “será mesmo que a ação ultrapassa a palavra?” Aqui/agora para meu corpo trata-se de uma dança de atos, a medida em que a força vital é exercício – é prática. Mas, e o dizer também não é um ato?
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gninraey-noitceffa · 4 years
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digerindo um monte de coisa imaterial mas, como se quebra partículas de algo que não tem volume? meu cérebro é um estômago de palavras ou um intestino de imagens não sei só sei que meu corpo produz secreção e inchaço desde as articulações até as orelhas olhos lagrimejantes saliva catarro excesso de umidade como? se sinto essa grande secura que vai das entranhas até a pele – rachada vai ver é a mistura de sertão com praia que habita em mim sertão de corpo morrido praia de corpo parido daí, não sei muito bem onde pisar será que essa mistura faz a areia da praia preencher as rachaduras do sertão será que é por não saber onde pisar que estou num lugar sem praia e sem sertão?
o deslocamento geográfico me cansa como se não tivesse pernas e cada passo (ou cada quilometro percorrido pelas rodas no asfalto)… mas é no deslocamento que escrevo será que escrever é cansaço? talvez escrever seja esvaziar esse vazio de palavras e imagens – se não tem nada, nada significa mas nunca cheguei no vazio, ou, pelo menos, não me lembro dele. já que nasci na umidade onde sempre tem água – líquida ou vaporosa aprendi, então, a escorrer e quem escorre está cheio aprendi, então, a significar porque quem está cheio olha, toca, escuta, cheira, degusta, pensa, sente as coisas a partir dessa cheiura mas, cheio de que? - significança - quero mesmo é aprender - ignorança - desaprender a vida é um não saber
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gninraey-noitceffa · 5 years
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De repente, nessa noite de eclipse, começo a ouvir você lendo uma carta, e falando sobre abalos sísmicos, placas tectônicas, gravidade, terra, sol, lua, pesadelos, melancolia, tristeza e uma viagem ao méxico. E fico pensando na afinidade das palavras que saiam de tua boca com aquelas que sempre orbitaram pela minha cabeça. Penso também em nossas vidas passadas vividas nessa mesma vida que vivemos agora. O quanto a melancolia é essa expressão que diz respeito a esta outra vida, porque foi durante ela que eu escrevi sobre a melancolia como uma lente de visão/experiência de mundo. E o quanto nessa vida que vivemos agora tem uma força, tem um semblante presente e firme, mesmo em meio ao olhar e sensações adolescentes. Nessa vida que vivemos agora a melancolia não parece mais ser nossa lente, mesmo que ela não seja sinônimo de tristeza, essa energia densa da sensação da gravidade sobre os ombros que ela traz, parece não pesar mais a ponto de nos dar olheiras.
Não ando mais cabisbaixo pelas ruas (a maior parte do tempo). Firmo meus pés na terra e lembro com todo corpo que as plantas são seres híbridos por terem raiz. Esse corpo que de um lado ascende e busca a luz, de outro desce e vive na constante noite escura. É no contato com a terra e nas redes criadas nesse lugar que tudo é materializado, mas não antes da respiração que acontece no transar da folha com a luz do sol. E isso me faz lembrar de outra coisa que você escreveu, que conversamos: de uma ancestralidade não humana, da possibilidade de conhecer seus ancestrais mesmo sem as informações documentadas pela escrita/fala de seus parentes humanos, porque esses ancestrais são plantas.
Não vejo mais o mundo pela lente da melancolia, apesar de ainda sentir essa coisa que não sabemos bem dar nome, essa sensibilidade de ser por demais permeado, essa energia cósmica maciça e poeril que penetra meus poros, esse saber algo que não se sabe o que é ou não se tem palavras para dizer. Mas agora, nessa busca por conhecer a ancestralidade, que é a mesma busca por me conhecer, ganho corpo diariamente com outro cosmos que penetra meus poros, e com outra linguagem que me laça e me atira rodopiando feito um peão – a corda da rede, não das amarras, que tem a vida como movimento espiral. Essa outra linguagem que só conheço porque fui ao chão para sentir os abalos sísmicos e que fez de mim a folha e a raiz que são meus ancestrais.
Tudo é cosmos, cada partícula de ar que não vejo, cada gota desse gel transparente que entra pela pele, cada pigmento de sangue que corre nas veias, cada seiva, cada porção de clorofila produzida na fotossíntese acontecendo nesse mesmo ar que não vejo mas que penetra o meu e todos os corpos.  
De repente te ouvi falando que escreveu trinta cartas para algo sem corpo, e eu pensei que esse sem corpo são todos os corpos. Para alguém que não tinha chegado ainda, e eu pensei em todos que já chegaram. Para a melancolia, escrevendo num ciclo – ‘pra dentro da terra, pra terra me escutar e me engolir, e pra eu engolir a terra’, e eu pensei na força da vida.
Vamos continuar escrevendo cartas, quantas forem necessárias, e, falando elas com as linguagens que inventarmos, porque vamos continuar engolindo terra para vomitar corpo, e construir existência que é ancestral mesmo sendo presente. Não é possível contar os tempos dos corpos,
nem dos abalos sísmicos do méxico.
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gninraey-noitceffa · 5 years
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esvaziamento cotidiano diário ritualizado no corpo para o corpo invizível do qual surge visíveis dizeres possíveis do impossível gel transparente aderente na pele transmutação no osso na carne na voz molecular processual de tempos não dimensionáveis da transvaloração do real imaginário saberes originários fricções de dobras corpóreas visionárias de dimensões múltiplas multiplicadas e replicadas de substâncias elementares fluídos transpassados forjados firmados em pontos de contato contágio germin|ação
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gninraey-noitceffa · 5 years
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a gente tenta ter corpo no mundo mas que mundo é esse? que mundo é esse no qual nenhum corpo parece se conectar com o seu na profundidade do que é existir pra você? ou que corpo é esse que não se sente existindo nesse mundo?
ninguém
eu sou ninguém para esse mundo ou ninguém nesse mundo para mim
a realidade só existe no aqui/agora todo resto é fabricado pelos movimentos existenciais de cada um que é abstrado para es outrs nem as conexões que parecem mais alinhadas, mais fortes e mais profundas são certas como a realidade do aqui/agora porque o que se passa em cada cabeça/corpo nunca será a mesma coisa
você acha que está dividindo algo real com alguém mas esse real não existe a não ser na sua cabeça/corpo e isso é o mesmo que estar só
nenhuma comunicação parece suprir o que se passa o que atravessa cada cabeça/corpo de forma a construir uma realidade comum a não ser a materialidade de uma presença no aqui/agora
como compartilhar mundo nesse mundo fragmentado e quebrado pela constante comunicação daquilo que é apenas projetado?
como construir uma materialidade consistente comum? quando o que pulsa é a falta de coexistência
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gninraey-noitceffa · 6 years
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escrito pós slam
vocês querem falar de gênero? vamo falar o papo reto o papo reto não, vamo falar o papo torto mesmo, porque reto é o caminho de vocês monótono vamo falar do problema de vocês, porque aqui não tem nenhum problema tem o dilema de ter que negociar diariamente com esse cistema pobre podre aqui, como diria rosa luz, tem mulher de peito e pau e como diriam meus manos tem homem de buceta e teta mas, aqui, nesse copo aqui, não tem nem homem nem mulher porque minha buceta não aceita categoria e meu cu só pisca pra quem entende que gênero é alegoria performance que eu não quero fazer to pronte pra fuder meu próprio corpo enquanto invento existência resistência ao invés de apenas sobreviver
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gninraey-noitceffa · 6 years
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dormi muito mal porque vi um filme muito forte
acordei pensando mil coisas
mil duzentos e seis palavras rodopiando na minha cabeça/corpo
leio maria gabriela llansol (que escreve com dois l)
"a cama está tépida, a noite foi de pesadelos que se teceram entre o meu quarto, e o quarto para além do tapume. escrevo mentalmente, sentindo um grande desejo de continuar quieta. pôr o relógio de pulso, ajuda-me a soerguer. por um lado, o tempo urge; por outro lado, sei que só escrevo porque minha experiência é mortal (termina com a morte). senão a escrevê-la teria preferido___________________________________________________                                                                                                    outra felicidade                                                                                                    menos ardente,                                                                                               outra  complexidade                                                                                                                menor."
pesno em você e no tempo na palavra tempo como uma palavra-você
depois, num ímpeto investigativo que, por outros motivos, havia começado na noite anterior, leio você
exílio água
mais palavras pra mim, pra ti
e mais llansol: "não é através de nenhum sentido que sei que, de alto a baixo da sua fluidez, borbulha água."
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gninraey-noitceffa · 6 years
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pensando muito em quais substâncias posso usar nas experiências de transformação do corpo/ser quando e como muito cansaço choro vontade de não fazer mais nada quando o corpo é muito sensível pra digerir as coisas, quais podem ser os limites? outro dia me disseram: acho que na frança as pessoas não querem ter corpo, querem fazer o corpo sumir, por isso são tão magras e usam tanto preto. me lembrei de que nunca quis ter corpo. ter corpo dá trabalho. mas se essa sensação também é um vestígio da experiência colonial que me atravessa, não quero mais ela. porque aqui/agora desejo mudar de experiência, mudar de território, ter outras miradas e outras marcas. e isso já iniciou. fui iniciado por três meses não tive nome até sair e descobrir outros nomes, que na verdade já estavam aqui. foi só fazer outra mirada. agora sigo no caminho que é tortuoso mas meu corpo é torto vai conseguir transitar entendendo aos poucos o que é possível ingerir digerir como é possível gerir o corpo sem gênero
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gninraey-noitceffa · 6 years
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ontem vi um corpo monstro movendo micro movimentos que eram tão ou mais fortes do que qualquer coisa que podemos chamar de dança
lembrei de uma quase imobilidade esse corpo que se entorta quando em relação com a gravidade
porque eles tentam nos imobilizar mas não conseguem e partindo dessa quase imobilidade o corpo mexe micro movimentos quedas
é voltando para o chão que poderemos começar a mudar os corpos de lugar
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gninraey-noitceffa · 6 years
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de uma quase imobilidade
2016
vídeo: https://www.youtube.com/watch?v=VWBQvrRqEdE
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gninraey-noitceffa · 6 years
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o círculo sempre aqui mesmo que novo em movimento porque inventar coisas novas com pessoas antigas é difícil mas bonito nesse espaço água doce pedras que marcam novas alianças cuidado e amor mergulhos profundos intercalados por respiros na superfície hoje pedras saíram de um corpo enquanto eu e você falávamos de palavras escrevo aqui pra te/me lembrar que nem sempre palavras possíveis pra expressar cruzamentos de corpos e o reconhecimento daquele estranho familiar que fomos quando nos tocamos de novo mas agora espaço água terra fluxo e densidade corpos concretos
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gninraey-noitceffa · 6 years
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gninraey-noitceffa · 6 years
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I hope I’m right when I’m speaking my mind I hope I’m right when I’m speaking my mind
I hope my life is no sign of the times I hope my life is no sign of the times
I’ve been looking for the golden trees I don’t wanna see the killing on those leaves haven’t we all
maybe I’ll just press my hands on it haven’t we all It’s a lot for me to take
I hope I’m right when I’m speaking my mind I hope I’m right when I’m speaking my mind
I hope my life is no sign of the times I hope my life is no sign of the times
I’ve been looking for the golden trees I don’t wanna see the killing on those leaves haven’t we all
maybe I’ll just press my hands on it…
(james blake)
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gninraey-noitceffa · 6 years
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procurando as palavras que saem do corpo ou talvez não só as palavras as linguagens
a sensação de que aqui/agora nenhuma linguagem possível ou nenhum corpo capaz de babar vomitar transpirar
mas todo líquido contido acumula e aqui/agora algum corpo que transborda em lágrimas sempre alguma água linguagem de fluxos melancolia
| interrompe |
agora tem terra que é outra forma para pulsar e achar outras palavras outras linguagens para sair desse corpo que já é outro e vai continuar sendo sempre outro a cada movimento microorganismo micropolítica molecular força germinada
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gninraey-noitceffa · 6 years
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nessa manhã conversei sobre a água no ar porque nesse verão descobri que talvez prefira o ar com menos água deixando ela nos rios, mares e lagoas
mas esse ano só poderei entrar nessas águas em setembro e aqui/agora março aqui/agora eu e você morando em lugares sem mar
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gninraey-noitceffa · 6 years
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